Guia da Semana

Foto:sxc.hu


O sistema capitalista nasceu, se não fadado ao fracasso de uma sociedade, fadado à promoção da injustiça por sua conseqüente incapacidade de abrigar todos os membros da comunidade dentro de suas benesses e também pelo próprio caráter de competitividade a que induz os indivíduos permitindo que se acumule riquezas sem contrapartida social.

Para que esse sistema seja realizado em sua plenitude, transforma-se o Estado em um gerenciador dos interesses privados, em que representantes de grupos são eleitos quase em um processo de cartelização da esfera pública, valendo-se para isso da não emissão de informações e da batalha pela opinião popular por meio da adulteração de fatos para que estes se tornem palatáveis à grande massa. Ou seja, as decisões são tomadas nos bastidores ou, quando muito, chegam à população encobertas por mentiras.

Nestes tempos de avanço tecnológico e convergência de mídias, muitas decisões que estão sendo tomadas se refletem no cotidiano da população. Como a informação virou a principal moeda global, há inúmeras disputas envolvendo gêneros de corporações que se beneficiarão do controle sobre a produção do conteúdo.

Essa briga para dominar a produção de conteúdo está igualmente vinculada à tentativa de controle das opiniões e mentes do indivíduo, além, é claro, da geração de receita publicitária advinda desse controle e da comercialização de aparatos tecnológicos.

Do outro lado, estão os artistas e os próprios produtores de conteúdo. Como vários outros segmentos da sociedade, eles pouco ou nada são ouvidos diante dessas importantes discussões que afetarão a comunicação e a arte de maneira geral.

Um debate no Legislativo vem tratando do direito autoral e tem como fundo a questão de como lidar com ele na era da internet e como universalizar o acesso ao conhecimento. Na outra ponta da balança está a questão da pirataria.

Na lei atual do direito autoral o o criador da obra é seu proprietário único e somente ele pode autorizar sua reprodução, da maneira que desejar e com a remuneração que desejar.

Entende-se que a propriedade intelectual deve ser respeitada, mas como explicar que um estudante deve comprar o livro X em vez de reproduzi-lo em fotocopiadoras? Como explicar a tentativa de impedimento dos downloads musicais para interesses que não tenham a ver com comercialização?

Os jornais caminham para a abertura de conteúdo na internet e para a proliferação de exemplares impressos gratuitos. Ambas as plataformas teriam sua receita vinda da publicidade. Não é possível então que as empresas que comercializam conteúdo encontrem outra fonte de receita, e que por meio desta pague o autor?

Por outro lado, alguém já ouviu falar de um músico que receba fortunas por direito autoral de discos vendidos ou escritores que ganhem rios de dinheiro por conta de seus livros negociados? Claro está que a receita principal vem de shows, palestras e outros. Então o interesse maior visando o combate à pirataria e a manutenção do direito autoral como está é das corporações, e não dos artistas. Estas simplesmente não querem abrir mão de uma fonte de receita consolidada, ainda que já tenham encontrado novas fontes.

A universalização do conhecimento não pode perder mais terreno para a sede de capital das corporações, pouco ou nada interessadas em algo que não seja o próprio acúmulo de riquezas, mas elas terão de se virar nestes novos tempos, pois a internet está aí, e as tentativas de controle de fluxo de conteúdo não conseguirão ser bem-sucedidas a não ser que seja feito o que muitos temem: a regulamentação total da internet.

Infelizmente a tendência das corporações e de grande parte dos indivíduos não é se adaptar à nova realidade, mas fazer com que ela seja mais interligada às próprias vontades. É hora de abrir o olho para esses movimentos de bastidores que, travestidos de interesse público, nada fazem que não seja promover a cartelização do conhecimento.

Leia as colunas anteriores de Cesar Ribeiro:
? Rebanho cego de pastores mudos

? Sobre cotidiano, arte e sensibilidade

? A platéia invade os camarins

? Estamos todos felizes?

? Os progressistas não ouvem bossa nova

? Um axé bem cuidado ainda é um axé

? Alguém viu as orelhas de Van Gogh?

? Como vender um peixe amanhecido

? Uma fábrica de Alemães

Quem é o colunista: Cesar Ribeiro.

O que faz: diretor da Cia. de Orquestração Cênica.

Pecado gastronômico: comidas gordurosas & óleos adjacentes.

Melhor lugar do Brasil: metrópoles com multidão, sirenes & fumaças.

Fale com ele: acesse o blog do autor

Atualizado em 6 Set 2011.