Guia da Semana

Foto: Guga Melgar

Os irmãos Alexandre Barbalho, Luly Barbalho e Lúcio Mauro Filho atuando com o pai

Com o perdão do clichê, filho de peixe, peixinho é. E para confirmar a velha máxima, acaba de estrear em São Paulo, no Teatro Folha, a comédia Lúcio 80-30, protagonizada por um núcleo bastante familiar: o pai Lúcio Mauro e os filhos Alexandre Barbalho, Luly Barbalho e Lúcio Mauro Filho, escritor, diretor e autor da peça. Equilibrando-se entre o drama e muitas doses de humor, o espetáculo narra a recente passagem do patriarca por um hospital, quando Lúcio Filho e o pai tiveram a ideia de contracenar juntos em uma peça.

Pela primeira vez escritor e diretor no gênero adulto, Lucinho conversou com o Guia da Semana, momentos antes da esperada estreia paulistana, quando falou sobre sua carreira, bastidores do espetáculo e sua relação e admiração pelo "velho" (como se refere ao pai). Confira!

Guia da Semana: Como foi escrever, dirigir e atuar em uma peça ao lado do seu pai?
Lúcio Mauro Filho:
É muito bom e ao mesmo tempo uma loucura. Eu me propus a uma série de desafios. São meus primeiros texto adulto e direção de espetáculo. Quando meu pai foi internado com uma bolha de ar no coração, me gerou uma série de movimentos espirituais e de reflexão. Até então, ele sempre era uma pessoa imortal, que bebe e fuma muito, trabalha, faz e acontece. De repente me caiu a ficha de que eu já devia estar me preparando psicologicamente para o dia em que ele partir. Ele me perguntou: "Se eu resolver morrer tá tudo certo, né?". Fiquei maluco. Tanto que não saí do lado dele. Se meu pai batesse as botas e eu não tivesse dividido o palco com ele, não me perdoaria.

Guia da Semana: Como é dividir o palco com Lúcio Mauro?
Lúcio:
É incrível e muito interessante. Somos dois comediantes e eu tenho muita influência dele. Mas fazemos gêneros totalmente diferentes. Papai faz um estilo mais sério, ele tira gargalhadas com as pausas e faz uma caras fantásticas. A minha já é elétrica, de energia, pular, dançar, cantar. É um encontro entre dois profissionais da arte, mas também pai e filho que se amam e mostram isso durante a peça. O público, ao mesmo tempo que, se emociona, se diverte muito também. Ele me empresta um pouco do que falta em mim, eu tento passar um pouco da minha energia e fica tudo ótimo.

Guia da Semana: Devido à experiência do seu pai, rolou algum tipo de crítica da parte dele?
Lúcio:
Não rolou porque eu escrevi a peça durante nove meses e me preveni. Eu já sabia que como filho caçula, ou eu chegava com um projeto pronto, ou abriria espaço para todo mundo dar pitaco e perderia o controle. O papai mergulhou de cabeça porque percebeu que eu estava muito seguro na direção.

Foto: Guga Melgar

Lúcio Mauro e Lucinho durante o espetáculo Lúcio 80-30

Guia da Semana: Qual é o truque para intercalar o sentimento que a peça transmite com bom humor?
Lúcio:
Ao mesmo tempo que estamos rindo, falamos sobre morte e perda. A mensagem é não deixar de falar um "eu te amo". Mas mesclar isso foi mais fácil do que eu imaginava. Eu, meu pai e meus irmãos nos conhecemos muito e eu já escrevi os diálogos pensando no estilo de cada um. Os atores tiveram essa facilidade, de receber um texto feito exatamente para o jeito deles. Isso não costuma acontecer. O público se sente dentro da nossa intimidade, e na verdade, está mesmo. A peça é uma montanha-russa. Vem com comédia atrás de comédia e de repente uma batida pesada, logo em seguida volta para a comédia e assim vai.

Guia da Semana: Quais foram os momentos mais marcantes?
Lúcio:
Nada vai superar a estreia. Era a noite em que ele completava 81 anos. Por ser uma peça com toques biográficos, de muita emoção, minha ficha caiu apenas na segunda cena na estreia. Pensei: "Imagina se meu pai tem um troço?". E ele chorou muito na segunda cena. Foi uma carga de emoção muito louca. Eu, que sou o autor, tive um branco. Imagina a situação...

Guia da Semana: O que você mais admira no Lúcio Pai quando ele está no palco?
Lúcio:
O tempo de comédia dele é imbatível. É coisa de grande mesmo. Ele sempre foi muito preguiçoso, mas porque trabalhou muito também. Essa quebra que ele tem é algo incomparável. É aquele tipo de coisa que se fosse na ginástica olímpica, por exemplo, na qual os saltos levam os nomes de quem executou primeiro, essas pausas seriam chamadas de quebra Lucio Mauro. Toda vez que ele faz eu paro para assistir.

Foto: Divulgação

O enrendo do espetáculo se passa em um hospital onde Lúcio Mauro é internado

Guia da Semana: Você já sofreu algum tipo de preconceito por ser filho dele?
Lúcio:
Não rolou porque eu comecei a trabalhar muito cedo e não pelas mãos dele. Eu cheguei na TV por outros caminhos. Quando eu ganhei mais reconhecimento, que foi no Zorra Total, eu já tinha 25 anos, estava com meus projetos, meus trabalhos, casado, me sentia pronto para o sucesso. Tinha meu caráter formado, sabia o que era bom e o que não era. O que eu queria da profissão e onde eu queria chegar. Outro fator é a idade do papai. Temos 50 anos de diferença, somos de gerações totalmente distintas e isso também me salvou um pouco de ser comparado com ele.

Guia da Semana: Existe algum papel que você tenha muita vontade de fazer que não seja ligado a comédia?
Lúcio:
Claro, existem muitos papeis bons. Quero fazer o Rei Cláudio, do Hamlet, mas tem que ser lá por volta dos 40 anos, com umas rugas a mais. Já fiz muito vilão antes de fazer comédia. É até meio engraçado isso. No meu primeiro papel na TV, na novela A Viagem, eu era o amigo que levava as drogas para o Felipe Martins. Em Malhação, já fui um cara meio barra pesada. Já violentei a Natália Lage em outra novela. Antes de ser viado na TV, fiz muita coisa. Até o dia em que o Chico Anysio me deu um esporro. Tinha um certo receio de me iniciar na comédia por conta da famosa comparação. Aí Chico falou que eu estava seguindo pelo caminho errado. Ouvir isso de um cara como ele, foi como um soco na cara. Resolvi me dedicar à comédia. Mas tenho vontade de fazer outros trabalhos, até para me exercitar na profissão e experimentar coisas novas.

Guia da Semana: Qual é a dica pra quem quer seguir no gênero?
Lúcio:
Muita cara-de-pau. Porque a comédia é um despudor e não existe uma meia bomba. É plenitude. A pessoa além de tudo precisa ser muito inteligente. O comediante tem a obrigação de ser bem informado. Tem que estar antenado com o que está acontecendo agora, para poder fazer uma sátira atualizada.

Confira o conteúdo extra da entrevista com Lúcio Mauro Filho


Atualizado em 1 Dez 2011.