Guia da Semana

Foto: Emidio Luisi

Lee Thalor em Policarpo Quaresma, terceira peça sobre a Cidade Maravilhosa

Apesar de não ser conhecido pelo grande público, Lee Thalor é um dos grandes nomes do teatro contemporâneo. Em 2006, fez seu primeiro papel de destaque como protagonista da peça A Pedra do Reino, dirigida por Antunes Filho, e deu um verdadeiro show de interpretação. A partir de então, o ator goiano ganhou reconhecimento da crítica e do público. As montagens Foi Carmen (2008) e Senhora dos Afogados (2008), também sob o comando de Antunes, ganharam muitos elogios da crítica especializada.

Agora, aos 26 anos, Thalor protagoniza o espetáculo Policarpo Quaresma, uma adaptação do romance de Lima Barreto, que encerra a trilogia carioca, iniciada com a montagem de A Falecida Vapt-Vupt, em 2009, e que também homenageou o compositor Lamartine Babo. As três peças abordam o Rio de Janeiro, cidade que protagonizou, com seu aspecto multifacetado, diversas transformações dos costumes e do cenário político do país. A seguir, o ator fala sobre o processo de preparação da peças e sobre o sucesso alcançado com suas atuações.

Guia da Semana: Como foi a preparação de Policarpo Quaresma?
Lee Thalor: Foi longa. Foram quase dois anos de preparação, mas nesse tempo acabamos montando A Falecida Vapt-Vupt e Foi Carmem. Mas a preparação sempre começa com texto. O Antunes, assim como em a Pedra do Reino, comandou uma construção coletiva. Os atores, inspirados pelo livro, montavam e dirigiam cenas e mostravam para ele, que aprovava ou não. Então, moldava as aprovadas de acordo com o caminho que estava percorrendo.

Guia da Semana: E em relação ao trabalho de ator?
Thalor: Foi um trabalho muito difícil. Esse personagem tinha que ter um lado muito humano e verdadeiro. E como eu não tenho essa carga, precisei trabalhar muito a sensibilidade. Não só a construção, o tipo, mas a emoção do personagem. Ele tem que ser muito autêntico e não pode parecer falso. Dentro das minhas limitações, tentei construir um personagem cativante, com ingenuidade e, ao mesmo tempo, com idealismo e com a paixão necessária.

Foto: Divulgação

Cena de A Falecida Vapt-Vupt, em que Thalor vive Tuninho, um típico malandro carioca

Guia da Semana: Como é ser dirigido por um dos maiores nomes do teatro? Ele realmente é muito duro com os atores?
Thalor: Eu não sei, porque nunca trabalhei com outros diretores no teatro. Trabalhei com outros diretores no cinema. Mas eu tenho uma identificação muito grande com a maneira que ele lida com o trabalho. E acredito que essa é a forma mais próxima de chegar a algo com qualidade, que o público mereça assistir. O que ele exige é o mínimo para um ator pisar no palco. Mas o ator tem que ir além do que o Antunes pede, porque ele dá o básico.

Guia da Semana: A crítica é sempre muito favorável às suas atuações. Para você, quais são os fatores determinantes desse sucesso? Qual é o peso de Antunes nessa grande aceitação?
Thalor: Foi uma surpresa, não só para mim, como para o Antunes também o fato da crítica ter me aceitado muito bem. Não era para eu ter sido protagonista em a Pedra do Reino e nem fazer papéis como Misael, por exemplo, porque não tenho tipo físico. Mas Antunes, na Pedra do Reino, por exemplo, por falta de opção, pois já tinha passado dez atores pelo papel, resolveu arriscar. E deu certo. Em Senhora dos Afogados ele arriscou novamente. A partir daí, a crítica começou a me dar espaço. Mas não me sinto o querido do Antunes. Sou um quebra-galho dele, na verdade. Quando ele precisa de alguém, ele me chama, porque dentro das minhas limitações consigo desenvolver algo em que o jogo do teatro consiga se realizar em cena.

Guia da Semana: E você pensa em fazer teatro com outros diretores?
Thalor: Não sei. Agora estou no CPT (Centro de Pesquisa Teatral) integralmente. Além das peças que ensaio, também dou aulas lá e gosto da maneira como o Antunes encara o teatro. Mas eu prefiro pensar no que está acontecendo agora.

Guia da Semana: Antunes tem como um de seus pressupostos em grande trabalho de desconstrução do ego. Como você lida com isso? Às vezes você se sente um pouco apartado da sociedade tradicional?
Thalor: É um caminho pelo qual todo artista passa. Se o artista não entende que está atuando para o público ou para humanidade, não consegue desenvolver um trabalho artístico com relevância. Pois se ele faz um trabalho visando apenas o sucesso, a crítica, os prêmios, tudo isso se esvai com o tempo. Os artistas que realmente perduram, e fazem obras-primas, se desprendem do egoísmo e tentam desenvolver algo que vai além.

Guia da Semana: Como você enxerga a cena teatral contemporânea?
Thalor: Vejo que o teatro está muito aberto. Há muitas possibilidades.Vejo o panorama teatral muito amplo e acho muito bom isso. Há espetáculos com muita luz e figurino, e também aqueles que não têm nada, que são totalmente minimalistas, como do Caca Carvalho, A Poltrona Escura. Eu gosto de ver tudo isso, mas tenho preferência por trabalhos como o do Caca, que suscita mais a imaginação do espectador.

Guia da Semana: E o teatro menos comercial, você acredita que está ganhando mais espaço, ou ainda tem um público restrito?
Thalor: Acho que em São Paulo sim. As pessoas vão ver esses trabalhos experimentais. Muitos espetáculos desse tipo têm público. Os espectadores de São Paulo são muito generosos nesse sentido, assistem de tudo. Agora não vejo esse panorama em outros lugares. Em Goiás, por exemplo, onde trabalhei durante um tempo, não há esse tipo de cultura.

Foto: Emidio Luisi

Cena de Policarpo Quaresma

Guia da Semana: Você sobrevive somente de teatro. Tem algum caminho que seja mais fácil para quem quer viver só de teatro?
Thalor: É muito difícil falar o que fazer da vida. Eu sempre respeitei o meu coração. Achei que o melhor caminho para mim era fazer USP, e depois percebi que o melhor seria fazer Antunes. Até hoje, só fiz coisas que me moviam, me instigavam e que mexiam comigo como artista. Não sei se isso dá certo para todas as pessoas, mas acho que esse é o caminho mais honesto.

Guia da Semana: Já surgiram convites para TV?
Thalor: Recebi desde 2006 para fazer minisséries. Também recebi convite para fazer uma novela, mas acho que não é meu caminho agora. Não é algo que me tire do que estou fazendo.

Guia da Semana: E como Antunes lida com os atores que deixam o CPT para fazer outros trabalhos?
Thalor: Eu, por exemplo, fiz dois filmes que era uma coisa que tinha vontade. Gosto muito de cinema. A maioria das minhas construções tem inspiração no cinema. Mas claro que isso prejudica meu desenvolvimento no CPT e é muito desgastante. Mas eu consegui conciliar de alguma forma tudo isso, ensaiar o Policarpo e a Falecida, dar aula e filmar. Não é necessário sair do CPT para desenvolver um outro trabalho.

Atualizado em 6 Set 2011.