Guia da Semana



O primeiro documentário sobre os Rolling Stones foi filmado por Jean-Luc Godard, numa incursão respeitável, mas meio chatinha do gênio francês pela ideologia americana em tempos de revolução comportamental, no ano de 68. Sympathy For The Devil inclui imagens da banda em estúdio e só foi exibido nos cinemas no começo da década seguinte.

O segundo documental foi Gimme Shelter, dos irmãos Maysles, e acompanhava a banda durante a turnê americana de 1969, que acabou em tragédia. As apresentações dos Stones e do Jefferson Airplane em Altamont, Estados Unidos, terminaram entre mortos e feridos pelas mãos violentas dos Hell´s Angels, contratados para fazer a segurança do show. O evento era gratuito, ao ar livre, e mais de 300 mil pessoas se dirigiram à costa leste do país para assistir a um "novo Woodstock".

Há mais de quarenta anos vivendo sob o estigma sexo, drogas & rock n´roll (com alguma coisinha a mais, é verdade), a história não podia ficar assim tão mal contada. Shine A Light, documentário que chega às telas americanas em abril- sem previsão de lançamento por aqui, pode promover um acerto de contas cinematográfico com uma das bandas mais bem sucedidas do planeta. É o que se espera do diretor Martin Scorsese. Não bastasse o legado do cineasta em clássicos como Taxi Driver e Touro Indomável, Scorsese é talvez quem mais devotou tempo e trabalho à música popular americana dentro do cinema de mainstream.

É dele o documentário The Last Waltz(1978), que capta o último concerto da The Band, com a participação de Clapton, Ringo Starr e Neil Young, entre outros. Foi Martin que idealizou a série de documentários The Blues - A Musical Journey (2003), que conta a história do gênero em especiais dirigidos por ele e outros mestres como Wim Wenders e Clint Eastwood. Ele realizou também o documentário No Direction Home, sobre Bob Dylan (2005).

Gostando ou não, ninguém pode diminuir a importância dos Stones num espectro musical bastante aberto - que engloba raízes da música americana, como o blues, a revolução e a vida longa do rock n´roll, até o que se entende como música pop. Foi durante a megaturnê A Bigger Band (a mesma do show em Copacabana) que Scorsese filmou a banda por duas noites seguidas, no palco e nos bastidores. A diferença é que não havia multidão. As apresentações intimistas aconteceram no glamuroso Beacon Theatre de Nova Iorque. Uma delas, por sinal, era a festinha de aniversário privativa do ex-presidente Bill Clinton. Há participações especiais de Buddy Guy, Jack White e Christina Aguilera (dessa última Jagger poderia ter nos poupado). Vale lembrar que raramente a banda se deixa filmar em apresentações pequenas, que são usadas somente em shows-surpresa como aquecimento.

São recentes também as entrevistas utilizadas no longa, que mescla clipes históricos e imagens raras de arquivo. Só não dá pra saber logo de cara o que terá mudado tanto nos Rolling Stones desde os documentários anteriores. Mas alguns segredos da longevidade devem estar por ali, para desespero daqueles que insistem em classificá-los como um bando de velhos bexiguentos e mercenários. É de se esperar alguma luz, um grande poder e muito brilhantismo pelo olhar de fã e mestre ao mesmo tempo, que talvez só Martin Scorsese consiga sintetizar. Deve servir para divertir, emocionar ou enfurecer a quem ama e respeita uma das maiores bandas de todos os tempos, mesmo quando Keith Richards despenca embriagado do topo de uma árvore - e vai parar no hospital com a cabeça rachada. Dessa piada o Martin também riu.
Quem é o colunista: Renata D´Elia
O que faz: é jornalista e tradutora.
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Atualizado em 6 Set 2011.