Guia da Semana

Uma jovem médica cirurgiã, em ascensão na carreira, chega a um momento-chave da vida. Enquanto isso, seu melhor amigo, que é homossexual, se apaixona por um músico argentino e vive a expectativa de concretizar esse amor platônico. Ao mesmo tempo, do outro lado da cidade, dois jovens descobrem a paixão num momento complicado, quando precisam lutar pela moradia e sobrevivência. Pequenas histórias, de pessoas comuns vivendo numa grande metrópole se unem no filme Estamos Juntos, do diretor Toni Venturi (Cabra-Cega e Rita Cadilac - A Lady do Povo), que estreia nos cinemas dia 3 de junho.

Na história, a médica Carmem (Leandra Leal) deixou o interior do Rio de Janeiro para começar sua carreira profissional em São Paulo. Ao fazer residência em um hospital público localizado no centro da cidade, ela acaba se envolvendo num trabalho voluntário dentro do Movimento dos Sem-Teto (MSTC).

Com poucas e frágeis amizades, Carmem ainda vive uma sedutora aventura amorosa com o músico argentino Juan (Nazareno Casero), que é o objeto de desejo de seu melhor amigo, Murilo (Cauã Reymond), gay assumido e DJ da noite paulistana, ao mesmo tempo em que divide sua intimidade com um enigmático homem (Lee Taylor). Mas inesperados sintomas de uma doença fazem sua vida resguardada virar de cabeça para baixo.

Múltiplas visões

Estamos Juntos foi o grande vencedor do XV Cine PE deste ano, levando sete prêmios, incluindo melhor filme, diretor e roteiro. Na opinião do diretor, Toni Venturi, cada espectador que assiste ao filme acaba fazendo uma leitura diferente. Muitas vezes, segundo ele, pode chamar mais atenção o lado social (com o MSTC), o lado individual (devido à personagem principal) ou mesmo a questão do gênero e o lado espiritual. "Eu quis colocar na história um pouco dessa coisa multifacetada que é a vida na grande metrópole", diz.

De acordo com Venturi, a principal intenção da equipe foi produzir um longa-metragem sobre o cotidiano, sem virar nenhum 'filme cabeça'. "Estamos Juntos mostra pessoas vivendo, querendo amar, gente com tesão, com medo, gente alegre e triste. Enfim, como somos no nosso dia a dia", avalia. A história mostrada no longa-metragem é original, com argumento de Di Moretti, parceiro de longa data do diretor, e roteiro de Hilton Lacerda.

Toni Venturi conta que, apesar do roteirista ser muito conhecido por trabalhar com cineastas pernambucanos, como em Baile Perfumado (1997) e Amarelo Manga (2003), poucas pessoas sabem que ele mora no centro de São Paulo e sofreu com um tumor na cabeça, assim como a personagem principal da história. "Olha que roteirista bom que escolhi!", brincou o diretor. "Devo muito a ele a história ter essas camadas, justamente pelo Hilton ter vivido a experiência de ter um tumor benigno há alguns anos".

Vivendo na prática

Foto: Beatriz Pontes
A médica Carmem (Leandra Leal) atende uma paciente em Estamos Juntos.

Para compor sua personagem, uma jovem médica residente, Leandra Leal precisou mergulhar fundo no universo da medicina. Na companhia da atriz Débora Duboc, que vive a enfermeira-chefe Elisa no longa-metragem, ela passou um mês no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP) conhecendo como era a vida de quem trabalha na área da saúde. "Foi uma experiência apaixonante, pois vimos o quanto aquelas pessoas são comprometidas com o que fazem", conta a atriz.

Débora Duboc explica que tal vivência foi muito importante para que ambas entendessem melhor o universo de suas personagens. "Acabou dando um conteúdo para que tivéssemos uma atitude mais orgânica e verossimilhante nas interpretações". Leandra ainda conta que um dos momentos mais difíceis do trabalho foi a construção dos sintomas da doença de sua personagem.

Ela explica que existem muitos filmes e documentários sobre pessoas paralíticas, por exemplo, mas disse que é complicado encontrar ficção sobre aqueles que sofrem com um tumor cerebral. "Foi muito difícil chegarmos no que seria o ideal mostrar como sintomas. Para isso, contei com a ajuda de um neurologista, que me explicou como eles eram e me mostrou vídeos de pacientes".

Novas experiências

Foto: Beatriz Lefräve
Nazareno Casero e Cauã Reymond em cena do filme.

Estamos Juntos foi a primeira participação do argentino Nazareno Casero no cinema brasileiro. Para chegar até ele, o diretor Toni Venturi pesquisou atores em vários filmes argentinos. "Como profissional, você fica esperando a vida toda que uma oportunidade como essa aconteça. Eu adorei participar".

Para viver o músico Juan, além de precisar aprender a falar português, ele precisou tocar violino, o que conseguiu após um mês de aulas. "Foi uma roubada, porque é preciso três anos de estudos para fazer o violino vibrar", conta Nazareno. "Fingir que tocava era difícil e tive medo que na telona não fosse ser crível, mas acho que consegui".

No caso do ator Cauã Raymond, que vive um personagem gay, o diretor Toni Venturi conta que já acompanhava o galã de outros trabalhos. "Pensei: essa cara tem um talento maravilhoso. Será que segura essa?". Com o roteiro em mãos, ele foi até o Rio de Janeiro atrás do ator. "Fui curto e grosso: é o papel de um gay e não é o sex simbol, o galã. Você topa?". Na hora, o ator aceitou encarar o desafio. "O personagem já tinha uma sutileza e depois veio Cauã, com todo o talento dele, fazer um trabalho muito bonito", avalia.

Sufoco nas filmagens

O ator Sidney Santiago, que interpretou o protagonista do filme nacional Os 12 trabalhos (2007) e a estreante Érica Ribeiro vivem o casal Nadinho e Maria, integrantes do movimento dos sem-teto da Região da Luz, no centro de São Paulo. "Fazer toda a vivência dentro do movimento foi fundamental para interpretar a personagem, justamente para entender como é viver aquilo", ressalta a atriz.

Sidney conta que o processo de preparação para o longa-metragem começou muito antes das filmagens, pois o diretor fez um documentário chamado Dia de Festa (2006), que mostra esse processo de moradia dos sem-teto no centro. "Por ter essa vivência, ele resolveu filmar numa ocupação mesmo, não ficcionar nada, mostrando o cotidiano daquele local".

Os atores contam que a cena onde os sem-teto ocupam um prédio da avenida do Estado - no centro da cidade - foi real, com os atores gravando o filme em meio à confusão. "Chegamos até a ser presos, por cerca de uma hora e meia", conta Sidney, ressaltando que os dois até foram colocados dentro de uma viatura. "Nesse momento o Toni [diretor] surgiu e, só após explicar que éramos atores, fomos liberados".

Atualizado em 6 Set 2011.