Guia da Semana

De Los Angeles


Os olhos de Ian Curtis funcionam como uma espécie de portal. Ele olha para todos os lugares e, ao mesmo tempo, para lugar nenhum, para você e através de você. Os olhos de Ian Curtis provavelmente contavam a todos seu desespero e as razões que o levaram a cometer suicídio em 1980, mas também foram um dos responsáveis pela importância que a banda Joy Division tema até hoje na música mundial. A estréia Joy Division, dirigida por Grant Lee, amplia as perspectivas e mostra a história da banda, contada por seus integrantes, colaboradores e amigos e, obrigatoriamente, passada numa Manchester em total transição.

Joy Division não é um filme, é o registro histórico da evolução de uma cidade (Manchester), pela visão de um de seus filhos mais famosos, e do que se tornaria o pop rock inglês da década de 80. Com suas raízes sólidas na cena punk iniciada por Sex Pistols e os Buzzcocks, a banda tornou-se sinônimo de "bom trabalho" para seus fãs, que, disco após disco e, especialmente, show após show, esperavam cada vez mais do grupo, mesmo com suas canções curtas, mas extremamente elaboradas. Um dos grandes diferenciais, sem dúvida, era a voz grave e a performance quase alienígena de Ian Curtis. Nem mesmo os demais membros do Joy Division conseguem explicar o que era aquele transe alucinante no qual o vocalista, compositor e, vez por outra, guitarrista, entrava enquanto agitava os braços de força inusitada e quase infantil e, ao mesmo tempo, impressionava na condução das canções.

O relato dirigido por Grant Lee, que já dirigiu vídeos e documentários sobre bandas como Radiohead e Blur, segue ordem cronológica, desde a primeira reunião do Joy Division em um show do Sex Pistols e, claro, a "contratação" de Ian Curtis - que aconteceu pelo telefone. As contribuições de Richard Boon, Anton Corbjin e Kevin Cummings - os outros três integrantes da banda que, após o suicídio de Curtis, criaram o New Order - são fundamentais para construção daquele período. Os detalhes que mais agregam relatam as dificuldades para se gravar, as reviravoltas com os agentes, as brigas e confusões causadas por esses garotos que se tornavam estrelas.

O documentário segue cheio de bom humor e curiosidades até que, inevitavelmente, chega o momento do diagnóstico de Ian Curtis: epilepsia. Daí para frente os rumos mudam, pelo menos os pessoais, uma vez que enquanto o Joy Division decola, Curtis começa a se fechar. Quem também fala muito no filme é Annik Honore, a "Yoko", da banda. Pivô do divórcio de Curtis com Deborah, a amante Annik não era muito querida também pelos demais integrantes. Ela chega a ser esnobada em frente às câmeras. Eles eram garotões ingleses vivendo o glamour do rock, ela uma jornalista intelectualizada da Bélgica. O choque era inevitável.

Como não poderia deixar de ser, a trilha sonora é impecável e poética, uma vez que por meio do repertório do Joy Division é possível delinear claramente a história da banda, que surgiu seguindo os Pistols, mas terminou como ícone do pop nos anos 80. Um ponto positivo, porém, em momento algum se vê os elementos clássicos do "sexo, drogas e rock´n roll". Eles eram malucos, mas fizeram a lição de casa direitinho e, por isso, receberam o grande prêmio: sucesso.

Mas, para o espectador, nada mais que um pedaço da história do rock inglês. Obrigatório.


Quem é o colunista: Fábio M. Barreto adora escrever, não dispensa uma noitada na frente do vídeo game e é apaixonado pela filha, Ariel. Entre suas esquisitices prediletas está o fanatismo por Guerra nas Estrelas e uma medalha de ouro como Campeão Paulista Universitário de Arco e Flecha.

O que faz: Jornalista profissional há 12 anos, correspondente internacional em Los Angeles, crítico de cinema e vivendo o grande sonho de cobrir o mundo do entretenimento em Hollywood.

Pecado gastronômico: Morango com Creme de Leite! Diretamente do Olimpo!

Melhor lugar do Brasil: There´s no place like home. Onde quer que seja, nosso lar é sempre o melhor lugar.

Atualizado em 6 Set 2011.