Guia da Semana

Foto: divulgação


Sexta, 12 de maio de 2006. Os paulistanos que se preparavam para o Dia das Mães foram, aos poucos, tomados pelo medo, insegurança e ameaças. O Primeiro Comando da Capital (PCC) encadeava a maior onda de violência contra a força de segurança do Estado. Com ameaça de bombas e ataques a bases da PM, fez São Paulo aderir ao toque de recolher, causando alerta nacional.

Dois dias depois, no domingo das mães, o cineasta Sergio Resende aguardava ansioso a reportagem no Fantástico sobre o seu último trabalho, o longa Zuzu Angel. No entanto, os ataques do PCC invadiram a programação e um novo longa começava a perturbar sua mente. Salve Geral - O Dia em que São Paulo Parou nasceu de fatos verídicos para narrar, segundo o próprio, o 11 de setembro que a maior metrópole da América Latina vivenciou.

Contrariando o novo "boom" do cinema nacional, a produção ganhou apenas uma sala de cinema e foi escolhido para disputar com mais de 100 países a uma vaga ao Oscar, na categoria de Melhor Filme Estrangeiro. Com Andréa Beltrão como protagonista, a história explora a violência urbana, questiona a ética e mostra um país onde todos vivem na linha tênue entre o bem e mal. Confira a entrevista com a atriz sobre o longa que tem sua estreia nacional em 2 de outubro.

Guia da Semana: Como você recebeu a notícia da indicação e possibilidade de freqüentar o tapete vermelho em 2010?
Andréa Beltrão:
Já imaginou uma coisa dessas? (pensativa) Recebi com uma alegria enorme porque não procurei isso, não penso em uma carreira internacional. Quero estar no palco e tenho um no Rio de Janeiro onde sou a prisioneira mais feliz, com Marieta Severo (com quem encena o espetáculo As Centenárias). Trabalho para os meus pares e se o filme chegar a Hollywood, ou seja lá onde for, é com uma alegria enorme que a gente vai. Mas acho que a indicação nesse momento do lançamento joga uma luz bacanérrima, um golpe de sorte por merecimento. Tinha vários filmes no país que estavam concorrendo e nós vamos encarar mais 100 filmes maravilhosos do mundo todo. Já foi ótimo e é bacana você ver como as pessoas parabenizam a gente como se eu já tivesse ganhado o Oscar de Melhor Atriz (risos). É a nossa chance de jogar com a camisa amarela.

Guia da Semana: Isso também pode trazer um ônus, que é ser rotulado como mais um filme que explora a violência urbana, junto com Cidade de Deus e Última Parada - 174...
Andréa:
Mas O Quatrilho e Central do Brasil não foram para o Oscar? Eu acredito nisso - e até que me provem o contrário - que esse filme só está chegando lá por sua qualidade cinematográfica, porque ele vai concorrer com grandes. Agora se ele vai para o Oscar ou não, e se as pessoas escolheram por causa da temática, o problema é delas. A gente vai aproveitar essa oportunidade e mostrar um bom cinema. O que importa é o filme e não o assunto. Tem uma carga de ficção bem construída que ultrapassa isso. E se eles querem nos ver assim, o problema é deles!

Foto: Leonardo Filomeno


Guia da Semana: No cinema, você viveu em sequência duas mulheres dramáticas. Uma em Verônica e outro em Salve Geral. Quais as semelhanças entre os personagens?
Andréa:
Mera coincidência. Tinha recebido o convite de Salve Geral e já tinha terminado o Verônica. As duas personagens são mulheres admiráveis, heroínas e professoras que têm um amor incondicional e entram em conflito com a questão ética devido ao mundo que está em volta.

Guia da Semana: O trabalho de uma ajudou na outra?
Andréa:
Ah, claro! Na minha vida de atriz todo trabalho me alimenta de alguma maneira, eu cresço com eles, fazendo sucesso ou não. Até O Bem Amado (filme que estreia em 2010) foi importante, porque era um universo muito distante entre os personagens. Deu um prazer ver como estava conseguindo sair de um universo peruca loura anos 70, farcesco, depois pegar um avião e chegar aqui, continuando meu trabalho de contenção e economia, que é o da Lúcia. Foi instigante.

Guia da Semana: O que você tinha guardado do ataque do PCC na sua memória?
Andréa:
Eu não tinha essa associação forte, como os moradores da cidade. Como diz o Sérgio, para mim esse é um filme de ficção que se ambienta em uma situação real, fatos que aconteceram, mas em momento nenhum quando li o roteiro pensei: "Ah, vamos fazer um filme sobre aquele dia". Gostei da história, achei linda, tocante e pungente. É um pesadelo ver seu filho sair de casa e logo depois você receber um telefonema e sua vida acabou. Isso foi o que mais me impressionou, é um horror bastante plausível e a gente não está livre disso, o que torna o filme maior ainda na carga emocional.

Guia da Semana: O que mais a atraiu em Salve Geral?
Andréa:
Salve Geral foi uma surpresa muito grande. O Sérgio chegou no teatro e me viu fazendo um papel de bufona, palhaça, de nariz vermelho, com a Marieta Severo. Lá ele disse que tinha escrito um personagem para mim com essa grandeza. É um diretor que admiro há muito tempo, nunca tinha trabalhado com ele, mas acho uma pessoa incrível. Então, o fato dele ter me convidado, ter dito que pensava em mim, foi fundamental. Depois que li o roteiro, vi que era uma história maravilhosa, para assistir na ponta da cadeira e depois afundar.

Foto: divulgação


Guia da Semana: Para quem é de São Paulo, o evento é muito marcante. Todo mundo lembra onde estava e o que fazia nesses dias. Como foi lidar com o assunto?
Andréa:
Tenho várias tragédias para me lembrar do Rio de Janeiro, porque você sabe que lá a gente morre na esquina de casa com um tiro na cabeça porque não entregou uma caneta, porque um menino pediu para ficar com o celular, porque uma garota estava chupando um pirulito e ficou no meio do caminho da bala. O fato de falar que isso não passou pela minha cabeça não significa que eu esteja desmerecendo o que aconteceu aqui. Vimos isso que aconteceu em São Paulo, em mais de 70 presídios com um profundo horror lá no Rio.

Guia da Semana: Esse perfil de heroínas é possível no mundo?
Andréa:
Quando tem uma pessoa que só depende de você pra viver e você é a única pessoa louca e valente o suficiente pra proteger aquela criança (no caso de Verônica), isso se torna uma questão pessoal. Acho sensacional uma pessoa com esse tipo de coragem, como a mulher que tirou o filho da água e não sabia nadar, a mãe que tirou o filho da boca do crocodilo, esses são os verdadeiros super heróis, os Hércules, são os momentos em que revelamos o potencial da grandeza dos sentimentos que o ser humano pode ter, ao lado dos outros horríveis e mesquinhos que todos nós temos. O que toca as duas mulheres é isso também.

Guia da Semana: Quais são os próximos projetos?
Andréa:
É O Bem Amado, onde eu faço o papel da Dulcinéia, que casa com Dirceu Borboleta. Estrearia em janeiro, mas com o filme do Lula programado para esta data, será prorrogado para março.

Veja o bate papo com o diretor Sergio Resende

Atualizado em 6 Set 2011.