Guia da Semana

José Padilha durante as filmagens de Tropa de Elite.

Enquanto Tropa de Elite surge como um dos maiores sucessos do cinema nacional dos últimos anos, uma polêmica se coloca sobre ele. Muitos o consideram a favor da tortura policial. A equipe, porém, tenta explicar seu ponto de vista. Wagner Moura, o Capitão Nascimento, deixa claro que é "muito primário você reduzir o olhar do realizador do filme com o do personagem". Ele completa dizendo que "uma minoria tende a gostar dos policiais que torturam o bandido, acha que a solução da violência é que bandido bom é bandido morto, mas eu discordo".

O antropólogo Luis Eduardo Soares, autor do livro Elite da Tropa, que deu origem ao filme, revela que o propósito foi mostrar esta brutalidade, não apoiá-la. José Padilha, o diretor, afirma que "os filmes que têm um pé na realidade deveriam vir com uma bibliografia, para que as pessoas possam ir além dele", e sugere a leitura das obras de Jacqueline Muniz, Michel Misse, Alba Zaluar, além do próprio Soares. Caio Junqueira (foto), que interpreta Neto, acredita que este é "um filme muito bem explicado que retrata uma verdade nua e crua do Rio de Janeiro".

A forma que os realizadores usaram para mostrar como esta atitude dos policiais está errada foi o conflito interno de Nascimento. Soares diz existir "um contraponto interessante, em que o discurso autoritário, aparentemente impenetrável, é enunciado por um personagem fragilizado pela ansiedade e pela hesitação". Para ele, o personagem "é incapaz de enxergar além do horizonte que determina a sua própria circunstância". Em uma analogia, o antropólogo afirma que "essa angústia se transmite como uma espécie de veneno que é sedutor como uma droga, e ao mesmo tempo é doloroso, produz sofrimento".

Assim, ele não consegue achar qualquer solução para a polícia que não seja "se omitir, se corromper ou ir para a guerra", como diz o personagem (foto). Entretanto, alguns críticos e espectadores, segundo a equipe, não conseguiram compreender esta mensagem, e acreditam que o filme se coloque a favor destas práticas. Muitos deles, apóiam a atitude dos personagens. Para Soares, no entanto, "o espectador que se identifica com o discurso autoritário percebe que algo não fecha" e que isto "acaba fazendo com que ele veja o filme de novo e de novo", o que também ajuda no sucesso.

Para o ex-policial André Batista, co-autor de Elite da Tropa, e que inspirou o personagem Matias, "a violência é a falta do recurso policial". Ele afirma que "nada do que está na tela não existiu, tudo ali é uma ficção possível". Padilha teoriza que "a cultura da corporação policial tem a ver com o fenômeno que transforma miséria em violência" e Luis Eduardo completa que "essas polícias estão totalmente condenadas e não é possível mantê-las".

Para todos, a solução do problema está distante, mas o primeiro passo não é tão difícil de ser dado. Segundo eles, o grande problema da violência está ligado ao fato de jovens de classe média financiarem o tráfico, mas "o consumidor só é responsável por tudo isso porque tem uma regra que criminaliza a droga", afirma Soares. Padilha insiste que "se a gente mudar as regras, o fato não seria mais este", já que como não há a legalização, "o usuário, ao fazer a escolha de comprar a droga, escolhe comprar de um criminoso", e o diretor completa que "a idéia do filme é que este fato seja discutido".

O interprete de Matias, André Ramiro, acredita que "violência não é a solução para nada, só gera mais violência", e diz esperar que "as pessoas tenham a reação para melhorar". Sobre toda a discussão, Caio Junqueira lembra a todos que Tropa de Elite "é um ponto de vista de um policial do BOPE. Ele não levanta bandeira para nada". Conhecendo o lado dos policiais, e agora convivendo com acadêmicos que estudam a questão, Batista tenta não prever o que vem depois do filme, mas acha que "se no final dessa discussão toda, os governadores definirem um papel social maior para a polícia, ele já vai ter cumprido o objetivo".

Atualizado em 6 Set 2011.