Guia da Semana


Foto: Nathália Clark/ ATG

Com o sucesso do UFC nas telinhas, a modalidade agora é ensinada até nas academias de ginástica

Enquanto os boxeadores Mayweather e Pacquiao não se enfrentam em um duelo que poderá pagar até US$ 100 milhões e voltar a atrair os olhos do mundo para uma disputa no ringue, a considerada arte nobre já apresenta sinais de que precisa se renovar e melhorar a estratégia de luta para se equiparar a uma jovem modalidade esportiva que arranca suspiros dentro do octogonal, bate recordes de audiência e ainda revela astros para o mundo, como Anderson Silva, Georges St. Pierre e Cain Velasquez.

Na contramão do boxe, o Ultimate Fighting Championship (UFC) é um campeonato criado nos EUA com base na modalidade MMA (Mixed Martial Arts), que oferece a pluralidade das artes marciais, atrai cada vez mais jovens para frente das telinhas e busca rapidamente o título de maior esporte do planeta. Saiba os caminhos que a nova modalidade tomou até chegar aqui e por que ela tomou o espaço até então monopolizado pelo boxe.

Nobre arte

Milenar, o boxe reinou absoluto entre os esportes de luta do planeta desde que ganhou as regras modernas, na Inglaterra, há dois séculos. Usando apenas os punhos tanto para a defesa como para o ataque, o estilo alia força, técnica e plasticidade e encantou o mundo com lutas memoráveis que revelaram grandes campeões, como Mike Tyson, Muhammad Ali, Oscar de La Hoya, George Foreman, Evander Hollyfield, Sugar Ray, entre outros. O Brasil não ficou de fora e incluiu no hall de atletas de nomes como Éder Jofre e Popó.

Mas a diversidade de entidades que dirigem o esporte (mais de quatro na atualidade), os interesses particulares dos promotores - que chegam a ter mais de um lutador em seu controle - e o pouco investimento do governo em atletas fizeram a modalidade ter um declínio dos praticantes e de público.

"Comecei no boxe com 23 anos e não pagavam nada no amador. Se você não é um Manny Pacquiao da vida [lutador filipino destaque na modalidade], as coisas não acontecem", aponta Ricardo Máximo, 38 anos, professor de educação física e lutador de vale-tudo.

Abandono

Apesar da falta de apoio financeiro e do descaso das entidades brasileiras com os seus atletas, Peter Venâncio conquistou a maioria dos títulos como amador e chegou a disputar com William Joppy, em 1997, o cinturão dos médios da Associação Mundial de Boxe. A participação na luta foi meio que um lance de sorte, mas a derrota transformou-o em um rei sem coroa. "Cheguei a ficar ranquiado como número quatro do mundo. Assinei um contrato com Don King, que também cuidava dos atletas números três, dois, um e o campeão da categoria. Fui convocado na última hora para disputar o cinturão porque um lutador se machucou, caso contrário a luta nunca aconteceria", assume o agora professor.

Foto: Gael Oliveira

Além do público em baixa, muitos promotores do boxe migraram para o octogonal

Para se viver do esporte atualmente, o atleta precisa conquistar o campeonato brasileiro pelo amador só para assim ter direito a uma bolsa governamental de R$ 2,8 mil por mês. Para quem chega a gastar mensalmente R$ 1,2 mil com o esporte, é preciso de uma outra renda, já que as lutas amadoras no máximo garantem materiais esportivos e suplementos alimentares.

Além disso, o pouco interesse do público atingiu os promotores da modalidade, que deixaram de investir nessa área e dificultaram a aparição de novos atletas "Antes o boxe era o esporte mais visado e todo mundo procurava fazer. Hoje em dia, os técnicos podem formar atletas, mas não têm como encaminhá-los para o profissional e fazê-los viver do boxe", revela o veterano Peter Venâncio.

Artes Marciais Mistas

Com pedigree brasileiro e alma norte-americana, o MMA é uma modalidade de luta onde os praticantes não precisam seguir um estilo específico de arte marcial. Para ser considerado um bom lutador, é necessário dominar em pé e no chão boa parte dos golpes das principais lutas envolvidas, como muay thai, boxe, jiu-jitsu e wrestling.

O MMA tem suas raízes no Brasil. Ainda na primeira metade do século XX, Carlos Gracie foi o pioneiro ao organizar os embates amadores de vale-tudo, nos quais competidores de modalidades de luta diferentes se enfrentavam. A violência excessiva fez a luta ser proibida no país. No início dos anos 90, Rorion Gracie idealizou o formato de luta no formato octogonal, com grades para que os praticantes não pudessem sair por entre as cordas. Assim, embora sem limite de tempo, nem regras fixas, aconteceu o primeiro torneiro de UFC em Los Angeles.

O principal atrativo era a possibilidade de confrontar atletas de diferentes artes marciais para ver quem se dava melhor. "Tem gente que gosta de boxe, tem gente que gosta de jiu-jitsu, tem gente que gosta de muay thai. O MMA combina todas as artes marciais e, em termos de luta, é o mais completo", afirma Eduardo Telles, lutador na categoria.

Foto: AFP

Anderson Silva nunca perdeu depois que foi contratado pelo UFC

Com exibição somente nos EUA, na primeira edição, 85 mil casas pagaram para ver o campeonato na TV; na segunda, 120 mil; na terceira, 180 mil. Enquanto as pessoas começavam a se encantar com a arte no Ocidente, o Japão organizava o torneio de vale-tudo Pride, que revelou os brasileiros Rickson Gracie, os irmãos Nogueiras (Rogério Minotouro e Rodrigo Minotauro), Maurício Shogun e Wanderlei Silva. Devido a envolvimento com a máfia japonesa, o torneiro foi extinto, e o mundo voltou os olhos para o MMA norte-americano.

A filosofia do UFC queria transformar o esporte em um entretenimento. Fruto da união dos irmãos Fertitta com o ex-empresário de boxe Dana White, o objetivo final do torneio não era a vitória, mas sim oferecer espetáculo. Após a implantação de regras, limites de tempo e categorias para a luta, o UFC conseguiu ser legalizado em praticamente todos os estados americanos e invadiu as casas de todo o mundo.

Valorização dos atletas

O maior ícone do boxe atual, sem sombra de dúvidas, é o lutador filipino Manny Pacquiao. Chamado pelos seus fãs de Pacman, iniciou na categoria peso-mosca (51 quilos) e tem no seu cartel o feito de aposentar o ídolo americano Oscar De La Hoya e de ganhar dez títulos em oito categorias, recorde até então. Rumores dizem que seu salário chega a US$ 38 milhões e que uma luta sua pode render uma bolsa de até US$ 100 milhões.

No octogonal, Anderson "Aranha" Silva prova a cada luta sua invencibilidade. O seu currículo acumula 13 lutas sem perder e oito defesas de cinturão na categoria peso médio. A última disputa, contra o também brasileiro Victor Belfort, levou 400 milhões de telespectadores de 147 países a aguardar o combate principal em Las Vegas, na noite de 5 de fevereiro. Foram necessários três minutos e 25 segundos, dois socos e um chute frontal na mandíbula ensinado por Steven Seagal para Anderson nocautear o adversário, na considerada 'Luta do Século'. Pelo card, ele recebeu mais de R$ 500 mil, somando a bolsa e o bônus pela vitória.

Foto: AFP

Manny Pacquiao iniciou na categoria peso mosca (51 quilos) e chegou até a supermeio-médio (69,8 quilos) sem perder a técnica

Apesar das principais estrelas do UFC não chegarem perto das bolsas pagas pelo boxe, o grande atrativo na modalidade são as bonificações que os atletas 'menores' podem receber. Além do contrato com salário, as lutas do card recebem bônus por melhor nocaute da noite, finalização mais rápida, entre outras.

Mas o que mais agrada os novatos são as quantidades de torneios e a melhor oportunidade de remuneração para as pessoas que estão começando. "Ele não é um esporte tão regulamentado como deveria, mas está mais organizado que o boxe, paga mais e tem mais gente séria. Por isso, dá possibilidades para as pessoas entrarem em eventos grandes", resume Francisco Veras, 41, treinador de MMA.

Rivalidade em números

A disputa entre as modalidades ultrapassa o mundo esportivo. O UFC, que foi comprado por US$ 2 milhões, hoje custa US$ 1,2 bilhões. Para você ter um pouco da noção da grandeza deste evento, em somente uma noite ele gera em média R$ 70 milhões na cidade onde for realizado. Uma pesquisa realizada em 2010, feita com mais de mil executivos americanos, apontou o torneio como o que mais vai crescer em 2011, superando as ligas dos EUA de basquete, beisebol e futebol americano.

Para o futuro, a previsão dos donos do esporte que estra em 500 milhões de casas é dobrar o número de residências em poucos meses. Para isso, acabaram de comprar o Strikeforce, organização paralela de vale-tudo que vinha ganhando destaque em todo o planeta. Assim, estrelas atuais dessa modalidade podem entrar em pouco tempo nocard do UFC, como Fedor Emelianenko, Fabrício Werdum e Antonio Pezão.

Apesar dos dias de glória e unanimidade do boxe terem chegado ao fim, a atualidade mostra que a arte nobre precisa se renovar e investir em estrutura e atletas para competir com o UFC. Enquanto isso não acontece, o aumento de prestígio e das estrelas do MMA só tem a crescer.

UFC Rio

Dana White, presidente do UFC, oficializou a volta do evento no país na coletiva em 17 de junho. A última vez que isso aconteceu foi em 1998, na cidade de São Paulo. O UFC Rio está marcado para 27 de agosto, no HSBC Arena. Os ingressos acabaram em pouquíssimas horas e quem quiser acompanhar a noite de MMA, terá que fazer pela televisão (Canal Combate ou SPORTV). Confira os confrontos que o lutador Anderson Silva definiu como a seleção brasileira contra o resto do mundo.

Anderson Silva (BRA) x Yushin Okami (JAP)
Mauricio Shogun (BRA) x Forrest Griffin (EUA)
Brendan Schaub (EUA) x Rodrigo Minotauro (BRA)
Ross Pearson (ING) x Edson Barboza Junior (BRA)
Luiz (Banha) Cane (BRA) x Stanislav Nedkov (BUL)
Thiago Tavares (BRA) x Spencer Fisher (EUA)
Paulo Thiago (BRA) x David Mitchell (EUA)
Mike Swick (EUA) x Erick Silva (BRA)

Atualizado em 10 Abr 2012.