Guia da Semana

Foto: Thinkstok

A conversa com as crianças precisa ser clara, verdadeira e objetiva

Lidar com grandes perdas não é uma situação fácil. São entes queridos que se vão ou mesmo um animalzinho que tenha te acompanhado desde sua infância. A situação não é fácil, mas, depois de certa idade e com as experiências adquiridas ao longo da vida, o processo de associar a ideia de não ter determinado alguém por perto se torna algo relativamente mais compreensível. Agora, imagine como isso funciona na mente de um pequeno?

É isso que o espetáculo Menina Nina: duas razões para não chorar busca explicar no palco do Sesc Pinheiros, em São Paulo. Adaptada da obra literária homônima de Ziraldo e inspirada na própria neta do escritor, a protagonista tem a difícil missão de elaborar a morte da avó, uma senhora apaixonada pela vida e principalmente pela neta. Em meio a esse cenário, a mãe e o avô buscam formas de explicar à pequena que a avó partirá e que não há razões para chorar.

Com o texto, Ziraldo pretende elucidar para quem está começando a viver que há também um fim. "A literatura e o teatro nos ensinam a lidar com as perdas e a gerar vida", afirma. Assim como no tablado, o contexto é bem presente na vida real e nela a solução nem sempre é algo simples.

Reações

Uma perda na vida de uma criança pode interferir em aspectos do dia a dia e influenciar em futuras relações, quando ela se tornar adulta. Debater sobra a morte não é uma tarefa simples tanto para as famílias, como para as escolas, e são raros os pais que educam os filhos para enfrentar essa situação. Muitos apostam na ideia de que o tempo se encarrega de ensinar ou então apelam para as desculpas manjadas, mas que não são as melhores soluções.

Foto: Thinkstok

Uma perda pode interferir em aspectos do dia a dia e influenciar em futuras relações

Seja a partida de um ente muito próximo ao baixinho ou de um animal de estimação, a lacuna deixada é o maior dos males, segundo a psicóloga Maria Dirce Benedito, do Setor de Saúde Mental do Departamento de Pediatria da UNIFESP. "A criança pode querer estar com a pessoa que ela perdeu, demonstrar irritabilidade, ansiedade, medo e agressividade. Essas reações surgem por elas não compreenderem o que ocorreu, ou sentirem-se culpadas pela morte".

O abandono também é uma barreira enfrentada pelo pequeno que se depara com uma perda. A sensação interfere diretamente no cotidiano das crianças e, segundo a psicóloga Maria Dirce Benedito, pode criar insegurança nas relações. "Este sentimento gera ansiedade e revolta, podendo atrapalhar a concentração na escola, no contato com os amigos, professores, alteração do sono, regressão, medos e impaciência", alerta a especialista.

Diálogo é a solução

Contar ou não? Ter uma conversa franca? Tratar como gente grande? Essas são algumas das questões na hora de falar para aos pequenos que um determinado ser não voltará mais a conviver com ela. Cada família adapta o diálogo para seu modo de vida e crença. Até os cinco anos de idade, o pensamento ainda é muito concreto, e as crianças não possuem uma ideia organizada sobre tempo e espaço. Portanto, percebem a ausência, mas não conseguem distinguir como uma separação irreversível ou a longo prazo. "A conversa com crianças pequenas precisa ser clara, verdadeira, objetiva e de acordo com a sua compreensão. O ideal é utilizar termos comuns como: morte, falecimento, luto, e é essencial explicar para a criança o significado dessas palavras", aconselha Maria Dirce Benedito.

Foto: Thinkstok

O abandono é uma barreira enfrentada pelo pequeno que se depara com uma perda

Fique alerta

Diante da morte de alguém próximo, não há o que ser feito em relação à imagem da pessoa que se foi. Na intenção de amenizar tamanha ausência, muitos pais optam pela teoria da substituição e tentam compensar a perda com algo ou alguém que ocupe o espaço deixado. De acordo com Maria Dirce, querer substituir é o mesmo que tentar negar. "O luto precisa ser vivenciado para ser elaborado, e a falta precisa ser sentida. Falar da pessoa é uma forma de elaborar o luto. E em um segundo momento, é preciso se reestruturar para dar continuidade aos projetos de vida".

Duas outras questões relevantes são: os objetos que representam a imagem da pessoa ou animalzinho que partiu e a dúvida entre expor ou não o pequeno ao ritual do velório e enterro. "Muitas pessoas mantêm uma situação como se a pessoa fosse voltar, negando a realidade, e isso não é benéfico. Se a criança possuir uma maturidade para compreender o ritual do velório, não tem problema, pois irá perguntar o que não entendeu e o adulto terá como obrigação responder. Caso contrário, poderá fantasiar situações de medo e terror que poderão atrapalhar seu desenvolvimento", alerta Maria Dirce Benedito.

Futuro

A preocupação em relação a lidar com as perdas envolvem também com o futuro dos pimpolhos. Acolher e demonstrar carinho são os melhores remédios nessa hora. Mostre que a morte não é um castigo, mas um acontecimento natural. Não reduza a gravidade do momento, como muitos fazem, dizendo que a pessoa está no céu, virou uma estrela ou foi viajar. "A criança em desenvolvimento pode ter sua capacidade de criar bloqueada, isolando-se do meio social, e poderá desenvolver doenças físicas no futuro. A elaboração do luto é vivenciada em fases e o tempo de cada fase varia muito entre cada pessoa. Quando não elaborado, pode gerar sentimentos de rejeição, regressão, desânimo e depressão, na fase adulta", orienta a psicóloga.

Atualizado em 11 Fev 2014.