Guia da Semana

Amante de cinema que sou, costumo acompanhar, pelo menos por alto, os grandes acontecimentos relacionados à Sétima Arte. Recentemente, a pauta cinematográfica abordada em blogs de críticos e entusiastas foi o filme do estreante Srdjan Spasojevic, A Serbian Film.

O longa metragem ganhou as telonas do mundo em meados de março deste ano e tem estreia prevista no Brasil para 26 de agosto. Aliás, tinha, pois foi proibido no país pelo Ministério Público Federal.

O motivo alegado? Incitar crimes, como pedofilia, estupro e assassinato. De fato, o filme é bastante pesado. Particularmente, não assistiria de novo, mas ainda assim indico para pessoas que tenham estômago. A história é a seguinte: um ator pornô aposentado, Milos, casado e com um filho de cinco anos, começa a passar por dificuldades financeiras. Sendo uma estrela renomada em seus tempos áureos, recebe a proposta de um novo diretor para estrelar uma obra diferente em troca de uma quantia milionária.

Após discutir o assunto com sua esposa, ele acaba aceitando, mas a condição imposta pelo diretor é que não haverá roteiro. Ele deverá reagir às cenas de forma natural. No decorrer do filme, Milos começa a se incomodar com a constante presença de crianças nas cenas de sexo e com a violência explícita para com as atrizes e resolve abandonar as gravações. Tentando dissuadi-lo da ideia, o diretor tenta, a todo custo, explicar a arte presente no estupro, na pedofilia e no homicídio. O ator, consciente, refuta as afirmações do diretor e vai embora.

Essa é a parte que muitos críticos insistem em deixar de fora em suas resenhas: quando o protagonista demonstra ter plena noção entre o que é certo e o que é errado. O que acontece em seguida é que o diretor do filme droga Milos para que ele, completamente fora de si, aja por puro instinto animal. É por conta disso que ele, de fato, mata uma mulher e estupra o próprio filho - sem saber que era uma criança o que tinha sob seu corpo. Ao descobrir o que se passou, o ator se afunda num universo de culpa e nojo e acaba terminando sua vida, ao lado da família corrompida pela ganância e delírios do tal diretor.

O filme é pesado? Sim, muito! Qualquer pessoa conseguiria assisti-lo? Claro que não. Mas o mesmo acontece com muitos longas de Pasolini e até mesmo com o Anticristo, de Lars von Trier, que foi tido como uma abominação por muita gente na época de sua estreia. Em relação ao filme como produção, achei bem editado. Não posso falar sobre o roteiro, pois traduções nunca são boas o suficiente e, como não falo a língua sérvia, fica meio impossível saber até onde as falas foram traduzidas corretamente.

De qualquer forma, o fato de proibirem o longa só causou um reboliço desnecessário em cima dele. Na verdade, publicidade gratuita, pois hoje muita gente que jamais saberia de sua existência lê as críticas e fica instigado em assisti-lo. Sou a favor que o façam, claro, obedecendo à classificação etária. Creio que tratar as pessoas como incapazes de julgar o que lhes é útil ou não só as aliena ainda mais. Por isso, seria interessante deixá-las decidir o que querem ou não assistir.

Reconheço que o argumento dado pelo juiz Ricardo Machado Rabelo, da 3ª Vara Federal de Belo Horizonte, sobre a exibição do filme constituir prática do crime tipificado no artigo 241-C do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) válido. O artigo enquadra como crime passível de detenção de um a quatro anos quem "simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual". Nesse caso, trata-se da violação de uma lei específica em vigor no país, logo, plausível.

Ainda assim, o senso comum insiste em apelar ao argumento de que o filme incita crimes graves, bem... em minha humilde opinião, essa alegação consiste em pura e nítida hipocrisia, pois longas rentáveis, como a franquia Velozes e Furiosos, Duro de Matar, Missão Impossível, Jogos Mortais e qualquer outro filme que já cansamos de ver na Sessão da Tarde, como Velocidade Máxima e Um Crime Perfeito, por exemplo, também incitam rachas, assassinatos, ações humanamente impossíveis de se realizar, sequestro e roubos. Isso sem falar de clássicos do gosto popular, como Laranja Mecânica e Clube da Luta. Ainda assim, o Ministério Público Federal não se pronunciou a respeito deles e os críticos só os têm como o que de fato são: filmes ruins que utilizam violência desnecessária para atingir uma massa sedenta por um escape da rotina e vender ingressos.

Quem é a colunista: "Ela não desiste e leva boias. E se ela se afogar, se recupera" - Caio F.

O que faz: jornalista, cinéfila e professora de inglês nas horas vagas.

Pecado gastronômico: Comida japonesa.

Melhor lugar do mundo: qualquer lugar que faça frio e me permita ficar enrolada num edredom quentinho assistindo a um bom filme.

O que está ouvindo no carro, iPod, mp3: Um misto de nomes compostos - Marina and the Diamonds e Florence and the Machine.

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Atualizado em 10 Abr 2012.