Guia da Semana



Com roteiro na mão e uma ideia na cabeça, Matheus Souza, de apenas 20 anos, reuniu-se com amigos para fazer seu primeiro longa-metragem na universidade. O orçamento de R$ 8 mil não foi empecilho para o grupo que, ajudado pela PUC-Rio e usando suas instalações, apostaram nos diálogos para filmar dois atores - Érika Mader e Gregório Duvivier - em uma narrativa sobre uma jovem que resolve abandonar o namorado e fugir para um lugar desconhecido. Antes de partir, ela decide encontrá-lo, mas eles têm apenas uma hora para fazer um balanço bem-humorado de suas vidas.

O despretencioso filme Apenas o fim deu certo até demais. Além de ganhar o prêmio de Melhor Filme do Júri Popular do Festival do Rio, foi premiado na Mostra de São Paulo e recebeu convites para Roterdã (Holanda) e Miami (EUA). Agora, entra em cartaz em salas de cinema paulistas, cariocas e brasilienses. Antes da estreia, batemos um papo com Matheus, apontado pelo cineasta brasileiro Domingos de Oliveira como a cara da nova geração do cinema nacional.

Guia da Semana: Quando surgiu a ideia de montar o filme?
Matheus Souza:
Estava no terceiro período da faculdade e queria muito montar um longa, mas um longa possível. Precisava conquistar as pessoas. Então, falava que o longa é mais fácil produzir do que um curta. Mentia na maior cara de pau, dizendo que todo mundo iria simpatizar com o filme, mas não fazia nenhuma ideia de que fosse dar em tudo isso. Resolvi trabalhar em cima da coisa que sabia fazer melhor, que era o diálogo. Usando situações que tinha passado nas minhas relações amorosas e as dos meus amigos.

Guia da Semana: Quais foram as principais dificuldades encontradas?
Matheus:
Tínhamos uma série de limitações, uma delas orçamentária, que é óbvia. A outra é que tinha que fazer o filme com equipamentos da Puc-Rio, nossa faculdade. Mas só podíamos usar nas férias e tinha uma regra que não podia sair de dentro da universidade com os equipamentos. Então, tive a ideia que ninguém teve, por mais que parecesse óbvio: era que o filme passasse totalmente dentro da faculdade. Nisso, peguei os moldes de filmes possíveis e de que gostava bastante, como Antes do Por do Sol e Antes de Amanhecer, de Richard Linklater, O Balconista, de Kevin Smith, e tinha um filme que tinha assistido no festival do Rio, O Nosso Amor do Passado. Gostei bastante desse molde de filmes de diálogos, com poucos personagens e escrevi o meu longa. A minha ideia já era meio pretenciosa, então, preferi ser modesto nos cenários, figurinos e todo resto.


A narrativa foi filmada dentro da Puc-Rio, com equipamentos da própria universidade

Guia da Semana: Ao ver o filme, percebe-se que algumas vezes o protagonista se confunde com o autor. Como isso foi pensado?
Matheus:
Estava conversando com Matheus Nachtergaele e ele falou que o filme, quanto mais para dentro, mais para fora. Meus principais ídolos têm esse egocentrismo, como Wood Allen, Domingos de Oliveira, Kevin Smith e Nick Hornby. Por isso, no filme tem rolado uma identificação e várias pessoas falam "Pô cara, sou exatamente assim. Como você conheceu uma Érica Mader?".

Guia da Semana: Quanto tempo durou a elaboração do roteiro? Qual foi o custo total?
Matheus:
Foi durante umas férias, durou cerca de 15 a 20 dias. Fizemos o filme com orçamento de uma rifa de uísque. O custo total ficou entre R$ 7 mil e R$ 8 mil. Mas, na verdade, a gente não faz a menor ideia de quanto foi exatamente, não fizemos esse controle, cada um pagava um pão na chapa por dia e ia fazendo assim.

Guia da Semana: Quais as referências cinematográficas utilizadas no filme?
Matheus:
Li muitos livros de entrevistas com diretores, e nove entre dez dizem que o melhor jeito de aprender a filmar é filmando. Queria aprender e, dentro daquilo, brincar um pouco, homenageando alguns diretores e obras favoritas. No mais superficial, encho o diálogo com referências pop, já que sou apaixonado por cultura pop. O filme fala sobre tudo que me toca e de tudo que tocaram as pessoas com quem me relacionei. Além do formato semelhante ao Antes do Por do Sol e Antes de Amanhecer, brinquei de Fellini, com aquela coisa onírica. Já de Rosselini, tirei a ausência de um roteiro exato, deixando os atores na improvisação. Tentei brincar da melhor maneira possível com planos de Wes Anderson, abertos, simétricos e milimetricamente construídos. Essa diversão foi modesta, é claro, já que minha inexperiência é nítida em alguns momentos.

Guia da Semana: Como foi a escolha dos atores?
Matheus:
Chamei amigos e pessoas que conheci do teatro, já que Érika e Gregório faziam curso de Tablado no Rio. Sou muito fã do Gregório, acho ele um dos melhores atores de comédia jovem do Brasil e a pessoa perfeita para ser meu alterego. Já a Érica é um encanto, muito talentosa. Ela teve um encanto pra não transformar a personagem em uma chata.

Guia da Semana: Como vocês decidiram participar do Festival do Rio?
Matheus:
A gente se inscreveu depois que Mariza Leão entrou no projeto. Sempre quis participar do Festival do Rio. Queria entrar, mas não imaginava chegar a uma amostra tão competitiva e ganhar. Os outros festivais foram consequências.

Guia da Semana: Domingos de Oliveira afirma em um artigo na Bravo que gostou muito do filme e vê você como um diretor que veio para ficar e representar essa nova geração. Qual sua opinião isso?
Matheus:
Acho incrível, pois ele sempre foi um dos meus principais ídolos. Todas as Mulheres do Mundo é meu filme brasileiro favorito. Ele acabou virando um tipo um pai pra mim, já me chamou para ser assistente de direção em um curso, protagonista de um peça que ele estava fazendo. E me trata como filho.

Guia da Semana: Já tem outros roteiros em mente?
Matheus:
Tenho dois. Estava na dúvida do que faria, muito nessa questão do segundo cd de uma banda que fez sucesso. Então, fiz dois filmes ao mesmo tempo. A primeira aposta é Modesto, por Enquanto, que fiz no encerramento da faculdade, com orçamento de R$ 3,5 mil, falando sobre relacionamento, jovens. O outro é Pessoas Felizes, sobre outra faixa de idade, 40 anos, e relações humanas, de uma forma diferente.

Atualizado em 6 Set 2011.