Los Angeles
Embora a evolução da animação computadorizada fique mais assustadora a cada novo filme, as regras básicas do gênero já estão definidas. Nenhum grande salto tecnológico ou narrativo surge desses mundos imaginados por estúdios como Disney, DreamWorks e Fox. Sabendo disso e munidos de uma descarada paixão por arte, os diretores Sam Fell e Robert Stevenhagen dedicaram quatro anos à adaptação de um clássico infantil: O Corajoso Ratinho Despereaux. Com elenco dos mais estelares (Dustin Hoffman, Sigourney Weaver, Matthew Broderick, Frank Langella e Emma Watson), o filme conta a história de um povo apaixonado por sopa, um rato e coragem. Mas calma, não tem nada a ver com Ratatouille. Despereaux carrega uma aura nobre, mas se perde no deslumbramento visual, que atrapalha o ritmo e nos faz torcer para que Reneé invada esse filme e leve um pouco do tempero de Ratatouille a essa estréia da Universal.
Despereaux é um camundongo diferente. Ele não tem medo de nada e se destaca numa sociedade enraizada no conceito de que para continuar vivo, é preciso temer e fugir dos perigos. Ele os encara e mostra aos pequenos que existe lugar para coragem nesse mundo. Aliás, os diretores acreditam muito nisso e colocaram a teoria à prova, ao utilizarem referências a Caravaggio, por exemplo, na identidade visual, deixando de lado a opção de um filme mais acelerado. "Ficar repetindo o que o gênero tem feito há anos não fazia sentido. Temos um clássico nas mãos e ele possui sua identidade própria", comentou Sam Fell, em entrevista ao Guia da Semana. É um passeio visual, sem dúvidas, mas o apelo infantil foi deveras prejudicado.
Não que falte carisma dos personagens, mas eles são lentos. Na grande quantidade de passeios pelos belíssimos cenários, seja em um grande calabouço ou na ponte de um navio que desbrava os oceanos, a calma dita o ritmo. Essa característica o distancia da fórmula de sucesso de Bolt, por exemplo, mesmo transmitindo uma bela mensagem. Fica a impressão de filme profundo capaz de atingir os adultos e entediar crianças, ou vice-versa. Não há público definido, um problema em termos de bilheteria hoje em dia.
O ritmo do longa facilitou o trabalho do elenco de vozes. Somente Sigourney Weaver era a narradora da história, mas seus companheiros fizeram trabalho semelhante ao gravar tudo muito tranquilamente e sem grandes desafios. Dustin Hoffman diz não gostar do estilo, interpretando o rato Roscuro.Já Emma Watson não precisou gastar muito tempo para criar sua Princesa Pea, enquanto Matthew Broderick não fugiu muito de seu estilo de dublagem, mas não inovou. Sobrou para Langella o trabalho de colocar algum peso, com sua voz soturna e assustadora, que só perde para o vozeirão de Christopher Lee, capaz de transformar qualquer palavra (pirulito, por exemplo) na coisa mais assustadora do mundo.
O Corajoso Ratinho Despereaux foge da mesmice e paga o preço da coragem sem empolgar imediatamente. Pode ganhar reconhecimento no futuro e se tornar cultuado (a identidade visual particular dos sonhos cavalheirescos de Despereaux é belíssima e inesquecível), mas não se aproxima de sucessos divertidos como Shrek, dramáticos como Wall-E, ou aventureiros como Bolt. Belíssimo, mas literário demais, com um quê de TopoGigio.
Quem é o colunista: Fábio M. Barreto adora escrever, não dispensa uma noitada na frente do vídeo game e é apaixonado pela filha, Ariel. Entre suas esquisitices prediletas está o fanatismo por Guerra nas Estrelas e uma medalha de ouro como Campeão Paulista Universitário de Arco e Flecha.
O que faz: Jornalista profissional há 12 anos, correspondente internacional em Los Angeles, crítico de cinema e vivendo o grande sonho de cobrir o mundo do entretenimento em Hollywood.
Pecado gastronômico: Morango com Creme de Leite! Diretamente do Olimpo!
Melhor lugar do Brasil: There´s no place like home. Onde quer que seja, nosso lar é sempre o melhor lugar.
Atualizado em 6 Set 2011.