Guia da Semana

Los Angeles


Mesmo quem não é fã de Alan Moore já ouviu o nome Watchmen. Considerada uma das cem histórias mais relevantes do século passado, essa graphic novel rompeu barreiras, mudou o jeito de pensar de muita gente e agora ganha as telas de cinema. O longa conta uma história de manipulação social, falência do Estado e mostra um mundo onde vigilantes mascarados e super-heróis existem de verdade. É a chamada realidade alternativa, gênero visitado pelo próprio Alan Moore em A Liga Extraordinária e O Homem do Castelo Alto, de Philip K. Dick. Ao criar uma sociedade diferente, Watchmen explora diversas facetas da humanidade e, claro, critica os Estados Unidos e o "sonho americano" do começo ao fim.

Depois de uma polêmica judicial envolvendo os estúdios Fox e Warner, que quase impediu seu lançamento, Watchmen chega aos cinemas no dia 6 de março. Mesmo assim, nem tudo são flores, já que mudanças no roteiro original de Alan Moore - que preferiu não se envolver com a adaptação - ainda assombram os fãs. A maior delas diz respeito ao final da trama, que envolve um monstro gigante e uma explosão catastrófica. A grande presença de cenas em câmera lenta também tem gerado controvérsia entre os fãs mais ardorosos.

Toda a ansiedade se dissipa quando a abertura do longa-metragem toma a atenção de todos, com a trilha sonora de Bob Dylan (The Times They Are A-Changin´) e uma viagem pelo surgimento dos vigilantes mascarados.

Watchmen se apresenta como uma verdadeira adaptação épica baseada em ótimos diálogos e ação sem exageros. "Não tínhamos um roteiro durante as filmagens", diz Jeffrey Dean Morgan, que interpreta o Comediante. "Cada um tinha sua cópia da graphic novel e era assim que mantínhamos os personagens fiéis ao formato original". Peça chave no roteiro de Alan Moore, o Comediante é um Capitão América às avessas, participando de momentos históricos como operativo de Richard Nixon, cujo governo não foi terminado precocemente por conta do Caso Watergate. O filme é longo, mas não pelo aspecto negativo. Há um novo formato em pauta, um "não-filme", uma peça teatral em formato de filme, um audiobook de luxo. Falta definição, mas sobra audácia por parte de Zack Snyder. A impressão de que alguém está lendo para o público e, como a obra é intensa e requer muita atenção do espectador, a experiência é um pouco desgastante, afinal, ler um livro ou assistir a uma peça sem intervalos é tarefa para poucos.

"O assassinato de John F. Kennedy e a Guerra do Vietnã tornam-se passagens obrigatórias na carreira do Comediante, mas ele consegue, de alguma forma, manter um lado sentimental. Impressionante notar que, mesmo cometendo tantas atrocidades, ele não é um sujeito detestável", comenta Morgan, conhecido por seus papéis em Grey´s Anatomy e Supernatural. Ampliando conceitos transmitidos em poucos quadrinhos no original, o filme consegue dar grande profundidade à já abrangente obra de Moore, especialmente nos momentos agressivos e violentos.

Desse modo, Zack Snyder (300) garante sempre ter vislumbrado um filme para adultos. "Não faz sentido fazer um filme maduro e cortar algumas cenas mais impactantes ou sexuais só para atingir um público mais abrangente", garante o diretor. "Os pontos abordados por Watchmen são inteiramente maduros, não há nada para crianças ou adolescentes ali. Há muita morte, intensidade e, claro, sexo. Embora sem exageros, a noite de amor entre Dan Dreiberg (Patrick Wilson), o Coruja, e Laurie (Malin Akerman), a Espectral, dentro da Owlship acontece assim como no livro. "O que quero mostrar com isso, e o que a graphic novel já contou há anos, foi o quão ridículo tudo aquilo pode parecer. Já imaginou que todo super-herói precisa fazer algo perigoso para ficar excitado?", argumenta Zack Snyder. "Aqueles dois entram no clima depois de encarar um incêndio e salvar um monte de gente. Esse tipo de missão é uma espécie de preliminar para os super-heróis!".

Não há leveza no mundo de Watchmen. Tudo é contado como manda o figurino. Não houve atenuação quando Jon Osterman (Billy Crudup) foi desmaterializado; Dr. Manhattan, exterminando bandidos ou vietcongs, ficou muito mais sangrento e cru do que a apresentação da graphic novel; o Comediante morre depois de um espancamento memorável; e Rorschach é assustador com sua face em movimento. É pesado. Sem concessões quando se cria um planeta à beira do colapso. "Imaginar toda essa sociedade policiada por mascarados e, depois, renegando quem deu a cara a tapa é assustador", comenta Jackie Earle Haley, que interpreta Rorschach, um dos personagens mais cultuados da obra. "Recontar essa história agora é essencial para entendermos alguns caminhos que os Estados Unidos poderiam ter seguido (Nixon continuar no poder por vários anos) e ajudar a compreender a importância das mudanças que acontecem agora por conta da última eleição. É uma oportunidade única, mas igualmente assustadora".

"O primeiro roteiro que me mostraram atualizava a história com elementos mais leves, sem a ameaça atômica", lembra Snyder, que já garantiu estar fora caso algum estúdio resolva investir numa continuação. "Mas provei a todos, depois de um longo processo de reeducação, que não havia sentido em adaptar Watchmen se não fosse a mesma história da graphic novel. Não seria certo e, caso não concordassem, eu teria deixado o comando". Assim, Snyder ganhou uma frase de seus fãs "In Snyder we trust/Em Snyder Confiamos". Assumiu uma responsabilidade que nenhum outro diretor da atualidade poderia, ou teria condições, no momento e realizou uma tarefa que muitos consideravam impossível. Watchmen - O Filme é uma realidade e mais um capítulo da história mundial reescrito e apresentado aos cinéfilos do mundo todo. Alan Moore poderia assistir a esse filme sem temer pela essência de sua obra.

Quem é o colunista: Fábio M. Barreto adora escrever, não dispensa uma noitada na frente do vídeo game e é apaixonado pela filha, Ariel. Entre suas esquisitices prediletas está o fanatismo por Guerra nas Estrelas e uma medalha de ouro como Campeão Paulista Universitário de Arco e Flecha.

O que faz: Jornalista profissional há 12 anos, correspondente internacional em Los Angeles, crítico de cinema e vivendo o grande sonho de cobrir o mundo do entretenimento em Hollywood.

Pecado gastronômico: Morango com Creme de Leite! Diretamente do Olimpo!

Melhor lugar do Brasil: There´s no place like home. Onde quer que seja, nosso lar é sempre o melhor lugar.


Atualizado em 6 Set 2011.