Guia da Semana



Não gosto de seguir o óbvio, mas às vezes é inevitável. Nessa época do ano todos falam de natal e listas de final de ano. Listas de melhores, mais importantes, listas específicas com regras, sem regras, com restrições, sem restrições... listas, listas e listas. Não tenho muita paciência pra elaborar as minhas, porque listas são tão efêmeras quanto casamento de celebridades. E vejo as dos outros apenas para me divertir ou para me irritar.

Mas, tentando não ser óbvio e ao mesmo tempo não parecer chato demais fugindo do óbvio, que no fundo todos gostamos, resolvi falar aqui dos filmes que marcaram meus natais, mesmo que seus enredos nada tenham a ver com a data.

Na verdade, acho que todos temos nossos filmes de natais, aqueles que, para nós, sempre estarão ligados a essa época do ano. Afinal, é impossível - nem que seja pela nostalgia inocente da infância, quando ainda se crê na (argh!) magia do natal - não se deixar marcar por certas coisas que vivenciamos nessa época. E filmes são, e sempre serão, parte de nossas vivências.

Das minhas vivências cinematográficas de natal, guardo especial carinho por dois exemplos. Os vi na TV, em natais diferentes, madrugada adentro, depois da ceia, depois de todos terem ido dormir. Era ainda criança, por isso me marcaram tanto. Mas não só por isso, e também porque são dois clássicos indiscutíveis do cinema.

O primeiro é nada menos que A Noviça Rebelde, de Robert Wise. Um musical encantador de 1965. Como descrever o encanto de Julie Andrews cantando nos Alpes em sua primeira aparição? Impossível. Especialmente quando se é criança numa noite de natal. O filme faturou na época cinco Oscars e ficou três anos em cartaz. Suas músicas, o encanto de Andrews na figura de "Fraulein" Maria, as crianças do elenco e a história simples, porém cativante, contribui para tornar este filme inesquecível, seja no natal ou em qualquer época do ano. Um filme para ser visto sempre, muitas vezes.

O segundo é ainda mais antigo e também muito premiado. O Mágico de Oz, de 1939, eu o vi nas mesmas circunstâncias, numa outra noite de natal, madrugada adentro. Exerce sobre mim o mesmo encanto e também deve ser visto sempre, com ou sem natal. Indelével em minhas recordações nostálgicas está Doroty e seu cão Totó, a Bruxa Má do Oeste, a estrada de tijolos amarelos e as canções do filme. As cenas do tornado levando a casa de Doroty, ela vendo pela janela a vizinha velha mal-humorada flutuando em sua bicicleta, também levada pelo tornado, tudo isso se dimensiona imensamente numa noite de natal.

O cinema é uma experiência extraordinária. Algumas vezes, mesmo quando visto na simplicidade de uma TV em preto e branco, onde o amarelo dos tijolos da estrada que leva a Oz tem seu brilho colorido apenas na imaginação voraz de uma criança sob o encanto de um filme. Nestas ocasiões, creio, o cinema e sua fantasia podem adquirir dimensões maiores do as vividas numa sala de cinema.

Certamente vi outros filmes, em outros natais, de outras épocas. Mas nenhum deles tiveram a capacidade de me marcarem tanto quanto estes dois, que em minhas nostalgias sempre estarão ligados à noite de natal e a uma época que já se perdeu.

Noites de natal nunca são as mesmas depois que se cresce, depois da infância. Mas os filmes podem e continuam sendo os mesmos, e podem ser nosso último, nosso único elo com um tempo de inocência e deleite sonhador. Um tempo perdido no tempo, atropelado pela vida adulta e seus desafios, tristezas e desilusões. Preservar esses filmes (revendo-os, revivendo-os) é nossa melhor maneira de preservar um pouco daquilo que não deveríamos nunca perder: a capacidade de sonhar e de acreditar. Feliz natal a todos.

Quem é o colunista: gordo, ranzinza e de óculos.

O que faz: blogueiro, escritor e metido a crítico de cinema.

Pecado gastronômico: massas.

Melhor lugar do Brasil: qualquer lugar onde estejam meus livros, meus filmes, minhas músicas, meus amigos e minha namorada.

Fale com ele: [email protected] ou acesse seu blog

Atualizado em 6 Set 2011.