Foto: Gabriel Wickbold
Foi através de sua paixão pelo cinema e por achar no personagem uma grande semelhança com o mundo e conflitos da sua vida, que resolveu se arriscar na nova 'profissão' em dois filmes que fizeram parte da Mostra de Cinema de São Paulo. Confira a entrevista que o Guia da Semana fez com o cantor, onde revela sua preferência por personagens anti-heróis.
Guia da Semana: Quando surgiu a oportunidade de atuar nas grandes telas?
Nasi: O Tiaraju (Aronovich) procurava em 2007 um não ator para fazer o Castro. Acho que até pelas características de ser um personagem com um roteiro polêmico, ele pensava inclusive no Lobão também. Primeiro ele me mandou um roteiro. Li, entendi e percebi que poderia dar vida a ele por vários motivos. Depois de conversar pessoalmente e falar sobre as referências de cinema, foi nascendo um diálogo interessante, onde pude viajar em sintonia com Tiaraju para montar aspectos do personagens baseado em coisas que vivi ou estava vivendo.
Guia da Semana: Você trouxe as suas experiências para o personagem?
Nasi: Mesmo a própria turbulência que vivi no fim do Ira!, briga com empresário e irmão, isso foi acontecendo no momento em que eu estava no set de filmagem. Pude levar muito dessa emoção e raiva para ele. É claro que o filme trabalha com vários núcleos, com histórias que se cruzam, mas tem muita coisa que fiz lá que teve influência do que passei.
Foto: Filme Sem Fio/ divulgação
Guia da Semana: Como foi essa primeira experiência?
Nasi: Muito interessante na medida que era um estilo de não atuação, digamos assim, de viver um personagem e construir através de um realismo muito grande. Foi uma coisa até engraçada, enchia o saco deles dizendo que era o diretor de arte. Em um momento, via os baseados e pacotes de cocaínas e falava "Isso é fajuto, peraí que eu vou mostrar pra você como é que faz!". Até uma cena que tinha overdose ajudei, embora nunca tive uma, já presenciei algumas. Isso tudo foi uma coisa que passei, nem tudo era de mim, tinha coisas de convívio com outras pessoas, dependentes. Isso foi abrindo essas gavetinhas que estavam fechadas em mim.
Guia da Semana: Isso de certa forma te incomodou?
Nasi: Teve momentos que foram pesados psicologicamente, como quando o personagem usa o pó - que na verdade é uma proteína usada em academia de musculação. Só o fato de aspirar aquilo me trouxe recordações extremamente desagradáveis. Nunca precisei fazer análise, apesar de respeitar. Acho que é como religião, só funciona para quem acredita. Mas posso dizer que esse filme foi terapêutico, já que pude botar pra fora muita coisa que estava vivendo, minha revolta com o que estava acontecendo e vi que estava me tornando niilista, cínico e cruel. Teve um valor terapêutico pra caralho nessa coisa de exorcizar vários demônios que estavam escondidos em mim mesmo.
Guia da Semana: Além do Sem Fio, você aparece na Mostra de Cinema de São Paulo narrando o Natimorto. Isso estava programado ou foi por acaso?
Nasi: Não podia ser melhor né, cara! O ruim foi que não pude ver Natimorto ainda. Fui chamado na última hora pelo Paulo Machline para fazer essa voz. Sou um puta fã do Mutarelli e não pude ver um filme inteiro, só uns trechos no dia de gravar a locução. Eu não acredito em coincidência, acho que estava na hora de Deus chegar pra mim e falar "Você aguentou o peso até agora, então vou dar uma recompensa para você". Eu não estou criando uma carreira de ator, mas se tem tantos atores que se metem a gravar discos, então chegou a hora da minha vingança (risos).
Guia da Semana: Sentiu alguma dificuldade nessa nova investida?
Nasi: Pra te falar a verdade não senti dificuldade porque o pessoal da Escola de Cinema faz parte de uma trupe muito legal. Eu me senti tão a vontade lá, que naturalmente as coisas fluíam dentro de mim. Queira ou não, sou um cara que vê cinema pra caralho e fiquei bem a vontade e com referenciais muito próximos do tema. Eu já tinha feito algumas coisas com o Selton Mello, como em 2006, participei no quadro que ele criou no Tarja Preta. Fui lá, como os caras dizem, quebrando a perna dos atores. Cheguei em uma tarde com os objetivos da cena, mas tinha liberdade para improvisar nos diálogos. Com certeza não teria a mesma afinidade e desenvoltura com outro estilo de filme, diretor e atuação.
Foto: Eduardo Nicolau
Guia da Semana: Tem algum projeto novo para o cinema?
Nasi: Não. Eu queria que essa nova "carreira" fosse que nem o Tom Hanks, que faz de vez em quando alguns filmes com personagens muito próximos ao seu universo e estética, com diretores que têm uma linguagem próxima a ele. Prefiro que nas experiências que venha a ter no cinema seja no estilo que goste e veria nas telas.
Guia da Semana: Então você não abandona a carreira de cantor?
Nasi: Imagina, pelo amor de Deus! Esse é o meu mundo, onde eu piso descalço. Se o cinema vier para tomar um espaço na minha vida, que seja como o Tom Hanks, até porque não dá pra ganhar dinheiro com cinema como se ganha na música (risos).
Guia da Semana: Você cita e tem simpatia por muitos quadrinistas, como Mutarelli, ou mesmo o Robert Crumb. Além disso você mantem o blog do Rorschard, baseado no anti herói do filme Watchmen. Como surgiu essa idéia?
Nasi: Assim como a maioria das pessoas, prefiro escolher personagens vilões ou bandidos, ou no mínimo contraditórios. Quando tive que fazer a perícia psiquiátrica, passei também pelo teste de Rorschard, com aqueles desenhos todos. No meu site eu já tinha um blog que misturava um pouquinho de desabafo e comunicação com o público, então resolvi dividir. Tem um blog normal que fala o que estou fazendo, onde estou, promoções e tudo mais e o meu lado de exorcizar o rancor, a raiva e a ira, que coloco no Diário de Rorschard, sempre falando de forma metafórica. Eu gosto porque já está criando polêmica, tem gente que não gosta, fica com medo, e é isso que quero provocar. Embora seja pouco, não deixa de ser um exercício de cinema.
Guia da Semana: Você tem algumas referências no cinema?
Nasi: Hoje eu citaria o Leonardo Medeiros, um ator incrível, inclusive participou comigo do clipe Corpo Fechado. Lá fora o Heath Ledger, com o papel do Coringa (em Batman - O Cavaleiro das Trevas). Um grande talento quando morre assim fica imortalizado. Às vezes fico pensando, será que se o Jimi Hendrix estivesse vivo até hoje ele já não tinha feito uma pá de 'bosta'. A última foto é sempre a que fica. Agora que está saindo o último filme dele, O mundo Imaginário do Doutor Parnassus, quero ver.
Atualizado em 1 Dez 2011.