Guia da Semana

De Los Angeles


Sem exageros quantitativos, grandes musicais têm sido revisitados pela indústria cinematográfica. Depois do sucesso da refilmagem Hairspray no ano passado, o próximo nome aguardado pelos apaixonados pelo gênero era Mamma Mia!, versão cinematográfica para a montagem inspirada nas canções da banda sueca ABBA. Muito mais que uma homenagem musical, o longa conta com elenco de peso, mas que se apequena diante de uma Meryl Streep jovial e quase adolescente.

A belíssima Grécia foi escolhida como cenário para o passeio musical pela carreira do ABBA. Por conta disso, tudo é descontraído, os figurinos leves e os personagens não pensam duas vezes antes de soltar a voz ao transpor a icônica montagem de Mamma Mia!, um dos maiores sucessos da história da Broadway, para o cinema. Toda essa leveza, porém, expõe um dos maiores riscos da obra dirigida por Phillida Lloyd, veterana dos palcos ingleses. Tudo é tão alegre, descontraído e pronto para a canção seguinte, que soa irreal até mesmo para padrões de fantasia cinematográfica.

A situação se complica pelo fato de existir a premissa de um grande conflito emocional amarrando a trama. Meryl Streep é Donna, proprietária de uma paradisíaca estalagem no Mediterrâneo que está cuidando do casamento da filha Sophie, vivida pela simpática Amanda Seyfried. Entretanto, ninguém sabe quem é o pai da noiva. Lendo o diário da mãe - amante exagerada e festeira de primeira linha -, ela descobre a identidade de três possíveis candidatos ao cargo e resolve convidá-los para a festa. Assim, entram em cena Pierce Brosnan (esforçado, mas pouco efetivo nas canções), Stellan Skarsgård e Colin Firth, que mostra certo talento com o violão. Só que nada disso é levado muito a sério, afinal, a cada construção dramática, alguém começa a cantar, pular, e a obra causa a impressão de se está diante de uma montagem musical meramente transportada para a telona, mas sem o charme peculiar dos espetáculos da Broadway.

É proveitosa a oportunidade de conferir Meryl Streep esbanjando alegria, sorrisos indecisos e demonstrando momentos de paixonite quase adolescentes, mas ela, ao mesmo tempo, representa o melhor e o pior de Mamma Mia! É fácil acreditar em Meryl, seu talento é inquestionável, contudo a imagem de Miranda Priestly em O Diabo Veste Prada, ou Corrine Whitman em O Suspeito, ainda é muito recente para um contraponto tão gritante. Embora a felicidade não seja crime, nesse caso ela joga contra o patrimônio e transforma o filme em algo indefinido. É cinema ou é Broadway? Não se chega a nenhuma conclusão.

A escolha da trilha sonora é perfeita e, literalmente, escreve o roteiro, cuja melhor descrição seria um organizador de coreografias e canções. Quem ficará feliz sem pensar duas vezes são os aficionados pelo ABBA, que credita à canção Mamma Mia a razão de seu estrelato. Clássicos como Super Trouper, Chiquitita, Our Last Summer e Dancing Queen marcam presença com mesmo peso que a canção título, o que, felizmente, evita a repetição exaustiva como vista no interminável final do novo Hairspray. Mamma Mia, aliás, é executada em sua completude em apenas uma ocasião, deixando para Dancing Queen o cargo de música tema da personagem de Meryl Streep, que encerra a projeção com toda pompa e circunstância que o visual setentista permite.

Visualmente, Mamma Mia! é muito bem-feito e elaborado. A Grécia ajuda, claro, mas não há grandiosidade ou muito detalhamento nos personagens, o que transforma o trabalho corporal, ou melhor, os saltos e corridas durante as canções, no elemento mais importante para se transmitir o espírito descompromissado da história. Tudo ali deixa claro que é hora de relevar os problemas, ignorar a tristeza do passado e aproveitar a vida. É isso que os personagens - todos eles - fazem durante a projeção.

Se o público vai seguir o exemplo e se deixar levar pelas composições de Benny Andersson e Björn Ulvaeus, fica por conta do humor e disposição para não esperar nada além de músicas dos anos 70, balzaquianas curtindo a vida adoidado e um casamento para lá de diferente. Mamma Mia, lá vamos nós!


Quem é o colunista: Fábio M. Barreto adora escrever, não dispensa uma noitada na frente do vídeo game e é apaixonado pela filha, Ariel. Entre suas esquisitices prediletas está o fanatismo por Guerra nas Estrelas e uma medalha de ouro como Campeão Paulista Universitário de Arco e Flecha.

O que faz: Jornalista profissional há 12 anos, correspondente internacional em Los Angeles, crítico de cinema e vivendo o grande sonho de cobrir o mundo do entretenimento em Hollywood.

Pecado gastronômico: Morango com Creme de Leite! Diretamente do Olimpo!

Melhor lugar do Brasil: There´s no place like home. Onde quer que seja, nosso lar é sempre o melhor lugar.

Atualizado em 6 Set 2011.