Guia da Semana

Dois meses depois de lotar os cinemas com a primeira parte de seu novo projeto, Lars Von Trier finalmente fecha o ciclo de “Ninfomaníaca”, um filme dividido em dois cujo final estreia no dia 13 de março. O resultado é seu trabalho mais sincero e provocador até agora – mais maduro que “Anticristo”, mais irônico que “Melancolia”. Longe de entretenimento barato ou pornográfico, o diretor faz uma retrospectiva densa de sua obra e alfineta a si mesmo, ao público e à crítica.

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A situação é a mesma: Joe (Charlotte Gainsbourg) continua sentada na cama de hóspedes de Seligman (Stellan Skarsgard), o “homem feliz” como sugere seu nome. Ela, sem nenhum senso de humor, narra sua saga de prazer e sofrimento com o peso da culpa e uma xícara de chá.

Se a primeira parte apresentou a juventude de Joe (Stacy Martin) e suas conquistas sexuais irresponsáveis, a segunda mostra as consequências daqueles anos para a mulher já adulta. Ela perdeu a sensibilidade e será capaz de arriscar seu corpo e sua família para recuperá-la.

Em pouco tempo, uma das parábolas do anfitrião dá ao espectador uma pista das intenções de Von Trier: Joe e Seligman talvez simbolizem dois lados da mesma Igreja. Romana e Ortodoxa, Ocidental e Oriental. Uma, pessimista e opressora; a outra, otimista e ingênua.

A fixação por religiões marca a carreira do diretor e faz dele a “persona non grata” de todos os festivais. Von Trier já se compadeceu por Hitler e lançou um movimento minimalista contra todas as tendências de Hollywood, mas o que realmente incomoda é seu ateísmo. Filme após o outro, ele trata questões religiosas com rigor psicológico e nos faz olhar para tudo o que a Igreja esconde sob o tapete: o sexo, a morte, o ego.

Quem assistiu aos outros longas do dinamarquês há de sentir o déja-vu. Num momento-chave, a trilha sonora repete a de “Anticristo”, com Gainsbourg novamente no papel de mãe negligente. Em outros, vemos a traição e o sadismo brotarem das fontes mais puras, como no clássico “Dogville”.

Entre momentos tensos e cômicos (como a inesquecível cena do mènage), Lars Von Trier cutuca a hipocrisia de seu espectador: você defende a liberdade sexual? Considera-se livre de preconceitos? E por dentro, o que você realmente pensa?

É fácil julgar Joe, suas decisões são questionáveis e provocam repulsa. Mas a verdade é que ela é a heroína de uma história incomum – uma pessoa cujo plano de vida não inclui casar, ter filhos, ter um trabalho comum.

Lars Von Trier já foi acusado de misógino, o que soa injusto já que “Ninfomaníaca” é uma crítica pesada à objetificação da mulher. Uns se aproveitam da hipersexualidade de Joe, outros a temem e tentam controlá-la, mas ninguém tenta, de fato, compreendê-la ou encará-la como um ser humano.

A protagonista é vista e age como uma máquina sexual, até dentro de sua própria narrativa (na vida real, porém, há outra Joe muito mais humana que nos conduz por sua história).

A mensagem do diretor mais polêmico da atualidade é clara e urgente: a mulher carrega o fardo de desejar e ser desejada, mas também de ser reprimida por isso a todo o momento – inclusive por si mesma e por nós, espectadores hipócritas com nossas vidas sem pecados.

Assista se você:

- Gostou de Ninfomaníaca - Volume 1
- Gostou dos outros filmes de Lars Von trier
- Procura um filme inteligente

Não assista se você:

- Fica constrangido ao ver órgãos sexuais explícitos
- Não gosta de filmes europeus
- Procura um filme erótico

Por Juliana Varella

Atualizado em 14 Mar 2014.