Guia da Semana


Enquanto filmes como Se Eu Fosse Você 2 comemoram seus resultados, outros trabalhos nacionais amargam anos antes de estrear

Depois de um 2008 fraco, o cinema nacional tem em 2009 um de seus melhores momentos. Enquanto Se Eu Fosse Você 2 conquistou a maior bilheteria de um filme nacional desde a retomada, Os Normais 2 caminha como um concorrente de peso, tendo sido lançado em mais de 400 salas, a maior estreia do cinema brasileiro recente. Mesmo assim, no entanto, muitos filmes sequer conseguem um espaço para serem vistos.

Enquanto há alguns anos o culpado podia ser o preconceito do público, hoje esta tese perde espaço. Cineasta e idealizador do projeto Cine Tela Brasil, que exibe filmes nacionais nas periferias, Luiz Bolognese percebe logo o sucesso das obras em seu público. "Eles se identificam com o conteúdo, com a fala, tanto que quando passam na televisão, são campeões de audiência", lembra. O diretor José Eduardo Belmonte, que aguarda desde 2007 para colocar Meu Mundo em Perigo nas salas, percebe um problema. "O pais é imenso, mas muito pouca gente pode ter acesso ao cinema, o publico é majoritariamente classe média alta".

E é justamente esta classe alta, de acordo com Bolognese, que ainda rejeita o produto nacional. "O cinema brasileiro é muito popular, o público de bairro adora nossos filmes, muito mais do que a elite 'miamista', que torce o nariz". Em seu projeto, que percorre o Brasil todo, o cineasta percebe que é grande o número de pessoas que nunca havia visto um filme nas telas antes. "Só 8% dos municípios brasileiros têm sala de cinema, segundo o IBGE, mas mesmo quando a gente projeta na periferia de São Paulo, metade do público diz que nunca foi ao cinema".


Com Leonardo Miggiorin, Maytê Piragibe e Mara Carvalho, A Rinha pode estrear fora do Brasil antes de chegar às telas nacionais

Com dois filmes aguardando espaço nas salas, Bellini e o Demônio e A Rinha, o diretor Marcelo Galvão vê dificuldade em convencer o distribuidor. Sobre o último, feito do seu próprio bolso, ele diz que "ainda não tive nenhuma proposta de distribuição nacional, mas já tive de fora, estou fechando um acordo, já recebi proposta de uma grande distribuidora americana, o filme está seguindo seu caminho". Bolognese, roteirista de Bicho de Sete Cabeças, minimiza a culpa da distribuição. "A gente precisa acertar a mão no filme médio, o filme de 100 a 500 mil espectadores, e isto, em minha opinião, é culpa dos realizadores, não podemos jogar esta responsabilidade só nos distribuidores".

Com a visão dos dois lados, o distribuidor e realizador André Sturm concorda com o colega. "Não é um problema de distribuição, o difícil é conseguir atingir o público, porque ele quer cada vez mais assistir aos grandes filmes". Sturm complementa que "filmes menores têm dificuldade de entrar no mercado, não por serem brasileiros, mas por serem menores", como acontece com a cinematografia de diversos países. Neste sentido, Bolognese acredita que "o cinema está virando evento, ou o filme faz 2 ou 3 milhões, ou faz 20 mil, a gente está perdendo o filme médio, que é o que mantém a diversidade".

Em uma coisa, no entanto, todos concordam. O cinema teria mais público se fosse mais barato e houvesse mais salas. Para Bolognese, o Cine Tela Brasil "comprova que o nosso problema é o preço do ingresso, porque estamos há cinco anos projetando filmes gratuitos na periferia e a taxa de ocupação do nosso cinema é de 88%, enquanto a taxa de ocupação de multiplex não chega a 30%". Galvão complementa que "você vê o tamanho do Brasil e o tamanho do México, e nós temos menos do que a metade do número de salas que eles".


Exibindo apenas filmes nacionais em regiões sem cinemas, o Cine Tela Brasil, de Luiz Bolognese e Lais Bodanski, alcança a melhor ocupação de tela do país

André, que também é da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, revela que há programas que tentam resolver isto, como o "Vá ao Cinema", que subsidia ingressos para filmes brasileiros. Segundo ele, o programa foi responsável por 20% da bilheteria do cinema nacional em 2008. "A melhor solução é buscar possibilidades de subsidiar o ingresso, porque se você ajuda no ingresso e aumenta muito o público, o preço cai". Galvão acredita que o programa deve ir além. Ele diz que "tem que ter uma política de construção de salas de cinema, isto faz uma diferença enorme".

Mesmo tendo colocado seu filme Se Nada Mais Der Certo nas telas, Belmonte quer mudar a tática para a próxima produção. "Quero distribuir de forma tradicional, mas também criando uma rede popular, quase circense, de distribuição. Quando criarmos uma rede regular popular, boa parte dos nossos problemas estarão resolvidos". Depois de promover quase 3 mil sessões, de 68 filmes, para mais de 570 mil pessoas, todos em regiões que não oferecem salas de cinema, Bolognese acredita no futuro do filme nacional. "Sou otimista, porque trabalho na periferia há cinco anos e vejo como recebem bem o filme brasileiro, e quando você apresenta uma coisa nova, diferente do que eles vêem na televisão, eles vão aceitando".

Atualizado em 6 Set 2011.