Guia da Semana

Fotos: Imdb

O cinema de suspense nunca mais foi o mesmo depois dele. Entre mulheres assassinadas no chuveiro, homens inocentes acusados de crimes que não cometeram e personagens politicamente incorretos, o cineasta britânico Alfred Hitchcock revolucionou a maneira de fazer suspense na sétima-arte e deixou sua marca registrada ao longo de 55 anos de carreira. Para homenagear o legado desse grande diretor, o Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo (SP) recebe, até o dia 24 de julho, a Mostra Hitchcock, uma retrospectiva abrangente de toda a obra do cineasta.

Mestre do supense

No programa da Mostra, na qual diversos autores destrincham a carreira do diretor, o professor Heitor Capuzo, autor do livro Alfred Hitchcock: o Cinema em Construção, explica que o termo suspense é utilizado no cinema para designar uma modalidade dramática que inclui, muitas vezes, filmes tematicamente centrados em intrigas de espionagem, investigações policiais, assassinatos seriais e outras formas de contravenções.

No texto, Capuzo ressalta que o diretor foi denominado o mestre do suspense não exatamente por realizar filmes com essas temáticas, mas por compreender e demonstrar que o suspense não define por si uma modalidade dramática. "Mas uma instigante estratégia narrativa que, segundo Alfred Hitchcock, seria atingida através do estabelecimento de um pacto com o espectador, permitindo que o mesmo tenha acesso com exclusividade a informações dramáticas desconhecidas aos personagens da trama".

O próprio Hitchcock dizia que, se uma bomba explode embaixo de uma mesa onde os personagens estão sentados, temos um susto. No entanto, se o espectador vê a bomba embaixo da mesa e os personagens continuam conversando, sem saber da existência dela, isto é suspense. Por isso, na maioria de seus filmes, o espectador normalmente tem mais informações do que os personagens, criando uma tensão crescente que era prolongada ao máximo pelo diretor.

Sucesso no cinema americano

O diretor, ainda sem os conhecidos cabelos brancos, com Joan Fontaine e Laurence Olivier em Rebeca, a Mulher Inesquecível.

Alfred Joseph Hitchcock nasceu em 13 de agosto de 1899, na cidade de Londres, Inglaterra. De família católica, em meio a uma Inglaterra protestante, ele queria ser engenheiro, mas acabou, ainda bem jovem, desenhando legendas de filmes mudos numa produtora londrina. Depois de um breve período de aprendizado, como assistente de direção e montador, em 1925 finalizou seu primeiro filme, uma co-produção anglo-germânica chamada O Jardim dos Prazeres. Já nessa primeira obra, existem paralelos com uma das suas mais famosas criações, Psicose (1960), pois também estão lá o lugar remoto, a mente perturbada e os mortos que assombram os vivos.

Essa "fase inglesa" durou até 1940, quando o produtor David O. Selznick, que havia acabado de ganhar vários Oscar pelo épico E o Vento Levou (1939), o convidou para trabalhar nos Estados Unidos. Acreditando no potencial do jovem Hitchcock, Selznick confiou a ele o ambicioso projeto de Rebeca, a Mulher Inesquecível (1949), que contava a história de uma jovem (Joan Fontaine) que se casa com um rico nobre inglês chamado 'de Winter' (Laurence Olivier). Quando vai morar na mansão de seu esposo, ela descobre que ele é viúvo de uma mulher que muito amava, morta de forma trágica.

Gradativamente, a jovem se vê à sombra da antiga esposa, tendo que se vestir igual a ela e ter os mesmos hábitos. Tudo controlado pela sinistra governanta Sra. Denvers. A submissão da protagonista ao novo mundo em seu redor era tamanha que nem um nome fixo ela possui, sendo conhecida apenas como a Sra. de Winter, exatamente como a outra esposa.

Injustiçado

Apesar de todo o sucesso com o público, o diretor nunca foi reconhecido pelo Oscar.

Naquele ano, Rebeca, a Mulher Inesquecível foi premiado com o Oscar de Melhor Filme, porém, Hitchcock considerava que o prêmio era de Selznick, e não seu. Isso porque essa categoria premia os produtores dos longas, e não seus diretores, que possuem uma categoria própria dentro da premiação. Em toda a sua carreira, Alfred Hitchcock concorreu ao prêmio de direção cinco vezes, sem nunca vencer.

Deixar o mestre do suspense sem o devido reconhecimento foi uma das maiores injustiças da história do Oscar. A solução da Academia foi entregar um prêmio honorário, em 1968, pelo conjunto da obra . Hitchcock, muito educado, obviamente compareceu para receber o prêmio. No entanto, seu discurso de agradecimento foi um curto, objetivo e um tanto magoado: "Muito obrigado".

Para te ajudar a conhecer um pouco mais da obra deste grande diretor, o Guia da Semana selecionou cinco de seus principais filmes. Tudo recheado com muito suspense.

Festim Diabólico (1948)

Bastidores das filmagens de Festim Diabólico, toda gravado em tempo real. A impressão do espectador é que não há cortes, mas isso não passa de um truque do mestre do suspense.

Este foi o primeiro filme colorido de Alfred Hitchcock, além do primeiro trabalho dele com James Stewart, um de seus atores favoritos. A história é baseada numa peça de Patrick Hamilton, inspirada em um caso real, e conta a história de dois amigos que resolvem assassinar um colega apenas pelo prazer intelectual de matar e enganar os outros. Após cometerem o crime, eles escondem o corpo em um baú e dão uma festa com os parentes do morto, entre eles os pais, a namorada e um antigo professor.

Tudo foi filmado num único cenário, com o mesmo tempo real de ação e sem uso de cortes. Durante as tomadas, quando se passava de um aposento a outro, a parede da sala ou da entrada desaparecia sobre trilhos silenciosos. Os móveis, montados sobre rodinhas, também eram pouco a pouco empurrados.

Janela Indiscreta (1954)


O fotógrafo, vivido por James Stewart, tenta comprovar um crime.

Verão em Nova Iorque. Imobilizado numa cadeira de rodas por ter quebrado as duas pernas, um repórter fotógrafo fica entediado e começa a espiar a vida dos vizinhos pela janela de seu próprio apartamento, até suspeitar que um deles cometeu um assassinato. Com a ajuda da namorada, da enfermeira e um amigo policial, tenta provar o crime.

O filme é sempre narrado pelo ponto de vista do fotógrafo, o que também torna o espectador um voyeur, cúmplice do herói na tentativa de solucionar um possível assassinato. Para rodar o longa-metragem, entre novembro de 1953 e janeiro de 1954, foi construído um enorme set com 31 janelas de apartamentos nos estúdios da Paramount.

Intriga Internacional (1959)

Cary Grant vive o protagonista do filme.

O longa-metragem conta a história do publicitário Roger O. Thornhill (Cary Grant), que é confundido com um espião e se torna suspeito de assassinar um diplomata da ONU. Para salvar a própria pele, ele foge desesperadamente dos agentes do governo e dos verdadeiros vilões.

O filme conta com algumas das mais célebres cenas de ação do cinema, como o ataque do avião pulverizador no meio de um milharal e a caçada humana entre as famosas estátuas com os rostos esculpidos de quatro presidentes americanos, no monte Rushmore (Dakota do Sul). Alfred Hitchcock considerou essas filmagens uma grande brincadeira."Quando Cary Grant estava no monte Rushmore, eu queria que ele se refugiasse dentro da narina de Lincoln e que ali começasse a espirrar violentamente. Teria sido divertido, hein?"

Psicose (1960)


A atriz Jane Leigh, na famosa cena do assassinato no chuveiro.

A mais famosa obra-prima do cineasta. No filme, uma jovem foge com US$ 40 mil roubados da imobiliária onde trabalhava. Planejando se encontrar com o amante, que mora em outra cidade, ela interrompe a viagem para dormir em um velho motel de beira de estrada, administrado por um estranho rapaz, que mora com a mãe. Baseado em romance de Robert Bloch, com trilha sonora de Bernard Herrmann, Psicose teve três continuações e uma refilmagem.

Na época em que lançou o filme nos cinemas, Hitchcock criou uma espécie de "política especial" para quem fosse assistir ao longa nas salas de exibição. Na advertência, exibida no trailer do filme, o próprio diretor avisava que era terminantemente proibido entrar no cinema após o início do longa.

Os Pássaros (1963)

Você nunca mais verá um inocente pombo do mesmo jeito depois do filme.

Melanie Daniels chega a Bodega Bay, na região de São Francisco paquerada por um solteirão, Mitch. Lá, ela é inexplicavelmente atacada por uma gaivota que, na verdade, é apenas o começo de um ataque de diversos pássaros contra os humanos, de forma que eles todos ficam aprisionados numa casa à mercê deles. A ideia original é que o filme fosse tão grandioso quanto Psicose, lançado três anos antes. Não foi.

Apesar de ser um filme muito aplaudido e considerado "clássico", Os Pássaros fica ligeiramente atrás de outras produções hitchcockianas, já que apresenta um suspense diferente, que faz com que os ataques das aves tenham caráter sobrenatural e sem uma explicação no final. O filme praticamente não possui trilha sonora: o som predominante que se ouve é o do bater das asas dos pássaros.

Atualizado em 27 Fev 2014.