Guia da Semana



No meio do mês passado, uma garota de 12 anos se suicidou no prédio vizinho ao meu. Eu não sei quem ela era - agora, nunca saberei -, mas notei que algo deveria estar errado pelo modo como as pessoas se aglomeravam na frente do meu prédio, formando um círculo praticamente impenetrável e impossibilitando a visualização de qualquer que fosse o cenário central que dera origem a tudo aquilo.

Por muita coincidência, alguns dias depois, tornou-se público um caso que emocionou e revoltou muitos brasileiros; Eloá Cristina Pimentel, uma jovem de 15 anos, foi mantida 100 horas em cativeiro pelo ex-namorado, Lindembergue, o que culminou em um final fatídico: o fim da vida de uma jovem que mal tinha alcançado a puberdade e ainda tinha uma vida inteira pela frente.

Embora os dois casos sejam essencialmente diferentes, um ponto entre eles se apresenta de maneira similar: a forma como a atenção de terceiros se manifestou. No dia em que a garota se jogou, não quis ver nada - mesmo que quisesse, duvido que conseguiria com aquela multidão entre eu e o corpo -, mas ouvi um policial berrando para que as pessoas se afastassem.

Em casa, questionei meus pais - que obviamente comentavam sobre o acontecido - sobre o porquê das pessoas se agruparem em volta. Por que não podiam simplesmente deixar que o policial fizesse seu serviço? Por que tinham que agir como se o fato de uma pré-adolescente ter se jogado do sétimo andar fosse um espetáculo imperdível?

Por comoção, eles responderam.

Discordo. Acho que as pessoas usam o termo ´comoção´ como justificativa, mas na verdade não passa de uma curiosidade invasiva e desrespeitosa; o enterro de Eloá, ao qual compareceram oito mil pessoas, é um claro exemplo disso; no evento religioso, pizzas foram pedidas e a garota foi fotografada por celulares diversos. Há um ponto crucial entre a comoção e a falta de respeito e, ao contrário do que muitos pensam, ele não é tênue. Aliás, as duas são bem distintas e o uso de uma para justificar a outra é inaceitável.

A comoção é uma sensação de pesar por alguém ou por uma situação, é um incômodo, é o anseio de poder ter feito algo que mudasse o rumo dos acontecimentos, levando o ocorrido a um desfecho que lhe agradasse. A falta de respeito, por outro lado, é se agrupar em torno do corpo de uma garota de doze anos, impedindo que os policiais consigam fazer seu trabalho, é comparecer a um enterro de uma desconhecida, pedir pizza e tirar fotos.

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Quem é a colunista: Gisele Zwicker. Para ela, um fim de semana perfeito envolve um bom livro, um bom filme e uma ida ao teatro.

O que faz: Preparando-se para prestar o vestibular.

Pecado gastronômico: Filé de frango com arroz.

Melhor lugar do Brasil: São Paulo, Capital. Não há lugar melhor que o lar.

Fale com ela: [email protected]

Atualizado em 6 Set 2011.