Guia da Semana

Foto: Getty Images


Passado esse período mais crítico do nascimento da criança para a escola, quando ela já chorou pela primeira vez (ou melhor, pela segunda vez) e já se adaptou ao seu novo ambiente, as mães podem se afastar um pouquinho, mas não deixam de estar por perto. Isso, na verdade, é muito bom, pois precisamos criar uma parceria com elas, para que nossas crianças possam crescer e se desenvolver. Conseqüentemente, a escola pode deixar de se parecer com a casa de cada um dos alunos - mas não deixa de ser uma casa. Agora, além de escola, ela também é a Casa: grande, forte, única, que abarca todas as crianças.

Além das crianças, como já foi dito, ela também abarca a família. Nesse momento, o professor conquistou sua autonomia. Seu vínculo com as crianças está consolidado e ele pode, então, desenvolver brincadeiras e atividades que acredita serem importantes para aquele grupo e colocar limites. Então, poderíamos dizer que ele seria capaz de caminhar totalmente sozinho, mas, por mais que o conhecimento dele sobre os alunos já seja consistente, a interlocução com a família é extremamente importante. Isso porque não há ninguém que saiba cuidar melhor de uma criança do que seus pais. É um conhecimento que nenhum especialista tem, por mais competente que seja. Esta idéia foi validada inúmeras vezes pelo psicanalista e pediatra inglês Donald Woods Winnicott. Durante toda a sua carreira, ele cuidou de crianças e foi através do contato extensivo com elas e suas mães, que garantiu que esse saber fosse evidenciado milhares de vezes. Assim, se não incluíssemos os pais em nosso dia-a-dia, estaríamos sendo ignorantes.

Dividindo a tarefa de cuidar

O trabalho com crianças de um a três anos não pode ser separado do cuidado do tipo materno. A alimentação e as questões com a higiene ainda são os focos principais a serem trabalhados. Esses cuidados, são a princípio, de responsabilidade da família, mas também estamos intrinsecamente ligados a eles, já que crianças dessa ainda não possuem autonomia para cuidar de si mesmas. A maioria delas, quando entra na escola, ainda está usando fralda e, conseqüentemente, temos participação fundamental no processo de "desfraldamento". Começar a controlar os esfíncteres é um passo crucial e de extrema importância, que deixa marcas significativas na vida de todos nós. Assim, temos uma responsabilidade muito grande nesse aspecto, por isso realizar uma parceria com os pais é fundamental.

Uma outra questão essencial na vida das crianças é a alimentação. Se lembrarmos que crianças pequenas têm dentes e comem alimentos diversos há muito pouco tempo, poderemos ser surpreendidos. Então, perceberemos a importância da escola quanto a isso. Principalmente nas que oferecem o lanche às crianças (com diferentes frutas, sucos e variedades de carboidratos), não é raro escutarmos o relato das mães em relação a mudanças na alimentação de seus filhos. Elas nos contam como, depois que a criança entrou na escola, começou a comer muitos alimentos de que dizia não gostar e descobriu outros que nunca havia comido. Observar os amigos na hora do lanche e participar das atividades de culinária, por exemplo, transformam a relação que a criança tem com a comida. Por outro lado, é importante saber se um aluno apresenta alguma restrição alimentar e pensar como esse fato será trabalhado dentro do grupo e no dia-a-dia da escola. Portanto, a alimentação evidencia claramente a proximidade da escola e da casa e como elas devem estar próximas, uma alterando a outra.

Foto: Getty Images


Casa

Além da alimentação, outros fatores podem transitar entre a casa e a escola transformando ambas, pois as crianças vivem tanto lá quanto cá. Dessa maneira, pode-se pensar que a escola é uma casa grande, onde sempre cabe muito mais do que um ou dois filhos. E cada um deles a transforma um pouquinho, para que ela possa ser sentida como sua casa.

Mas devemos separar e estancar funções? É mesmo paradoxal! A escola dos pequeninos é e não é a casa deles. Certa vez um menininho ficou tão confuso com essa história que disse: "Aqui é a casa do Guto? Eu vou pra minha outra casa?". Não é fácil saber como separar essas duas instituições tão importantes na Educação Infantil, mas isso nem sempre deve ser feito. Essa é uma das grandes sabedorias.

É notório o quanto há de preconceito em relação à Educação Infantil. Existe um senso comum de que os professores mais sérios - "os professores de verdade" - são aqueles que trabalham com os alunos mais velhos. Em resposta a essa idéia, os profissionais que atuam junto às crianças pequenas tentam desesperadamente mostrar o quanto também são "de verdade". Por isso, eles fazem questão de salientar seu saber escolar. Porém, este já está intrinsecamente garantido.

Em contrapartida, a proximidade com o cuidado materno, que os educadores procuram inúmeras vezes negar ou menosprezar, revela-se um dos mais preciosos. É muito importante entender que a educação das crianças pequenas acontece como uma ampliação da família para a escola e não como uma adaptação da Escola Fundamental para os menores.

Se pudermos assumir nosso lugar na Educação Infantil, compreendendo que estamos implicados tanto com a transmissão de conhecimentos, quanto com o acolhimento e cuidados necessários para um bom desenvolvimento, perceberemos a função fundamental do nosso trabalho e como ela é determinante para o resto da vida escolar de qualquer criança.

Leia a primeira parte desta coluna da Professora Zita Garcia:

? A entrada da criança pequena na escola> construindo uma nova casa


Quem é a colunista: Zita Garcia.

O que faz: psicóloga e professora da educação infantil da Escola Viva.

Pecado gastronômico: churros do Bar da Dona Onça ou do Exquisito.

Melhor lugar do Brasil:Qualquer praia sossegada em boas companhias.

Como falar com ela: ou [email protected]


Atualizado em 6 Set 2011.