Guia da Semana

Foto:Getty Imagens


"A maior violência que se faz com a criança é a truculência da publicidade". É assim que a psicóloga Ana Cristina Olmos comenta a maneira como são veiculadas a propagandas destinadas aos pequenos. Os comerciais são feitos para persuadir, mas, falar com o público infantil é uma tarefa que exige delicadeza e muito cuidado.

A criança ainda não tem noções claras do limite entre realidade e ficção, para ela, o que está na televisão é verdade, assim como seus sonhos e outras histórias do cotidiano. Além disto, ela não sabe diferenciar o conteúdo de um programa daquilo que é publicidade.

De mentirinha...

De acordo com a psicóloga Beatriz Ottero, até aproximadamente sete anos, a criança não tem noção crítica da realidade, a partir desta idade esta estrutura começa a se formar, porém, só atinge a maturidade por volta dos 12 anos. "A propaganda passa noções falsas de necessidade. A pessoa sente falta mesmo de objetos que não são essenciais", os adultos ainda conseguem rejeitar esta idéia, porém os pequenos ainda não têm o senso crítico necessário para descartar a mensagem. Assim, se sentem inadequadas e passam por sofrimento e infelicidade quando não ganham aquilo que almejam.

Sobre a questão, os pais devem ficar atentos, pois isto pode ter conseqüências na vida adulta. Quando a criança não sabe o que realmente é necessário, tem dificuldade em estipular objetivos claros, deste modo, não aprende a buscar independência e autonomia.

Além disto, de acordo com a psicóloga Ana Cristina Olmos, o principal efeito da propaganda nas crianças é no que diz respeito à formação da identidade, pois vende a falsos padrões e conceitos que fazem a criança se ver excluída de certa classe, "a propaganda mostra um padrão que não existe, que um ser humano nunca vai se sentir à altura. Sentirá vergonha por ser diferente. No início da vida, estes efeitos são mais profundos".

Não é só isso

De acordo com estudos, a exposição ao conteúdo televisivo tem efeitos negativos na criança, pode levar a problemas, como obesidade e erotização precoce. O primeiro porque mais de metade das propagandas voltadas ao público infantil é sobre alimentos. Já o segundo, está relacionado com a maneira que mulheres são apresentadas. Em seu desenvolvimento, a criança precisa de figuras para seguir, ao ver modelos sedutoras em propagandas, tende a imitar este comportamento.

Solução

Os pais precisam agir, o exemplo começa dentro de casa. De acordo com Isabela Henriques, coordenadora geral do projeto Criança e Consumo do Instituto Alana, é importante que a família faça programas que não envolvam mídia, como passeios ao ar livre e contação de histórias. Também é fundamental que os pais falem o verdadeiro significado das celebrações, por exemplo, mostrar a tradição dos ovos de páscoa e qual é a história do Natal. Aliás, sobre o assunto, a organização disponibiliza em seu site publicações com outras dicas para os pais.

Este programa existe para discutir as relações entre infância, consumo e mídia, além de incentivar o estudo sobre o tema e ainda fazer manifestações em prol de projetos de lei que controlem a publicidade voltada às crianças.

Vai demorar

Em 2001, um projeto legal foi enviado para a Comissão de Defesa do Consumidor, sete anos depois, passou por esta instância, mas precisa ser aprovado outras etapas e ainda pode sofrer alterações. Esta lei visa proibir qualquer material publicitário destinado a crianças.

No Brasil, ainda não há regimento específico sobre o assunto, no que diz respeito à publicidade e direitos da infância, a legislação brasileira tem textos que dão margem a diversas interpretações sobre quais são os limites da propaganda.

Preocupação

Para Andrew dos Reis, dono de uma agência publicitária, a lei que proíbe qualquer comercial voltado para crianças é exagerada. Porém, o publicitário concorda que é preciso ter cuidado ao fazer um anúncio que vise chamar a atenção dos pequenos, "a imagem é voltada para crianças e o texto é feito para os pais", ele ainda ressalta que o mais importante para manter a ética é não usar meios apelativos, ou seja, buscar atrair o consumidor pelo lado emocional.

O Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) tem um código de conduta sobre onde há um parágrafo especial para os pequenos: Quando o produto for destinado à criança, sua publicidade deverá, ainda, abster-se de qualquer estímulo imperativo de compra ou consumo, especialmente se apresentado por autoridade familiar, escolar, médica, esportiva, cultural ou pública, bem como por personagens que os interpretem, salvo em campanhas educativas, de cunho institucional, que promovam hábitos alimentares saudáveis.

Protegendo a cria

Se algum pai sente que seu filho está sendo lesado de alguma forma por certa propaganda, pode encaminhar denúncia para o Ministério Público, PROCON, Ministério da Justiça, Conar ou até mesmo alguma instituição, como a ALANA. A organização recebe queixas e transforma a revolta dos pais em ações civis públicas, com embasamento em leis e estudos.

Sobre o assunto, a Brinquedos Estrela, maior fábrica do setor no Brasil, alegou que a Fundação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (ABRINQ) não aconselha seus membros a se pronunciarem sobre o tema, já que a lei não foi efetivamente aprovada. Por sua vez, procurada pelo Guia da Semana, a ABRINQ diz não haver posicionamento oficial neste assunto.

Fontes: Ana Olmos
Psicanalista da Infância e Adolescência -

Andrew Dos Santos
Publicitário
Dono da agência Gimmick

Beatriz Ottero
Psicóloga Infantil
Clínica Elipse

Isabela Henriques
Advogada
Coordenadora do projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana

Atualizado em 6 Set 2011.