Guia da Semana



Há algum tempo - alguns dias, na verdade - chegou aos meus olhos um e-mail corrente chamado ´a bofetada do ano´, ou algo que o valha. Na apresentação de Power Point, o autor demorou-se explicando todos os governos que tivemos e como reclamamos de todos eles, mas como somos nós quem os colocamos no poder, afirmando que a culpa é do povo brasileiro por eleger Clodovil e Maluf, que incansavelmente nos sabotam.

As duas frases mais marcantes que foram escritas em tal mensagem, seguem em citações: "(...) o problema não está nos deputados, senadores, presidentes, governador, prefeito, funcionário. O problema está naquele que reclama: você e eu, nós! O problema está no brasileiro"; depois de tal frase, segue-se uma infinidade de perguntas envolvendo a moral brasileira - o que esperar de um povo que ´dá um jeitinho para tudo´, valoriza o ´esperto ao sábio´, que ri quando faz um ´gato´ com a TV a cabo do vizinho, finge que está dormindo quando um idoso entra no ônibus, enfim e etc - e conclui com um efêmero "O problema do Brasil não são os políticos; são os brasileiros! Os políticos não se elegeram, fomos nós que votamos neles".

Quando se afirma tão categoricamente que o brasileiro é culpado pela miséria que o cerca, oferecendo meros exemplos de comportamento e questionamentos morais, sem um estudo aprofundado do que se diz, usa-se do recurso mais banal e errôneo que se pode utilizar nesses casos: a generalização; por meio desta, pega-se o comportamento de meia dúzia e o aplica a um grupo bem maior. Nesse caso, a um grupo de 189,6 milhões de pessoas.

É fácil apontar culpados e motivos, afirmar que a culpa da política não é dos políticos, mas dos eleitores; entretanto, não há necessidade alguma de inocentar os políticos - ´a César o que é de César´ -, a culpa é deles, sim; eleitos ou não, não agiram de acordo com a moral e devem ser repreendidos por tanto. Se sonegam impostos, se favorecem seus bolsos aos colégios e hospitais públicos, se não distribuem a renda de maneira igualitária e se não cumprem o que prometeram, merecem ser penalizados.

É prático olhar para a população com um olhar superior e dissecar seus defeitos, seus hábitos. É ainda mais prático acrescentar a tal análise algumas poucas situações cotidianas e fazer delas regras. Entretanto, defendo os brasileiros - não porque sou uma, mas porque acho que alguém precisa fazê-lo -, bato os pés e, enquanto alguns insistem em apontar para os eleitores, eu teimo em erguer o meu dedo indicador na direção do Planalto.

Prefiro acreditar piamente que a população brasileira é vítima; que escolhe errado, porque nunca a ensinaram a escolher corretamente, que se engana, porque nunca acertou, que se omite, porque nunca realmente participou. Prefiro acreditar que o povo brasileiro não se porta como se espera, porque não sabe o que se é esperado - é preciso lembrar que a história brasileira é marcada pela total ausência de participação popular política?

Por outro lado, acredito que tudo isso pode ser modificado; basta olhar para trás - e nem tanto assim -, lembrar do Diretas Já!, onde as eleições diretas para presidente eram reivindicadas, e dos movimentos estudantis que impulsionaram o impeachment do Collor. A educação e a conscientização guiaram os jovens brasileiros a pressionar os governos vigentes, requerendo que as suas exigências fossem ouvidas e acatadas e, surpreendentemente, conseguiram.

Tais acontecimentos apenas provam que os brasileiros são vítimas e não causadores do caos no qual se encontram mergulhados - sim, elegem mal, mas como podemos culpar eleitores das classes C e D de votarem no Lula, quando ele lhes fornece comida? -, a informação e formação política são duas perigosas armas que, inevitavelmente, voltam-se contra a população que não as contêm, prendendo-a num laço de ignorância e resignação social.

Então, reformulo a frase do autor desconhecido: "O problema do Brasil não são os brasileiros; são os políticos! Os brasileiros não pediram para não ter consciência política, foram os políticos que a tiraram deles".

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Quem é a colunista: Gisele Zwicker. Para ela, um fim de semana perfeito envolve um bom livro, um bom filme e uma ida ao teatro.

O que faz: Preparando-se para prestar o vestibular.

Pecado gastronômico: Filé de frango com arroz.

Melhor lugar do Brasil: São Paulo, Capital. Não há lugar melhor que o lar.

Fale com ela: [email protected]

Atualizado em 6 Set 2011.