A espera foi longa. Desde o anuncio de Guilty Gear -Strive- na EVO 2019, o maior evento de jogos de luta do mundo, fãs estão antecipando o lançamento da nova edição da franquia, que é celebrada desde os dias do PlayStation 1 como um game bonito, com designs criativos para seus personagens, músicas incríveis e história complexa, além de gameplay veloz e satisfatório.
O título, desenvolvido pela Arc System Works, chega para PlayStation 4, PlayStation 5 e PC, via Steam. Enquanto muito da essência se mantem de títulos anteriores, mudanças consideráveis na forma de jogar foram feitas, o que sempre significa um risco de desagradar entusiastas mais tradicionais em prol de inovação. Descubra se Guilty Gear -Strive- faz jus a seus predecessores aqui, em mais uma resenha antecipada do Pizza Fria!
Let’s Rock! (de um jeito diferente)
Durante os testes beta abertos de Guilty Gear -Strive-, já pudemos constatar que grande parte do que identifica Guilty Gear na mente dos muitos entusiastas da franquia está melhor do que nunca. Os visuais estão deslumbrantes, com a Arc System Works despertando admiração por seus gráficos complexos que simulam animação desenhada, já presentes em games anteriores da desenvolvedora.
Dessa vez houve investimento em trilha sonora com vocais que encaixam perfeitamente no clima do jogo. Desde antes do lançamento as músicas já eram tocadas em loop por este que vos escreve. A criatividade continua impressionando, com os designs dos personagens novatos, bem como certas mudanças na aparência de velhos conhecidos esbanjando detalhamento e capricho. O principal ponto de mudança foi exatamente o gameplay, que traz mudanças significativas se comparado a edições anteriores.
Conhecido por sua complexidade, o sistema de lutas em Guilty Gear -Strive- passou por reformulações que o deixaram mais acessível a novos jogadores. Mas não se desespere, jogador veterano, pois ainda há muitos recursos a usar.
Iniciaremos com o que ficou de fora, começando pelos icônicos “Instant Kills”, técnicas que sacrificavam toda a barra de especial e eram difíceis de serem conectadas, mas arrancavam toda a vida do inimigo em apenas um movimento. Embora não fossem muito usadas pela falta de praticidade, elas eram adoradas pelo elemento cinematográfico que traziam. Não entrarei em detalhes sobre o as demais mecânicas, que requerem uma explicação mais técnica, já que não estão em Guilty Gear -Strive-. Ficam aqui listadas para fãs antigos da série, para que estejam cientes com o que deixa de existir: “Blitz Shield/Attack”, “Danger Time”, “Dead Angle Attack”, além do efeito de “Stagger”
O esquema de botão em Guilty Gear -Strive- é idêntico, com botões para golpes fracos (P), médios (S), fortes (HS), chutes (K) e Dust (D) – que funciona como um ataque que lança inimigos ao ar. Os últimos jogos permitiam lançar o oponente ao canto da tela com o Dust. Em -Strive-, porém, somente podemos lançar os adversários para cima, combos mais limitados e a necessidade de se carregar o movimento por algum tempo. O controle só foi testado por mim através do Dualshock de PS4. No caso, é bem responsivo, sem nenhum problema de reconhecimento de inputs.
Retornam também algumas opções defensivas tradicionais: ~instant block~ “fautless defense” e “psych burst”. A primeira refere-se a bloquear um ataque adversário logo antes do mesmo conectar, que beneficia o defensor com mais tempo para contra-atacar do que o normal. A segunda trata de um escudo que pode ser gerado em troca da barra de especiais (tension gauge), neutralizando o dano já reduzido pela defesa comum e afastando o atacante. A terceira, por sua vez, dispõe de um movimento que gasta uma barra própria e interrompe um movimento ofensivo do oponente lançando-o para longe.
As penalidades por ficar excessivamente na defensiva também estão presentes. Se um jogador ficar fugindo sem tentar causar dano ao oponente, o jogo irá drenar toda a sua barra de especial e limitar o ganho da mesma por algum tempo.
No lado ofensivo das coisas, os agarrões agora tem animações ao não conectarem e um comando específico para serem executados. Não é mais possível encaixar um golpe forte após um fraco o que limita certas rotas de combos e simplifica os mesmos. O dano das combinações foi aumentado, em compensação, resultando em poucos acertos e grande estrago.
Jogadores antigos podem se sentir limitados com as opções menos numerosas e complexas no que diz respeito a destruir seu oponente. Isso não quer dizer que não haja espaço para estilo, -Strive- certamente tem sua cota de combinações e estratégias empolgantes. Ainda que seja mais difícil ver combos gigantescos nessa edição, eu nunca subestimo o que jogadores criativos podem fazer com um jogo após passarem algum tempo com ele.
Em conformidade com a maior acessibilidade do gameplay, o “Roman Cancel” – técnica que permite cancelar a animação de algum movimento por metade da barra – já simplificado no último título da série, agora desacelera o oponente com sua ativação, dando mais oportunidades para o jogador continuar um combo ou fugir de contra-ataques.
Os movimentos especiais da franquia, chamados de Overdrive, estão intactos. Custam 50% da barra e causam danos elevados aos oponentes quando não executados em meio a um combo. Alguns são acompanhados de movimentos de câmera e animações mais detalhadas. Outra marca da série.
Uma nova mecânica é introduzida com o “Wall Break”. Após um determinado número de acertos em um combo que está sendo efetuado no canto da tela, o personagem que está sendo atacado gruda na parede. Nesse ponto, se o jogador atacante não parar a sequência, a parede quebra e lança a vítima em um outro cenário. A animação da transição é bonita e confere bônus ao autor do combo.
O “Wall Break” é interessante, do ponto de vista em que retira um dos maiores estresses envolvidos com um jogo de luta, o popular “prender no canto”, que aterroriza entusiastas do gênero desde a época dos fliperamas. A “tática” em que envolve limitar o espaço de fuga de um oponente pressionado ao focar sua estratégia em impedir que ele escape do limite da tela.
Por outro lado, a nova mecânica acaba por limitar mais ainda os combos complexos de Guilty Gear, que eram ainda mais extensos no canto.
De maneira geral, é claro o esforço por parte da Arc Works em tentar tornar o sistema mais acessível a novos jogadores, mas a essência do gameplay veloz, das combinações criativas com o Roman Cancel, movimentos cinemáticos bonitos e grande quantidade de recursos ofensivos e defensivos ainda permanece intacto, deixando a jogabilidade de Strive ainda com um caráter complexo de se dominar, ainda que seja mais fácil de aprender.
Certa quantidade, muita qualidade
Guilty Gear sempre se orgulhou de ter personagens com estilos de luta criativos e únicos. Isso, para grande alegria dos fãs, se mantem em -Strive-. Quinze personagens estão disponíveis no lançamento inicial. Um número até baixo, mas isso é compensado na experiência única que cada um traz ao jogador.
Personagens populares, que estiveram em todos jogos antigos, como os titulares rivais Sol e Ky retornam, assim como lutadores que conquistaram os fãs em títulos mais recentes, como Leo e Ramlethal. Dois novatos também chegam às batalhas, com estilos de jogo bem distintos: Nagoriyuki, um samurai vampiro que executa ataques de dano enorme às custas da própria barra de vida, em um estilo de alto risco/anta recompensa e Giovanna, uma agente secreta misteriosa, que luta em sincronia com um espirito de lobo.
A variedade de designs reflete no gameplay, com personagens privilegiando estratégias específicas em seus estilos de luta. Chipp é um ninja que se especializa em combos extensos e grande velocidade, estando um pouco aquém do dano dos outros combatentes. Potemkin, por outro lado, possui opções de movimento limitadas e muito dano em golpes individuais.
A complexidade também varia bastante. Guilty Gear -Strive- inclusive detalha quais personagens são mais indicados para novatos em uma escala que varia de 1 (complicado) – caso de Zato, que tem que coordenar os seus ataques com uma criatura sombria controlada separadamente, até 5 (fácil) – Ky, que possui combos simples, um antiaéreo potente e ótimos projeteis, o arquétipo de “Ryu”, sempre indicado a iniciantes nos jogos de luta.
As listas de comandos de cada personagem contém descrições e dicas detalhadas de como utilizar cada movimento. O jogo também possui um tutorial extenso e missões de ensino que abordam profundamente cada mecânica e aspecto do gameplay, facilitando o aprendizado de iniciantes e a rememoração dos veteranos.
Um novo sistema bem interessante é o do “combo recipe”, que permite a jogadores gravar seus combos e propor que eles sejam aprendidos ou executados por outros jogadores (ou a si mesmo, como treinamento). O que estimula a união da comunidade e facilita, mais uma vez, o aprendizado.
Uma marca de originalidade em todos os lugares
Outra característica clássica de Guilty Gear é a de trazer ideias criativas também para o que não envolve diretamente o gameplay. -Strive- continua essa tendência. O modo online envolve criar um avatar em pixel art do jogador, que percorre cenários atrás de outros avatares para enfrentar.
Seja explorando um parque, que serve para partidas não-ranqueadas ou subindo andares de torres após conquistar os adversários de certa habilidade. O personagem criado pode correr, escorregar e pular, como se estivesse em um jogo de plataforma. Partes do ambiente possuem NPCs que tiram dúvidas, permitem customizar novamente o avatar com acessórios e até pescar conteúdo adicional de Guilty Gear -Strive- em troca de dinheiro virtual.
A ideia ganha pontos pela criatividade, mas pode ser confuso e exaustivo percorrer os cenários até encontrar alguém que você queira enfrentar. Para suavizar a questão, podemos “seguir” jogadores que encontramos, podendo saber exatamente sua localidade, quando estiverem conectados. No fim das contas, não é nada muito sofrível, mas apesar da criatividade, fica o questionamento da necessidade de um sistema assim.
O modo história de segue o mesmo modelo do jogo anterior. No sentido que ele não é jogável. Os eventos de enredo de Guilty Gear -Strive- são mostrados como um filme. Os personagens não podem sofrer nenhum tipo de intervenção do jogador, que assume uma postura passiva de testemunha da ação. Sendo a interação contra a CPU, com pitadas de história sendo reservada ao modo Arcade clássico, com uma sequência de adversários controlados pela AI e um chefe final.
Novamente, há de se notar o caráter único da iniciativa, que até faz sentido pensando em um ponto de vista de evitar momentos forçados, que vemos em modos histórias mais interativos de outras franquias de luta. Personagens inventam motivos estranhos para lutar, para que o jogador possa ter momentos de controle durante a narrativa.
Buracos na trama também são comuns, com personagens derrotando vários personagens em sequência para servir de saco de pancada depois que seu capítulo acaba e o jogador não o controla mais.
Ainda assim, é bastante brusco que se retire totalmente a interação do jogador da história em um jogo de videogame, meio marcado pela interação. É o mesmo que procurar as cenas de um game no Youtube, para saber a história sem precisar jogar, o que, realmente, é uma prática popular hoje em dia.
Guilty Gear -Strive- também oferece uma quantidade enorme de textos e guias ilustrados demonstrando eventos dos jogos passados em linhas do tempo e relações entre personagens. Quem tem interesse de se inteirar da história da franquia (que não é pequena, nem simples) poderá encontrar tudo aqui, com uma organização impressionante.
Vale a pena comprar Guilty Gear -Strive-?
Se você gosta de jogos de luta e quer conhecer uma franquia maravilhosa, absolutamente sim. Guilty Gear -Strive- não deve em qualidade para seus antecessores, que já tinham fixado um referencial altíssimo de excelência.
Porém, se você é um fã que jogou os títulos anteriores e tem resistência a mudanças, recomendo um teste antes. Mas eu creio que a tendência é que a essência de Guilty Gear ainda possa ser encontrada por praticamente todo mundo que tiver o privilégio de jogar Strive. É garantia de incontáveis horas aprendendo personagens e desafiando oponentes na internet ou no sofá.
*Review elaborada no PlayStation 4 padrão, com código fornecido pela Arc System Works.
Pizza Fria
Reviews, notícias e tudo sobre o mundo dos gamesPor João Gabriel Marques, Pizza Fria
Atualizado em 7 Jun 2021.