Little Nightmares II é a aguardada continuação do aclamado e intrigante Little Nightmares. Desenvolvido por Tasier Studios usando Unreal Engine 4 e publicado por Bandai Namco, o sombrio título de plataforma e puzzle acaba de chegar para PC (via Steam e Bandai Namco Store, Nintendo Switch, PlayStation 4, Playstation 5, Xbox One e Xbox Series X|S, além de Google Stadia. Descubra com esta análise para o Pizza Fria se vale a pena uma segunda aventura pelos pequenos pesadelos.
Apresentando Little Nightmares II
O que é Little Nightmares II? Trata-se de um jogo de plataforma e puzzles com aspecto sombrio e temática de horror. O título é continuação do aclamado Little Nightmares (2017), contando com visuais cinematográficos e muitas camadas de subtexto e de interpretação. Logo de cara percebe-se que Limbo (2010) e Inside (2016), ambos da Playdead, foram inspirações para os desenvolvedores e artistas, assim como Unravel (2016). Há também ares do genial The Cave (2013).
Não se deixe levar pelos dois personagens no trailer de Little Nightmares II: não há modo cooperativo já que o jogo é para apenas um jogador e seu companheiro é controlado pela máquina. O jogo está traduzido ao português do Brasil, mas… Não conta com falas ou textos, salvo as breves e raras instruções dos comandos – a história é contada pela encenação dos personagens com o ambiente.
Além da edição padrão (lançada tanto em formato físico quanto digital), vale ressaltar que PlayStation 4 e PC contam com a edição Little Nightmares II: Deluxe Edition, que inclui o DLC Nome’s Attic, livro e trilha sonora digitais, mais um tema e dois avatares. As atualizações com aprimoramentos para PlayStation 5 e Xbox Series X|S ainda virão, mas os consoles rodam as versões digitais de seus antecessores. Jogadores de PC podem adquiri-lo via Steam ou Bandai Namco Store.
No Brasil, Little Nightmares II recebeu classificação etária de 14 anos devido a sua violência gráfica. Esta análise foi elaborada jogando a versão para Nintendo Switch.
História e narrativa
No primeiro Little Nightmares, o jogador controla Six, uma garota entre 8 e 10 anos que veste uma capa de chuva amarela e tenta sobreviver em uma embarcação cheia de monstros conhecida como The Maw. A própria Bandai Namco disse que o princípio condutor por trás de toda a aventura de horror era a fome – não apenas a sensação física, mas outros conceitos relacionados a ela, como ganância e consumo exacerbado.
Por outro lado, Little Nightmares II tem como protagonista o menino Mono, um menino magrelo, mais ou menos da mesma idade de Six. Segundo os desenvolvedores, desta vez a fome é secundária e a externalização de medos é retratada pelo escapismo das crianças que estão em rota para Cidade Pálida (Pale City).
Ao começar Little Nightmares II, Mono está sonhando com um corredor que leva a um olho – ao aproximar-se, o garoto acorda no meio de uma floresta escura e com um aparelho de TV perto. Não vou dar spoilers sobre o desenvolvimento geral do jogo, mas durante a primeira fase encontraremos Six, bem assustada, em uma cabana – ela foge e não aceita qualquer ajuda, deixando Mono com a mão estendida.
Eventualmente, Six e Mono precisarão se ajudar em vários momentos – a máquina controla a menina sempre que necessário – o primeiro deles para fugir da cabana de um caçador e da floresta. Com um pouco de desconfiança, a aventura grotesca avança, com uma narrativa cinematográfica e assombrosa responsável por retratar os medos do mundo vistos por duas crianças.
Antes de avançar para falar dos gráficos (que contam boa parte da história ao mesmo tempo que a compõem), ao longo da jornada, o jogador encontrará crianças paradas nos cenários e sofrendo de uma espécie de “convulsão estática”, daquelas tevês de tubo, e terá que “resgatar” 18 delas (é só encostar para absorvê-las). Elas são conhecidas como restos mortais defeituoso.
Six parece ser uma dessas crianças e parece estar desaparecendo aos poucos, por isso, em companhia de Six, vocês devem avançar até chegarem à Torre do Sinal. Ao fechar Little Nightmares II encontrando todos os restos mortais defeituosos, um final secreto se revela, situando o jogo na linha do tempo em relação à aventura do primeiro título.
Narrativa visual cria escapismo surrealista de crianças
Os adultos (e inimigos) em Little Nightmares II parecem ter saído das pinturas de um mestre surrealista, como do pintor Salvador Dalí. Suas formas são retratadas de maneira incompleta, muitas vezes com uso de próteses (inclusive em todos os membros e corpo), e muitas de suas faces são placas plásticas ou de cera, como uma máscara.
Esses inimigos não estão sempre presentes e talvez por isso exista tanta tensão entre salas. Contudo, quando aparecem, suas figuras surreais são catalisadoras de monstruosidades de tudo aquilo que não entendemos nos adultos quando somos crianças.
O caçador é um incansável perseguidor, a professora sempre observante pode alongar seu pescoço e encontrar Mono em qualquer lugar, ainda que esteja escondido… O mesmo para todos os demais grandes inimigos. Eles não piscam, não dialogam e estão lá para projetarem aflição, ansiedade e terror no jogador. Há ainda outras crianças, chamadas bullies, retratadas como bonecos de porcelana.
Todos eles fazem parte de um pano de fundo gigantesco, ou seja, a jornada até a Cidade Pálida, com cenários distorcidos dignos de um filme do expressionismo alemão. A maior semelhança talvez seja o jogo de contrastes entre luz e sombras, causando aberrações geométricas desproporcionadas, muitas vezes pouco naturais e angustiantes.
Entretanto, diferentemente da escola artística, a câmera se move graciosamente a cada cena deste suposto pesadelo de Mono dentro e através de antigos aparelhos de tevês. Aliás, os televisores foram considerados por muitos os representantes do escapismo da vida rotineira moderna, projetando mundos fictícios e desconectando os expectadores da realidade.
E foi essa leitura que Little Nightmares II me passou muitas vezes e que, ao jogá-lo, se traduz nas seguintes perguntas para outros jogadores adultos: Do quê você acha que estas crianças estão fugindo? De que tipo de trauma? Ou será que todos víamos um mundo mais hostil quando pequenos (o qual falhávamos em entendê-lo e assim os artistas de Little Nightmares II resolveram retratá-lo)?
Existe uma beleza mais além da câmera de Little Nightmares II e de toda a imaginação deixada para os jogadores: a composição sombria, tenebrosa descobre harmonia e consistência do início ao fim da aventura. Os corpos disformes e as aberrações pertencem a cada localidade (como o ser gordo, conhecido como “O Doutor”, que anda pelo teto das salas do hospital).
A arte é enfadonha, coloca uma camada de algo errado e sinistro acontecendo (e nos damos conta disso), contudo, insere o jogador dentro deste mundo torpe com tamanha aclimatação, que é impossível não se deixar envolver com a história graças, em boa parte, aos visuais.
Para não dizer que tudo são flores, não chega a ser raro ver animações estranhas dos protagonistas, como um colidindo com o outro ou tremendo estranhamente. Nem por isso essas ocasiões são comuns e tampouco comprometem a beleza pouco convencional de Little Nightmares II.
Som[brio]
Uma parte obrigatória em qualquer análise de jogos é falar sobre o som, claro. E é curioso como jogos e filmes de suspense e de terror precisam ter um tratamento especial neste departamento. Little Nightmares II soa como um pesadelo, no melhor dos sentidos!
Existe uma ventania constante em Little Nightmares II, até mesmo durante a pausa, não deixando você se desconectar daquela ambientação. A produção sonora está embebedada pelo ruído da estática, das rodas enferrujadas rangendo agudamente pelo piso de um hospital, o clique seco das próteses, tudo isso em conjunto com a música distante de fundo (quando toca, obviamente) que parece vir de uma incansável caixinha de música, como se lhe fora dada corda para toda a vida.
Tenho quase certeza que a trilha de Little Nightmares II não é do tipo que alguém pare para ouvir. Só que ela executa magnificamente bem aquilo ao que se propõe e não sei se a minha recomendação é jogar Little Nightmares II com excelentes fones de ouvido ou de madrugada com a televisão em um volume relativamente alto.
Jogabilidade
Little Nightmares II é realmente, na maior parte, sobre evitar os perigos do ambiente enquanto deciframos como seguir adiante. Para isso, Mono pode agachar-se ou, caso esteja correndo, escorregar; agarrar todo tipo de objeto – como arrastar caixas, pegar marretas para atacar ou segurar-se em parapeitos, ou ainda andar de mãos dadas.
A maioria das vezes você precisará correr ao toque de um botão; chamar por Six – muitas vezes apenas com um pst; ligar e desligar a lanterna; e, claro, com o toque no botão de ação, atacar, saltar e arremessar objetos.
O cardápio acima contém todos os comandos para solucionar os enigmas das salas e construções e poder afastar inimigos em Little Nightmares II – alguns, por exemplo, se movem para te atacar quando não há nenhuma luz no cenário e você precisa direcionar a lanterna para deixá-los paralisados. O problema é que, às vezes, você precisa que eles saiam da cadeira de rodas que você quer mover, por exemplo, e precisa deixar a sala escura.
Em muitos momentos a jogabilidade de Little Nightmares II me lembrou Prince of Persia, além das inspirações similares e mais modernas dos já citados Limbo e Inside. Qualquer erro ou toque custa caro e devolve Mono ao checkpoint anterior. Não se preocupe, pois estes são frequentes e o jogo volta imediatamente, se, carregar tudo outra vez.
Durante a maior parte do tempo, você quer mesmo passar desapercebido pelos inimigos, como em um jogo de espionagem, e a melhor maneira de fazê-lo é agachar-se para fazer menos ruído enquanto estuda a movimentação de qualquer ameaça próxima.
O objetivo quase sempre é navegar por essas salas maldosas, escondendo-se e decifrando-as, para chegarmos em outras salas que guardam chaves ou fusíveis. Estes itens, por sua vez, servirão para abrir as portas que carregam o enredo de Little Nightmares II. Os controles simples e responsivos ajudarão na tarefa. Caso você se sinta perdido e sem saber por onde seguir, repare sempre em Six e procure na direção que ela olha ou nas ações que ela ensaia fazer.
Little Nightmares II inclui algumas seções de combate e, como crianças, os canos ou marretas são demasiadamente pesados, por isso é importante antever o ataque e contar com os segundos de atraso para que Mono reúna forças – não se preocupe, já que a pose dos bullies ou das mãozinhas do mal e outros vilões entregam o momento ideal de pressionar o botão.
A mecânica de apontar e acender a lanterna é introduzida lá pela metade do jogo e funciona bem na maior parte do tempo. Os pacientes (os inimigos prostéticos no hospital) se movimentam no escuro e você deve iluminá-los diretamente com o feixe da sua lanterna para imobilizá-los. Esta é certamente a mecânica mais complicada e frustrante em Little Nightmares II, já que controlamos o personagem com um analógico e a lanterna com o segundo em um ambiente tridimensional visto e controlado em um plano de plataforma.
Cada ambiente de Little Nightmares II é labiríntico na medida certa e nada é enigmático ao ponto de se transformar inacessível. Certamente Mono será obrigado a repetir algumas partes, isso será inevitável, mas a dificuldade não é nunca desproporcional àquilo que o jogo se propõe: causar tensão permitindo ao jogador mergulhar no desenlace do bizarro pesadelo.
Vale a pena jogar Little Nightmares II?
Little Nightmares II realmente foi um jogo que me surpreendeu. Depois de ter jogado o primeiro apressadamente no Xbox, não sei por que a continuação me prendeu mais. A narrativa é incrível e Little Nightmares II é ideal para ser apreciado sozinho ou em uma madrugada com parceiros ou amigos e em turnos, afinal, é um jogo divertido de se mostrar e de falhar e tentar resolver em companhia. (Também de se assustar em companhia).
Os visuais são fantásticos, com efeitos de luz e sombra e com conceito de personagens incríveis, tão incríveis quanto a trilha sonora e o movimento de câmera. Para um jogo independente, o conjunto da obra de Little Nightmares II é um feito enorme. O final secreto é especialmente recompensador e, caso você tenha mergulhado na história de Six e de Mono, será tópico de muitas discussões e pesquisas online.
Por falar em colecionáveis, Little Nightmares II também tem chapéus escondidos pelos seus cinco mundos e… Talvez pelo fato de ter apenas cinco mundos, toda a aventura dura entre 4 e 6 horas, não muito mais que isso. Uma vez que o jogo não é barato, a posição de recomendar gastar aproximadamente R$ 30 por hora de experiência é complicada.
Assim, existe fator replay se você realmente gostar de Little Nightmares ou de Little Nightmares II e quer saber mais sobre o destino (ou trata-se de uma prequela?) dos personagens. Caso ainda não tenha experimentado, sempre deixo o conselho de baixar a demonstração na sua plataforma de preferência – provavelmente a escolha sensata.
Em resumo, Little Nightmares II é uma belíssima e intrigante experiência, fora do comum e fantástica, porém infelizmente muito curta.
Mais sobre Little Nightmares II
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Pizza FriaReviews, notícias e tudo sobre o mundo dos gamesPor Carlos Maestre, Pizza Fria Atualizado em 17 Fev 2021. |