Guia da Semana

Jogadores devem cuidar da fazenda, dos relacionamentos na cidadezinha e cultivar monstrinhos em Monster Harvest, desenvolvido por Maple Powered Games e publicado por Merge Games para PC, via Steam, e para Nintendo Switch, PlayStation 4 e Xbox One. Os sucessores PlayStation 5 e Xbox Series X|S rodam o jogo por meio da retrocompatibilidade.

Semeando campos conhecidos

Para sermos extremamente honestos – entre redator e leitor –, vamos fazer algo diferente: leia a o quadradinho com a autobiografia no rodapé da página antes de continuar. Voltou? Então tá: eu sou fã de Stardew Valley, feito por um cara só que não só programou e desenhou todo o jogo, mas compôs a trilha.

Eric Barone (ou, como você pode conhecê-lo, ConcernedApe) sentia que os jogos Harvest Moon estavam esquecidos e não alcançavam todo o potencial.

Assim, resolveu criar o bucólico Stardew Valley com pixel art maravilhosa, belas composições e, consequentemente, superou todo o material que serviu de inspiração.

Stardew Valley recebeu frequentes atualizações, como uma ilha enorme e modo multijogador, e tudo gratuitamente! Recentemente, Barone anunciou até a Copa Stardew Valley!

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Muito além de ressuscitar esse gênero de simulação agrária e gerenciador de relacionamentos, Stardew Valley virou inspiração para uma nova safra (perdão) de jogos independentes – alguns misturando propostas originais, outros embarcando no sucesso e tentando tirar proveito.

É justamente aí que voltamos para Monster Harvest, um jogo cuja inspiração principal veio da criação de Barone. Aliás, foi nessa premissa que, ao ver o trailer de Monster Harvest, me interessei: pixel art cativante e gerenciamento de recursos somados a uma reviravolta “pokémonesca”, as criaturinhas colecionáveis e plantáveis.

A partir de então, por ver o trailer, eu precisava saber como este jogo seria. Me frustra um pouco esta modernidade de mídias digitais não permitir o aluguel de jogos ou a troca de cartuchos e discos com amigos, algo que nos priva de descobrirmos jogos inéditos. Infelizmente, os consoles não receberam, mas uma versão de demonstração está disponível na Steam.

Monster Harvest oferece poucas opções de personalização. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Monster Harvest oferece poucas opções de personalização. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Bem, após sucessivos adiamentos visando qualidade e conclusão do jogo, justificados para se evitar crunching*, Monster Harvest chega hoje com uma jornada para um único jogador. Não sei quantas pessoas estavam envolvidas no total, mas a Maple Powered Games é, a princípio, um pequeno estúdio canadense dirigido por marido e mulher.

  • *Crunching é um termo em inglês que, no contexto da indústria de games, compreende a ideia de fazer horas extras quase por obrigação, podendo chegar a 80 horas semanais e frequentemente sem remuneração.

Ah, joguei quase 30 horas no Nintendo Switch antes do lançamento. Nesse período, experimentei alguns bugs sérios e estranhos, a maioria relacionada com a interface de usuário, algo que os desenvolvedores prometeram resolver até a estreia oficial.

Efeitos de iluminação destoam da bonita direção de arte pixelada. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Efeitos de iluminação destoam da bonita direção de arte pixelada. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Plantar legumes pra colher monstros

Já falei sobre Monster Harvest bebe na fonte de Stardew Valley? Sim, mas nem tanto!

Uma coisa é querer um jogo, outra é ligar esse jogo e ter sentimento ambíguos ao ver que o produto se parece mais a uma cópia descarada, um plágio – ou, como dizemos nos games, um rip-off.

Essa foi a impressão persistente durante as primeiras horas de jogatina. Para piorar, ainda no comecinho, ao apertar o botão voltar no teclado virtual para corrigir o nome do personagem, o teclado todo desapareceu e deixou a navegação às cegas. Para voltar, só fechando o jogo ou forçando uma mudança de idioma para recarregar o menu.

Longe de começar bem, né?

Pixel art com perspectiva em três dimensões? Achei que ficou legal, e você? (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Pixel art com perspectiva em três dimensões? Achei que ficou legal, e você? (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Foco! Com o teclado recarregado e muito cuidado para não errar, começa a aventura agrária. Depois de nomear personagem e fazenda, você escolhe um de quatro personagens: a personalização é praticamente inexistente.

Como efeito de comparação, em Stardew Valley você escolhe entre 24 tons de pele, 73 penteados, 112 camisas, 4 calças e 20 acessórios. Fora a possibilidade de rabiscar as próprias peças depois. Escolha o sexo e os pronomes mudam de acordo, sendo que você pode alterar qualquer propriedade a qualquer momento.

Falo disso por que a tradução para português do Brasil está lá e é suficientemente competente. Mas parece que desenvolvedores se esqueceram de colocar opções para diferentes pronomes, o que resulta em vícios de linguagem pasteurizados como, por exemplo, o generiquíssimo “Boas-vindas!” de todos os personagens.

Estou passando a carroça na frente dos bo… dos monstros!

Alguns retratos combinam mais que outros, mas o diálogo carece de vida. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Alguns retratos combinam mais que outros, mas o diálogo carece de vida. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

A aventura começa quando você, um morador da cidade, recebe uma carta de seu tio, o professor Spark, um cientista maluco que descobriu uma substância melequenta capaz de transformar plantas em animais. Neste caso, planimais.

Ao redor de sua invenção, uma pequena vila se formou ao redor do laboratório dele. Como seu tio anda ocupado com as pesquisas, não tem tempo para cuidar da fazenda e te convoca para ser o caseiro para deixar o lugar como novo.

A cada dia, regar, plantar e colher. Desta vez, colher planimais! (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
A cada dia, regar, plantar e colher. Desta vez, colher planimais! (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

No papel de fazendeiro, você planta as sementes de acordo com a estação do ano, constrói celeiros e irrigação, e por aí vai.

Nessa vila que se chama Planimália (não, não é Vila Pelicano), você conhecerá os residentes e desenvolverá laços de amizade mais fortes, dando presentes (cada um com direito a gosto e desgosto próprios), conversando e participando dos eventos. Tem até uma “grande empresa” antagonista, a SlimeCo.

Soa familiar? Algo parecido com um certo jogo cuja história começa com deixar a cidade para viver na fazenda do seu avô?

Monster Harvest está completamente traduzido ao português do Brasil. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Monster Harvest está completamente traduzido ao português do Brasil. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Bela arte inconsistente

Os visuais em pixel art saltam aos olhos: a direção de arte é bonita, tudo parece estar animado – até as dispensáveis engrenagens e o falso relógio ao redor do inventário. O trunfo é ter esse aspecto chapado e pixelizado elaborado em três dimensões, oferecendo profundidade ao cenário.

Além dessa terceira dimensão, eu diria que Monster Harvest se aproveita do motor gráfico para gerar alguns filtros ou efeitos de luzes, pois tudo que você precisa fazer é olhar com atenção uma lâmpada ou ponto luminoso pra perceber que não existe o quadriculado de pixels.

Tô sendo cricri demais? Não sei, mas me incomoda(va). Parecia um Octopath Traveler de baixo orçamento e sem muito critério artístico. Outro contraste bizarro são os retratos durante as conversas, que mais parecem vir de um mod feito por um fã: o rosto no retângulo de diálogo simplesmente não pertence ao mesmo universo do mundo de Planimália.

Nas masmorras aleatoriamente geradas, você também minera além de enfrentar inimigos. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Nas masmorras aleatoriamente geradas, você também minera além de enfrentar inimigos. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Voltando à animação, tudo se move e há uma beleza pairando na combinação de tantas cores vivas. Porém temos demasiada informação visual e a animação é um tanto quanto inconsistente, já que alguns elementos são animados com 60 quadros por segundo (como a chuva) e outros abaixo dos 12 qps, como o ciclo de caminhada para TODOS os bonecos, que mais parecem deslizar por aí.

Até que todas essas características em comum com um jogo que gosto muito e não pretendo nomear mais são perdoáveis, afinal, se inspira nele, certo? O problema é quando essa apropriação é feita sem critério e afeta a percepção do jogador.

Navegar pelos menus é complicado, estranho, quase impossível de ver com clareza a marcação ao redor de um quadrado.

São três estações e mais de 70 criaturinhas diferentes com diversos papeis. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
São três estações e mais de 70 criaturinhas diferentes com diversos papeis. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Mover itens entre a mochila e a barra, no Nintendo Switch, é um processo truculento e demonstra que o jogo talvez esteja pensado com mais carinho para ser controlado com um teclado e um mouse. O mesmo se aplica para deixar hortaliças na caixa de venda… É tanto botão pra apertar que chega a ser cansativo e dá vontade de terminar a sessão de jogo logo.

Uma coisa que gostei bastante foi, no meio dessa salada gráfica, a esquiva do fazendeiro. A movimentação é rápida e a esquiva é funcional. Contraria- e deliberadamente, o propósito de Stardew Valley é ser lento para que o jogador possa curtir a passagem do tempo e os temas do campo.

Alguns planimais são meio... err... bizarros. Em todo caso, melhorá-los exige combates sucessivos. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Alguns planimais são meio… err… bizarros. Em todo caso, melhorá-los exige combates sucessivos. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Monster Harvest nem sempre quer ser Stardew Valley

Percebi no passar de algumas horas que, talvez, os criadores da Maple Powered Games quisessem se diferenciar: Monster Harvest aparenta, mas não tem a pretensão de ser Stardew Valley.

A ideia de ter monstrinhos é divertida e pode ser mais no futuro.

Assim como em outros “simuladores agrários”, você deve plantar de acordo com as estações do ano. Em Planimália temos três: seca, úmida e escura.

Basicamente, funciona assim: sementes são características de certas estações e, para gerar monstrinhos, tudo que você precisa fazer é aplicar a plantação para colher um planimal.

Esse planimal varia de acordo com a hortaliça e com a cor da gosma. Dependendo da combinação, por exemplo, do rabanete com a gosma, você terá um monstrinho rabanete (Cruzbanete), uma forma evoluída dele ou uma forma de monstrinho rabanete que serve como montaria.

Aplique gosmas de cores diferentes e veja uma mesma hortaliça se transformar em variantes de planimais, como as montarias. (Imagem: Divulgação)
Aplique gosmas de cores diferentes e veja uma mesma hortaliça se transformar em variantes de planimais, como as montarias. (Imagem: Divulgação)

O jogo não é muito claro nos próximos objetivos, assim, passei a maior parte do ciclo de jogo indo e voltando para a masmorra atrás da vila. Todos os dias ela é gerada diferente- e aleatoriamente pela máquina, com monstros e outros planimais.

Como treinador de planimais, você tem o direito de transportar um de cada espécie, guardando qualquer criatura repetida no estábulo. Uma vez na masmorra, a batalha contra inimigos selvagens começa, no estilo de um RPG por turnos.

Infelizmente é aqui que o potencial do jogo é deixado de lado em detrimento de uma escolha tosca.

O jogo se transforma em outro quando o assunto é fortalecer os planimais: as batalhas por turnos são uma quebra de ritmo das tarefas cotidianas. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
O jogo se transforma em outro quando o assunto é fortalecer os planimais: as batalhas por turnos são uma quebra de ritmo das tarefas cotidianas. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

A inspiração óbvia veio de Pokémon. Batalhas por turnos entre criaturas. Os seus híbridos têm pontos de vida, assim como a experiência que lhes permite passar níveis.

Neste ponto, Monster Harvest se engasga muito nas animações (mais uma vez, pelo menos no Switch), sobretudo dos golpes, reforça seus menus truculentos e dificuldade de escolher opções.

A masmorra em si é uma boa ideia, mas o combate ficou estranho, inconveniente, uma quebra que não combina com a proposta. Só que, no final do dia, é esse processo chato e pouco lapidado que faz seguir a vida: seus planimais precisam ficar mais fortes e só encontrei algumas novas sementes graças ao espírito aventureiro.

As cores vibrantes, a bela arte e a temática deixam o desejo de que Monster Harvest tivesse mantido foco em suas ideias originais para triunfar. (Imagem: Divulgação)
As cores vibrantes, a bela arte e a temática deixam o desejo de que Monster Harvest tivesse mantido foco em suas ideias originais para triunfar. (Imagem: Divulgação)

Mais alguns números e detalhes

Para continuar cuidando da fazenda e melhorando-a, plantar e colher hortaliças ou planimais requer esforço físico. Por isso, seu personagem conta com saúde, vigor e pontos de experiência.

Assim como seus planimais, quanto mais o fazendeiro trabalha, mais cresce de níveis, liberando habilidades ou facilitadores. Arar o campo, regar e outras atividades consumirão vigor, o qual recuperamos parte ao dormir pela tarde ou complemente ao dormir pela noite.

As hortaliças e os planimais podem (e devem ser vendidos) para facilitar com os recursos. Caso você não saiba, em um jogo deste estilo, a grande graça é ver a progressiva transformação da sua fazenda e dos arredores. A forma mais fácil de chegar lá é produzindo muito e constantemente para sempre poder adquirir novos aparatos e sementes. Atenção! Treinar animais é cansativo e repetitivo. O processo vale para quem realmente gosta de presenciar esse crescimento.

Ao final das três estações e combinando as muitas gosmas diferentes, encontramos mais de 70 criaturas – algumas servem de montaria, outras são o clérigo do grupo e por aí vai. Perdê-las em combate parece um estorvo até que descobrimos uma propriedade especial: a tal da coragosma, que contém “as memórias e a essência de planimais abatidos” e melhora o solo, cultivando planimais mais fortes.

Um dos contrastes com outros jogos similares: a movimentação é rápida graças à esquiva. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Um dos contrastes com outros jogos similares: a movimentação é rápida graças à esquiva. (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

Vale a pena jogar Monster Harvest?

Meu processo de querer jogar Monster Harvest e jogar de fato Monster Harvest é, por falta de uma associação melhor, como ver o trailer de Esquadrão Suicida e depois ver o filme. O primeiro Esquadrão Suicida. O jogo é melhor que o filme neste caso, mas o abismo entre promessas de trailer e produto finalizado é inquietante.

São ideias legais embaladas por um visual legal que tropeçam na falta de originalidade, de forma e de direção de arte consistente. Os temas musicais repetitivos pouco fazem para ajudar ou atrapalhar.

Minha impressão é que se toda a estrutura inicial não gastasse tantas forças querendo imitar Stardew Valley, Monster Harvest alçaria voos mais altos, próprios, sem sofrer com comparações. O jogo peca por que ficou preso em suas inspirações enquanto eu queria ver mais das ideias originais, apesar de ter chegado nele por suas referências.

Monster Harvest é interessante para quem quer misturar fazenda e gerenciamento com treinamento de monstrinhos. Certamente é uma ótima opção para crianças, pois as conversas não apresentam os temas e o subtexto adultos como em…. bem, você já sabe.

Contudo, se seu foco estiver na administração de uma fazenda, nos relacionamentos elaborados e complexos, com mais acabamento e mais requinte geral, fica difícil competir com Stardew Valley, que oferece muito, mas muito mais conteúdo, mais personalização e um modo multijogador para até quatro pessoas. Tudo por quase um quarto do preço e cheio de charme.

Monster Harvest tem personalidade e conceitos próprios ofuscados, quem sabe, pela insegurança dos desenvolvedores de buscar algo próprio. É um bom jogo, mas, por enquanto, Stardew Valley reina absoluto.

Ficha técnica

Desenvolvido pela Maple Powered Games, uma desenvolvedora canadense fundada por um casal que deixou tudo para criar jogos, Monster Harvest chega para computador, via Steam, e para Nintendo Switch, PlayStation 4 e Xbox One.

PlayStation 5 e Xbox Series X|S rodam o jogo graças ao recurso da retrocompatibilidade.

Feito para um único jogador, o jogo é um simulador de fazenda e de relacionamentos misturado com coleção de monstros e está traduzido ao português.

A classificação etária é livre para todas as idades no Nintendo Switch e na Microsoft Store (Xbox), apesar de estar listado para acima de 10 anos por conter violência animada e linguagem imprópria no Steam.

SteamNintendo SwitchXbox OnePlayStation 4
demonstração,
preço indisponível
R$ 101,95R$ 74,95preço indisponível

Requisitos mínimos para PC

A julgar pelas especificações listadas, o jogo não exige uma supermáquina:

  • Sistema operacional de 64 bits
  • Apenas Windows 7, Windows 8 ou Windows 10
  • processador de 1,2 GHz
  • 128 MB de memória gráfica dedicada
Que tipo de planimal você acha que vai ter na fazenda? (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)
Que tipo de planimal você acha que vai ter na fazenda? (Imagem: Reprodução/Nintendo Switch)

*Review elaborada em Nintendo Switch com código fornecido pela Merge Games.

Pizza Fria

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Por Carlos Maestre, Pizza Fria

Atualizado em 15 Set 2021.