Guia da Semana

Não se iluda com o título acima e vá pensando que vamos falar de outro assunto que não seja gastronomia. Abro aqui um parêntese para explicar que não é só nas grandes epopéias que a tarefa de agradar a gregos e troianos se mostra inglória.

Não foi à toa que os gregos só conseguiram trazer de volta a rainha traidora de Menelau ao usar a inteligência em vez da força bruta. E dar um quadrúpede de madeira de presente aos troianos, convenhamos, foi uma bela e desastrosa surpresa... ao menos para os troianos.

Existem pessoas que nunca estão satisfeitas. Desconfio que Helena era uma delas. À mesa, geralmente, elas mantêm a mesma postura. Há sempre um motivo para reclamar - da demora do garçom ao ponto de cozimento de algum prato. A pasta não esta al dente, o filet passou do ponto, o risotto está salgado e assim por diante.

Obviamente, todos têm o direito de reclamar quando não estão de acordo com alguma coisa. O problema é que tem gente que extrapola. Quando algo não os agrada, é um verdadeiro tormento, fazem escândalo. E ai de quem estiver sentado nas proximidades.

Um bom exemplo são aquelas pessoas zelosas pela saúde. Não sou contra, contanto que a preocupação com a saúde delas não afete a minha. Porém, quando nos deparamos com preocupações exageradas desse tipo, o que poderia ser uma prazerosa refeição pode se transformar em uma tarefa extenuante.

Seja sincero. Não é nada agradável quando você pede um camarão à milanesa e alguém na mesa comenta sobre a quantidade de calorias do referido petisco. Com educação, você sempre pode sugerir uma porção de pepinos em conserva para o reclamante. Uma vez eu me deliciava com uma saborosa mousse de chocolate e minha companheira começou a contabilizar a quantidade de calorias que haveria em cada colherada. De raiva, quase pedi outro pedaço. Com chantilly por cima!


Algumas reclamações, devo admitir, são procedentes. Uma vez pedimos uma pizza, metade alho, metade algum outro sabor que não vem ao caso. Para minha surpresa, a pessoa que estava comigo resolveu que não iria comer a de alho. Como sou um amante do sabor desse tempero sedutor, não me incomodei. O mesmo não posso dizer das pessoas que trabalhavam comigo. No dia seguinte, por boa parte do tempo fiquei exalando um odor que afugentava toda espécie de ser vivo.

Mas há também aqueles amigos de todas as horas, os camaradas que não estão nem aí para nada. E sabe de uma coisa? Eu me divirto demais com eles. São excelentes companhias para todos os momentos.

Alguns amigos tinham o salutar costume de fazer o tradicional happy hour depois do expediente num bar próximo ao trabalho. O tal estabelecimento não era nenhum primor quanto à sua higiene, beleza e conforto. Mas o que interessava era a proximidade. Foi o suficiente para passarem a chamar o bar pelo carinhoso e simpático apelido de Boca de Porco.

Acontece que as mulheres começaram a participar da empreitada. E não parecia nada simpático convidar as moças do trabalho para tomar umas num lugar com esse nome. Como mudar o ponto de encontro era inviável, mudou-se apenas o apelido do estabelecimento, que passou a se chamar Lábios de Suíno. Certo, não amenizou muita coisa, mas o estrago já estava feito.

Viraram habitués do Lábios. Acontece que, fora a cerveja estupidamente gelada, nada mais era atraente no lugar. Conversa vai, conversa vem, descobriu-se que as fatias de queijo provolone, cortadas fininhas, ficavam ótimas quando colocadas naquela chapa que vê limpeza uma vez por ano. Suspeita-se que esse era o motivo do tira-gosto ficar tão saboroso. Parecia uma porção de colesterol concentrado. Só faltava batizar a iguaria.

Como na época o Padre Marcelo estava em evidência, logo o petisco começou a ser chamada de "Hóstia do Padre Marcelo". E não é que fez sucesso? A única dúvida que ficou era se o apelido colou porque aquele provolone derretido parecia uma hóstia gigante, ou porque todos faziam o sinal da cruz antes de comer. Até hoje não sei a resposta. Mas aposto que essa delícia iria agradar a gregos e troianos.



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Quem é o colunista: Marco Esteves, sempre o personagem de alguma crônica gourmet.

O que faz: É jornalista e redator publicitário.

Pecado gastronômico: quem nunca cometeu nenhum, que atire a primeira jaca.

Melhor lugar do Brasil: Depois que visitar todos, eu decido.

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Atualizado em 7 Ago 2012.