Guia da Semana

Foto: Gabriel Oliveira/ Guia da Semana
Assumindo o controle: João Lellis ao lado de um dos herdeiros, Adriano

Foi pela orelha, literalmente, que João Lellis levou o filho Adriano para trabalhar em seu restaurante na rua Bela Cintra, em São Paulo. O rapaz havia conseguido um emprego em uma locadora, o que não agradou em nada o baiano de Macabaubas. Depois de ser obrigado a desistir do novo trabalho, o jovem assumiu o caixa da tradicional cantina aos 16 anos de idade. De lá até hoje, passaram-se quase duas décadas e muitas experiências vivida ao lado do pai.

O começo para o garoto foi complicado. "Chegava aqui às 18h e ficava até às 3h. Pela manhã ia para a escola". Além disso, ainda agüentava uma cobrança maior do que em relação aos demais funcionários. "Comigo ele era um pouco mais rigoroso. Eu não podia errar", lembra.

Contudo, apesar algumas desavenças, Adriano nunca pensou em seguir um outro rumo que não o de trabalhar ao lado de seu pai. Diz que sempre gostou da vida em restaurantes e que, entre outras lições, aprendeu com o "velho" a ter trato com os garçons e chefs de cozinha, além de ser mais ponderado em algumas situações.

Assumidamente de pavio curto, ele lembra que no começo precisou ser domado. A falta de experiência ocasionava situações desconcertantes como brigas com fiscais. "Quando chegavam aqui, eu queria que mostrassem o crachá, ligava para confirmar se eram fiscais mesmo", conta. João ficava louco. Tentava mostrar ao filho que muitas vezes as coisas são resolvidas com uma boa conversa. Por outro lado, o seu espírito jovem trouxe benefícios ao restaurante que poderiam passar despercebidos pelo velho empresário. Foi Adriano o responsável pela informatização da casa, lá atrás, ainda nos primeiros pratos servidos pela cantina.


De pai para filho
A relação chefe x funcionário nem sempre é a mais harmoniosa. Quando ela se dá entre pais e filhos, então, pode ficar ainda pior, caso o mais novo não respeite a hierarquia da empresa, e o pai extrapole os limites por ser o funcionário alguém próximo.

Por sorte, tanto da família quanto da empresa, não foi este o caso dos Temperanis, proprietários do restaurante de cozinha caipira O Compadre, em São Paulo. Dos tempos em que trabalhou ao lado do pai, Marcus lembra que era uma relação de total cumplicidade. "Ele era uma pessoa de visão à frente. Se havia alguma divergência era em alguns detalhes, que sempre eram escutados e discutidos", lembra o rapaz que hoje já não pode mais contar com os conselhos do velho amigo. Seu pai, Osmar Temporani, faleceu em 2004, em um acidente de carro na rodovia Dom Pedro I, próximo ao seu sítio, em Nazaré Paulista.

Foto: Arquivo pessoal/ Divulgação
Saudades: Osmar ao lado de seus três filhos


Mas como em qualquer time, desavenças às vezes acontecem e até são bem-vindas, desde que na medida de certa. Marcus diz que no começo tentavam não levar assuntos do restaurante para casa, mas viu que era impossível. "Acabávamos muitas vezes falando de trabalho. Mas isso nunca interferiu em nossa relação", lembra, com saudades.

Essas divergências comuns entre pais e filhos também são bem contornadas em outro restaurante de São Paulo, o Marcel dos Jardins. Lá o jovem Raphael Despirite, de apenas 24 anos, assumiu a cozinha com a total aprovação do "coroa". A confiança transmitida a ele muito se deve ao fato de seu pai ter passado pela mesma experiência, quando recebeu do pai dele, avô de Raphael, o comando da casa. Hoje, o jovem chef não só trabalha, como também mora com o pai, o que faz com que ambos procurem sempre resolver eventuais problemas com uma boa conversa, daquelas de homem para homem.


Mas tem hora que irrita!
Quem nunca reclamou do chefe? E não seria diferente mesmo se tratando do próprio pai. Uma das coisas que irrita Adriano quando está trabalhando é a forma "familiar" que João toca a Lellis. O filho, por outro lado, diz que cuida da casa de forma mais profissional, organizada. "Preciso pedir a ele que anote quando pega um vinho na adega", reclama.

Já no Compadre o problema não era a desorganização, mas a mania que tinha Osmar de querer estar 24 horas trabalhando. Talvez por ter ele aberto seu primeiro estabelecimento, com muito suor, não largava o comando da casa nem por um dia. "Mesmo quando ele tinha um compromisso fora, queria fechar o restaurante. Passava na volta pra ver como estava a casa", recorda.

E pior do que ter motivo para reclamar do chefe, é ter um chefe que reclama de você. Raphael nem pode pensar em deixar o suflê desandar que lá está seu pai para dar-lhe uns puxões de orelhas. "Ele é o cara mais crítico do mundo", diz ele, como qualquer outro funcionário reclamão.

***

Cardápio de família
O que os pais e os filhos sugerem
Marcel
Pai: Confit de pato
Filho: Cherry salteado com curry de aspargo

Lellis
Pai: Sempre a última novidade. Agora é o Conchiglione
Filho: Espaguette à carbonara

Compadre
Pai: Frango Caipira (Os criados no sítio da família)
Filho: Pernil assado


Foto de abertura: Fox Film/ Divulgação

Atualizado em 7 Ago 2012.