Guia da Semana

Embrulho caprichado, Winehouse ecoa uma Motown mais do que desgastada


Desde o declínio do grunge, em meados da década de 90, o pop rock sente-se órfão de um gênero predominante que norteie as novas gerações e sirva de alvo fixo para quem está sempre pronto a botar por terra os parâmetros artísticos vigentes. Ao marasmo que se estabeleceu nos anos seguintes, sucedeu-se uma aberração que costuma rondar o cenário musical em momentos de aflição: a tentação por requentar antigas fórmulas de sucesso.

É difícil esquecer a excitação patética que se sucedeu ao lançamento de Back To Black, o papa-Grammy de Amy "Rehab" Winehouse. Pelo que os valentes da mídia cacarejavam, logo cogitei uma nova Aretha Franklin, corei ao imaginar uma "Body And Soul" fresca a verter lamúrias tocantes pelo palco, tal qual Billie Holliday. Mas a britânica espertalhona foi servida como um insípido prato requentado da Motown, a saudosa Motown que tantas alegrias entregou aos amantes da boa música. Para quem ainda crê no frescor da Sra.Winehouse recomendo que pesquise o histórico irreparável de um sujeito chamado Mark Ronson, o homem por trás da ascensão da queridinha dos tablóides. Confira também o DVD I Told You Was In Trouble - Live In London, e veja como a donzela tangencia o medíocre em uma apresentação ao vivo.

Capa de Jukebox, último disco de Cat Power
Já que a soul music voltou à pauta, nada melhor do que ouvir dois discos da americana Cat Power, os impecáveis The Greatest e Jukebox. Se a imprensa não deixou de reverenciar essas obras, não lhes deu os devidos louros porque Chan Marshall, verdadeiro nome de Cat Power, ainda que tenha surtado em uma rehab em 2006, não é o petisco mais saboroso para uma imprensa faminta por baixarias mais do que de manjadas. A verdade, meus caros, soul por soul, é que Winehouse não serve nem para roadie de Cat Power. É ouvir a versão de Lost Someone, pérola de James Brown, interpretada pungentemente por Chan, e comparar com qualquer faixa de Back To Black. Não sobre pedra sobre pedra.

Outro fenômeno que chama a atenção é o retorno nada triunfal da palavra folk. É o novo folk do Vanguart? É o anti-folk de Mallu Magalhães? Obrigado, dispenso o hype pseudo-caipira do violão tosco e deixo um bom e velho disco do Buffalo Springfield mostrar o que é folk de verdade. Se a sanha por ecos de country parece ser a tônica do momento, recomendo aos preguiçosos de plantão que voltem um pouco no tempo e tratem de resgatar o nome do genial Grant Lee Buffalo ou que deixem de atirar papel higiênico - como fizeram na primeira edição do Tim Festival, no Rio de Janeiro, em episódio lamentável - no palco do Lambchop, dois grandes artistas, que se não bebem exclusivamente do folk tradicional, sabem como rearranjá-lo de maneira honesta.

Lambchop: alvejado por papéis higiênicos pelo público carioca


Mais frustrante do que remendar um gênero soterrado pelo tempo é requentar seu próprio repertório. Noves fora o novo filme de Martin Scorsese, Shine A Light, o que os Rolling Stones têm mostrado de relevante nas últimas duas décadas? Espetáculos grandiosos, arrecadações de saltar aos olhos, sustentadas por apresentações competentes e clássicos inesgotáveis, são ótimos motivos para pagarmos tributos a Mick Jagger, mas quando o assunto carece de material novo, arrojado e que faça jus à história dos Stones resta um vazio angustiante.


Quem é o colunista: Bruno Lofreta
O que faz: jornalista
Pecado gastronômico: comida mexicana e cerveja irlandesa
Melhor lugar do Brasil: Embarque do Aeroporto Internacional de Guarulhos (Cumbica)
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Atualizado em 6 Set 2011.