Guia da Semana

Foto: Divulgação / MilSGNunes


O sobrenome, mesmo que escrito de outra forma, lembra o de uma grande cantora baiana, que como ela mesma define, é uma entidade: Ivete. Elas são irmãs, se completam na música, mas Mônica San Galo, 46 anos, vai muito além de ser apenas irmã da rainha do axé.

No palco ela é Madame, uma mulher que vive suas aventuras e extrapola suas emoções, sem deixar que a timidez a atrapalhe. Fora dele, ela é Mônica, uma mulher agitada, multifacetada, que em meio a bagunça consegue se inspirar e compor letras que mexem com as emoções.

Aos seis anos ela tocava e cantava com o pai, o grande incentivador da música em sua vida e exímio violinista. "Comecei a aprender violão e nunca mais me separei dele", conta ela que além de ser formada em música pela Universidade Católica de Salvador, também passou pela faculdade de direito da mesma instituição.

Leonina, que gosta de se sentir absorvida pela vida, mescla boleros, sambas e chorinhos como parte de sua vida. Após 20 anos de carreira, ela lança seu primeiro CD e DVD, Confissões de Madame, onde apresenta 17 canções inéditas, feitas especialmente para o projeto.

Em uma conversa que mostra muito seu lado camaleoa e deixa fluir toda sua boa energia, Mônica revela por que demorou tanto para lançar um CD, conta da família e fala sobre sua fascinação pelas cores, que há oito anos colorem as notas musicais e a acompanham nos acordes.

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Guia da Semana: Você é formada em música e direito. Porque escolhas tão diferentes?
Mônica San Galo: Eu sempre gostei muito de ler, sou uma pessoa dependente de leitura. A escola de direito eu fiz porque nessa época estava morando em Juazeiro, e lá tem uma escola de direito que é uma extensão da Universidade Católica Baiana. Eu aproveitei que tinha essa oportunidade, minha filha estava pequena ainda, dava para eu fazer e fiz. Foi uma coisa que eu adorei, nunca militei em direito, mas gosto muito de ter feito a escola. A música sempre foi uma coisa que esteve presente, é uma coisa biológica.

Guia da Semana: Teve influência do seu pai você estudar música?
Mônica San Galo: Meu pai era violonista, tocava violão popular. Ele tocava muito bonito, era um músico intuitivo, não era um musico acadêmico não, ele era aquela pessoa autodidata. O violão dele era muito personalizado. Quem ouvisse o som e não visse a pessoa que estava tocando, sabia imediatamente que era ele, era um violão com muita personalidade. Desde cedo eu me interessei pelo instrumento, gostava demais de ficar ouvindo e ele viu meu interesse acabou me ensinando. Comecei a aprender violão, passei a tocar junto com ele, tocávamos juntos, ele fazia solo de choro e eu fazia base para ele. E nunca mais me separei do violão.

Guia da Semena: Quais outros instrumentos você toca?
Mônica San Galo: Eu também toco castanhola e estou começando a ter alguma coisa com o piano. Meu instrumento de origem é o violão, embora eu também goste de piano. A castanhola é mais uma coisa performática, uma coisa bonita de se ver no palco e funciona muito, fica bonito, tem um som gostoso. No meu show uma das canções eu toco castanhola.

Guia da Semana: Quando decidiu que viveria de música?
Mônica San Galo: Sempre tive decidido que a minha vida era a música, nunca precisei decidir não. O direito foi somente uma coisa circunstancial. Eu estava em um momento em que eu não podia me afastar muito de casa, apareceu o curso e eu fiz. Mas não foi uma coisa que eu tivesse feito porque queria militar na área de direito. A música é biológica em mim, quer dizer, na verdade ela é fisiológica, está sempre comigo.

Guia da Semana: Como se interessou pelas tintas e telas?
Mônica San Galo: Desde petitica eu era fascinada por lápis de cor, por tinta, aquelas coisas de material escolar. Minha cor favorita sempre foi o vermelho, sempre tive isso decidido, nunca tive dúvida. Eu gostava tanto do vermelho que na caixinha do lápis de cor eu não usava ele. Usava todas as cores e com o vermelho fazia a maior economia para não gastar. Eu sempre gostei muito de desenhar e sempre tive muita habilidade manual. Para preparar festa de aniversário de irmão, festinha de escola, eu sempre estava envolvida com essas coisas, fazendo cenografia, teatro; as pessoas sabiam que eu levava jeito e juntava a fome com a vontade de comer.

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Guia da Semana: Quando fez os seus primeiros quadros?
Mônica San Galo: Comercialmente falando, há oito anos uma pessoa foi lá em casa fazer um trabalho. Um pintor foi colorir um móvel. Eu gostei muito do material que ele estava usando, uma tinta de secagem rápida, e procurei saber que material era aquele, porque gostei muito daquele efeito. Então perguntei aquela criatura: 'Olha você pode me orientar aqui?', e a criatura disse que tinha umas sobras de tintas e tal e perguntou se eu queria. Aí pronto, comecei ali imediatamente. Por acaso eu tinha uma tela branca em casa e fiz um presente para a minha irmã Cíntia, uma Nossa Senhora Desatadora dos Nós, era aniversário dela e eu a presenteei com essa tela e ela amou e todos gostaram muito. Aí é aquela coisa, eu comecei a ser estimulada e comecei a pintar, pintar e quando vi, tinha 40 telas prontas. Organizamos uma exposição e vendi a maioria das telas. Gostei muito de ter feito isso e não parei mais.

Guia da Semana: Você já teve algum momento em que estava pintando e teve uma inspiração para compor?
Mônica San Galo: Com certeza! Taí uma coisa que nunca ninguém me perguntou! É uma coisa tão frequente isso, de eu estar pintando e parar e ir direto para o computador. Às vezes não tiro nem as luvas, meu marido diz que eu sou louca, que eu vou acabar sujando tudo de tinta. Não tem uma seqüência, um método; é algo que acontece.

Guia da Semana: Você diz que até o silêncio te influência, que é uma pessoa influenciável pela própria natureza. O processo de compor para você é fácil?
Mônica San Galo: A composição domina a pessoa, não a pessoa que a domina, assim como a tela. Não sou eu quem pinta, o pincel parece que vai só, é impressionante. Não adianta você querer controlar essa força, é o pincel que vai, a composição que vem, e quando ela vem, é com uma força tão impressionante que não há como você brecar esse processo. Funciona dessa forma.

Guia da Semana: Já aconteceu o inverso, de você estar compondo uma música e pensar em uma tela?
Mônica San Galo: Com certeza. Outro dia estava no computador escrevendo, a canção se chamava Coração de Cristal, e quando eu visualizei a figura eu parei o que estava fazendo, desci e fui para o atelier. Eu estava com o violão no colo, mas fui lá e comecei a trabalhar em cima dessa figura, que é algo bem bonito, tanto na sonoridade das palavras juntas, quanto em um coração feito de cristal.

Guia da Semana: Como criou o seu alter ego, Madame?
Mônica San Galo: É um pouco eu e um pouco personagem, eu diria que cheguei no meio do caminho de um alter ego. Acho que todo artista tem uma timidez; claro que alguns mais, outros menos. Eu sou uma pessoa tímida, embora eu seja muito falastrona, goste de conversar. Mas se eu entro em um lugar e as pessoas naturalmente me olham, devido a minha exposição na mídia e tudo, fico muito envergonhada, um terror. Às vezes a pessoa até se passa por mal educada e não é nada disso, eu quero dominar isso. Para tanto, eu criei essa personagem que pode funcionar para mim como um escudo, que eu possa interagir sem dar vazão a essa timidez, que é algo que sempre incomoda o artista. É por isso que apareceu essa bendita Madame, que já ficou bem marcada, não sei se me livro dessa danada! (risos)

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Guia da Semana: Sua carreira como cantora não é nova. Por que só agora resolveu gravar um CD?
Mônica San Galo: Eu resolvi gravar agora porque até então eu não me julgava pronta para isso. Eu achava que eu ainda não estava madura o suficiente. Esse é um trabalho que tem uma grande intensidade, tem muito de mim nele, isso tem a força de uma biografia, é muita energia que se coloca em uma coisa dessas. Eu queria começar assim, sempre tive vontade de fazer um trabalho assim, que me completasse dessa maneira, como esse trabalho está me completando no momento. Foi uma boa abertura de cortina o Confissões de Madame.

Guia da Semana: Quando você decidiu lançar o DVD tinha alguém do seu lado falando que você estava no momento certo para começar?
Mônica San Galo: Foi uma coisa engraçada. Durante o carnaval de 2008, eu estava no trio e minha irmã Ivete me convidou para cantar uma canção com ela, e eu fui. Duas irmãs cantando juntas, ainda mais aqui na Bahia, que o carnaval tem essa coisa forte. Sempre tem algo muito forte, a gente chora e foi nesse momento que ela disse: 'Desse ano não vai passar, eu prometo a vocês que Mônica vai gravar, vai fazer o DVD, não vou deixar que ela não siga com esse projeto'. A partir daí meu marido concordou, e disse que eu tinha mesmo que fazer esse trabalho, e com essa prensa que eles me deram eu toquei o bonde, coloquei o bloco na rua! Passei a me concentrar nesse trabalho, todas as músicas foram compostas para esse trabalho, elas não existiam.

Guia da Semana: Até onde ser irmã de Ivete ajuda?
Mônica San Galo: Ivete ser minha irmã, somente isso, já me ajuda. Primeiro porque é um grande prazer ser irmã de Ivete, eu nem sei se Ivete é gente, é entidade já, ela é uma pessoa fantástica, uma força da natureza. Ainda que não me ajudasse no meu caminho profissional, ainda assim seria uma grande honra ser irmã dela. Eu abriria mão de qualquer coisa para continuar sendo irmã dela.

Guia da Semana: Você se sente pressionada por ser irmã dela?
Mônica San Galo: Eu não chego a me sentir pressionada, eu acho que meu trabalho fala por mim, eu só preciso é dar a oportunidade de ser ouvida. Quando a pessoa me ouve ela vai entender que nós somos duas partes que se completam musicalmente falando. A Ivete faz um trabalho de qualidade incontestável, dentro de um departamento; o meu é outro departamento e também é bom e de muita qualidade. Eu sou uma pessoa muito severa na minha auto critica, e na critica em geral eu sou super severa, então certamente não me contentaria em colocar no mercado um trabalho que não fosse de boa qualidade.

Guia da Semana: Quais são suas influências na música?
Mônica San Galo: Mas é uma infinidade de coisas! Se eu vou à feira, aquela balbúrdia, aquelas pessoas gritando, aquilo me influencia. Eu ouvi demais Jackson do Pandeiro, tenho a obra completa dele. Também ouvi muito chorinho como Turma do Meu Choro. Sou apaixonada por música instrumental, por grupos como Cama de Gato, Grupo Garagem, Ernesto Pascoal e Toninho Horta. Escuto muita música popular, gosto para caramba de música eletrônica e adoro tango! Eu sou influenciada de tudo quanto é jeito, até pelo barulho do vento, no próprio silêncio. Eu estou no mundo para absorver essas influências.

Atualizado em 6 Set 2011.