Guia da Semana

Foto: Fred Jordão

As redondezas da estação Brigadeiro do metrô, na Avenida Paulista, concentram, em alguns quarteirões, parte da melhor produção artística de São Paulo na atualidade. E o Itaú Cultural, fincado entre a Casa das Rosas e o SESC Paulista, vem atraindo cada vez mais a atenção do público da cidade.

A evidência se justifica. Nos últimos meses, o instituto consolidou sua reputação com eventos gratuitos sobre artes e conhecimento sobremoderno, marcados por curadorias de alta qualidade.

Além do acervo fixo, composto por um museu de moedas e medalhas luso-brasileiras e uma midiateca, o Itaú Cultural desenvolve projetos relevantes na área da literatura.
No entanto, seu maior destaque são as exposições temporárias batizadas de Projeto Ocupação.

Ricas de material inédito e intimista, as mostras inserem a memória, as influências e os processos criativos de grandes artistas na arquitetura do local, estabelecendo comunicações interessantes entre obras e galeria.

O Projeto Ocupação já prestou honras ao teatrólogo Zé Celso e ao poeta Paulo Leminski, dentre outros, e nesta quinta edição traz um recorte sobre o cantor e compositor Chico Science.

"Há um líder negro dentro de você". A frase sintetiza a filosofia do sujeito franzino vestindo chapéu-coco e óculos escuros, uma das mais importantes referências da música brasileira nos últimos 20 anos. Como numa literal ocupação, o vocalista da banda Nação Zumbi e suas reminiscências invadem espaços inusitados e entregam ao público uma síntese reveladora do movimento manguebeat.

Chico Science ascendeu na cena artística recifense na década de 90. Após passagens por bandas de funk, soul e hip hop, consolidou sua musicalidade no contato com os blocos de maracatu. A mistura entre a percussão africana e as antigas preferências deu origem à Nação Zumbi, um sucesso imediato de crítica.

Após alguns poucos anos e dois discos gravados, o cantor faleceu em um acidente na estrada que liga Olinda a Recife. Seu legado, porém, permanece intacto, cada vez mais moderno e relevante.

Logo à entrada, o Espaço Sósias de Chico brinca com a identificação audiovisual do compositor, um obcecado por fotografias. Os visitantes são convidados a vestirem-se como o "homem-caranguejo" e registrarem a pose, que depois passa a compor o acervo da própria exibição.

Outras instalações falam da conexão do mangue ao mundo, ilustrada pela já clássica antena parabólica enfiada na lama, e traçam paralelos entre a produtividade do ecossistema do mangue e a do artessistema da cena cultural local.

A mostra segue com histórias em quadrinhos, fotos em porta-retratos caseiros e trechos de obras do sociólogo Josué de Castro, influência ideológica do manguebeat. O movimento, de alta fertilidade, gerou frutos como Mundo Livre S/A, Otto e ainda influencia novos artistas.

Ao final, uma surpresa muito bem pensada, que provoca a curiosidade do visitante, e vídeos do cantor em ação, em uma grande tela de tevê que, sugestivamente, ocupa o interior do porta-malas de um carro antigo. O velho e o novo, a tecnologia e o artesanato, a lama e o caos - antagonismos essenciais para a compreensão de Chico Science.

O Itaú Cultural fica na Avenida Paulista, número 149, próximo à estação Brigadeiro do metrô, e funciona de terça a sexta-feira das 9h às 20h. Aos sábados, domingos e feriados, o horário é das 11h às 20h. A quinta edição do Projeto Ocupação fica em cartaz até o 4 de abril. Entrada gratuita, lanchonete no local. Mais informações, acesse o site oficial.

Leia as colunas anteriores de Rafael Gregório:

No meio da selva de pedra

São mil faces

Luzes e enfeites

Quem é o colunista: Rafael Martins Gregório.

O que faz: Jornalista, músico, advogado e escritor.

Pecado Gastronômico: Pizza, chocolate, sorvete. Guloseimas exóticas em geral.

Melhor lugar do mundo: Minha cama e um colinho bom.

Fale com ele: rafaelmgregorio @gmail.com ou acesse seu blog.

Atualizado em 6 Set 2011.