Guia da Semana

Fotos: Arthur Santa Cruz


É uma viagem em um ônibus intermunicipal do Rio de Janeiro. No momento em que o coletivo pára em um ponto para pegar mais um passageiro, um homem branco com roupas simples e mochila nas costas, aparentando entre 35 a 40 anos, entra pela porta da frente. O motorista e os passageiros percebem que uma luz acena no teto do transporte. Um sinal de que o indivíduo pode estar armado.

Embora essa cena pareça fazer parte de um filme futurista, este fato está muito próximo de acontecer. Isso porque o Departamento de Transportes Rodoviários do Rio de Janeiro (Detro-RJ) vai implantar entre os dias 15 e 20 de fevereiro, um teste durante um mês em dois ônibus intermunicipais do estado: uma linha pouco movimentada (Paraíba do Sul à cidade do Rio) e outra com fluxo mais intenso (Nova Iguaçu à cidade do Rio), equipados com detector de metais na porta de entrada, que serão acionados assim que alguma pessoa tentar embarcar com um material metálico acima de um determinado peso, de acordo com normas internacionais.

Esse sistema possui uma central que pode filmar o que acontece dentro do ônibus e mantém uma comunicação com o motorista, com a possibilidade de cortar a bomba de combustível e a ignição, acionar luzes externas e um localizador de veículos via GPS, enquanto que dentro do ônibus, os passageiros conhecem o risco do assalto com um sinal luminoso no teto do veículo. Caso o viajante que entrar seja um assaltante, o motorista pode acionar esse sistema, enquanto uma câmera filma tudo que acontece no interior do coletivo. O passageiro ainda pode mostrar o que traz consigo ao motorista e passar novamente pela porta. Nesse caso, a perda de tempo e o constrangimento são inevitáveis.

Pontos de vistas

O presidente do Detro-RJ justifica a ação: "São altos os índices de assaltos a ônibus e nossa intenção é reduzir esses números e contribuir com a segurança dos passageiros. É um trabalho que visa à prevenção, porque se a pessoa souber que o ônibus é equipado com detector e que pode ser localizado pela polícia, não vai nem embarcar no coletivo", enfatiza.

De acordo com estatísticas do Instituto de Segurança Pública no Rio de Janeiro, no ano passado foram 7.513 roubos a coletivos em todo o estado, somente em dezembro foram registradas 429 ocorrências, com o recorde em maio de 2007, de 815 casos. O aparelho, inventado por um engenheiro de Santa Rita do Sapucaí, Minas Gerais, custará cerca de R$ 1,5 mil por veículo e caso o teste dê resultado, a meta do Detro-RJ é implantar em toda a frota intermunicipal, coibindo o assalto a ônibus.

O projeto divide a opinião pública e de autoridades. O diretor de comunicação da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) acha o experimento válido, embora não tenha uma opinião quanto à implantação. "Vamos ver primeiro se funciona e como a população reagirá. Sou a favor de medidas que inibam a violência e o roubo e inicialmente apoio sem ressalvar esse projeto, embora precise ver o quanto isso vai gerar de custo a mais para as empresas em equipamento e treinamento de funcionários".

Já o diretor regional da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) no Rio, Willian Alberto de Aquino Pereira, tem outra opinião sobre o assunto. "Cada vez que aumenta o grau de insegurança da população, medidas que cerceiam a nossa liberdade são tomadas. No caso do ônibus, acho difícil esse projeto vigorar pelas dificuldades de sua implantação, pois se cada pessoa que tiver algo de ferro for barrada ou mesmo tiver de mostrar os pertencer que leva consigo, vai gerar um custo maior de tempo em cada trajeto, resultando a necessidade de maior número de ônibus nas linhas".

O cobrador de São Paulo, José Nunes de Oliveira, 38 anos, trabalha na linha Ana Rosa - Parque Edu Chaves há cinco anos. Vê com bons olhos o projeto. "Acho que isso seria bom para diminuir os assaltos, aqui não, mas há linhas em que a gente sofre esse risco". Já o fiscal Genivam Olimpus, 35 anos, que trabalha no ponto final da linha Anastácia - Paraíso tem outro ponto de vista. "Depois que instalaram o bilhete eletrônico, não tem mais assalto em ônibus, pelo menos não para o cobrador. Para eles (do Rio de Janeiro) deve ser necessário (sorri), mas para nós, eu não vejo muita serventia não!", brinca o fiscal.

Em outros lugares

A SPTrans (São Paulo Transportes) não quis se pronunciar sobre o assunto, alegando não ter conhecimento sobre o projeto e nem partilhar das suas idéias. O Metrô de São Paulo utiliza desde abril de 2004 os detectores de metais dentro das estações. Instalado próximo às catracas, o sistema conta com uma equipe de segurança que auxilia na revista das pessoas que querem embarcar, caso sejam acionadas pelo sistema. Em horários de pico, a revista é feita por amostragem, evitando assim o tumulto no embarque. A assessoria informou que o sistema é itinerante, migrando de uma estação à outra, para inibir os assaltantes e pegar o infrator desprevenido.

Recentemente, as agências bancárias de São Paulo foram impedidas de usar os detectores de metais. Depois de dez anos de tramitação, foi derrubado em 12 de dezembro de 2007, na Câmara Municipal, o veto à Lei 575/1997, de autoria do vereador Dalton Silvano, do PSDB, que proíbe o uso de portas giratórias (sejam de vidro ou de qualquer outro material) e de detectores de metais no acesso ao interior de bancos e de instituições financeiras na capital paulista.

Segundo a alegação do vereador, as portas constrangiam mais as pessoas humildes do que resolviam os problemas de assalto e, até um simples chaveiro era motivo de suspeita. Devido aos constrangimentos, inúmeros processos foram movidos contra instituições bancárias, sendo um deles em 2005, quando o Supremo Tribunal Federal deu indenização de R$ 25.600,00 a um sargento aposentado da PM gaúcha, que foi barrado em uma porta giratória. Por causa de sua perna mecânica, ele não passou pelo detector de metais instalado na agência. Os bancos têm um prazo de 120 dias para se adaptar à restrição.

Com o projeto em mãos, a população carioca vai dar a resposta se aceita essas medidas ou não. Problemas iniciais, como medo e preconceito dos passageiros e motoristas irão existir, basta saber o que vai prevalecer, a segurança pública e a solução que as autoridades criou para ela, ou outras decisões serão necessárias para dirimir a ação da criminalidade neste grande centro urbano.

Atualizado em 6 Set 2011.