Guia da Semana

Foto: Márcio Alexandre
Vista de cima do Pico do Cambirela


Descrição: De latitude 27° 45´ sul e longitude 48° 40´ oeste, o Cambirela (ou Gambirela) é uma montanha composta por granito e basalto, comumente encontrados em regiões fronteiriças entre a Serra do Mar e a Serra Geral com formações geológicas diferenciadas, de vegetação remanescente da Mata Atlântica até cerca de 800 metros de altitude - após, encontra-se basicamente gramíneas e pouca vegetação de altitude, situada no município brasileiro de Palhoça, na Grande Florianópolis do Estado de Santa Catarina. O mais triste de tudo está na cratera de uma pedreira imensa agredindo a paisagem e ao maciço. No entanto, a vida resiste: proprietários da lavoura têm tentado reconstituir a ferida, com a plantação de árvores, num esforço de cicatrizá-la por causa da exploração mineral.

Já fazia um bom tempo que estávamos namorando aquele pico. Pico do Cambirela ("Montanha próxima do mar"), com uma altitude de 1.043 metros, suficiente para se imaginar que vista teríamos lá de cima para Florianópolis e região.

Bem cedo, marcamos o ponto de encontro na Intelbras. Às 8h, procurávamos pelo início da trilha, perguntando para os moradores da região. Antes de tudo, ficamos estarrecidos com o que víamos. Alerta para o absurdo: uma enorme cratera, gigantesca mesmo, cada vez maior na base da montanha. Caminhões (com tamanho proporcional a uma formiga diante de um formigueiro), dezenas deles, e escavadeiras, muitos trabalhadores e pouca consciência do que ali faziam. Até quando o homem vai achar que retirar terra e cascalho inconseqüentemente de uma área de preservação permanente é mais importante que a sua conservação? Teoria de Gaia, meus senhores... Teoria de Gaia...

Por volta das 8h10, entrávamos em um sítio bastante aprazível, com belo lago, patos e gansos, cultivo florido de nabo e, ao fundo, nosso objetivo. Parada para a foto tradicional dos selecionáveis e vamos lá! 1° Obstáculo

Após uma bela caminhada por mata fechada, eis o primeiro grande obstáculo: uma pequena ´escalaminhada´. Tivemos que nos apoiar em raízes, troncos, galhos e pedras, até que... (momento de ligeira apreensão) - Cuidado aí embaixo! - Ufa! - Bom reflexo, Fábio! Acabara de desviar de uma pedra que descia em velocidade pirambeira abaixo.

Logo, um belíssimo cenário se descortinava à nossa frente, com visual para Pedra Branca ao fundo, Palhoça em baixo, Rio Cubatão... olha ponte Hercílio Luz do outro lado, Ilha de Santa Catarina... Continuamos. Subimos segurando a corda e, a partir daí começaria o próximo desafio, ainda maior.

O 2° desafio

Olhar para baixo? Melhor não. Só tinha um jeito: escalar. A mata fechada ficava para trás, deixando boas recordações. Mãos e pés sobre pedras Aos poucos, a determinação, segurança e solidariedade entre os trilheiros venciam o medo de goleada.

Em um determinado momento, tivemos que segurar nas cordas, inclinando o corpo para frente e depositando toda confiança no sucesso da investida. Nossa! Obrigado! A vista impressiona, compensando qualquer esforço. Dali em diante, tínhamos uma certeza: não retornaríamos mais por este trecho extremamente íngreme.

Caminhando pela Crista da Montanha

Iniciamos uma caminhada pela crista de uma cadeia de montanhas, rumo ao 1° cume. Do lado, uma pintura com traçados sinuosos de morros verdejantes. Do outro, Florianópolis, com destaque para Ribeirão da Ilha, Campeche, Enseada de Brito logo embaixo...Depois do visual de tirar o fôlego e muita caminhada, adivinha? Quando achamos que tínhamos chegado... havia mais um cume que tínhamos que conquistar!

E mais subida. Agora, sem escalada. Percorremos até um ponto para contemplação e compartilhar o que víamos. O que dizer de tudo isso? Muito lindo. Mas aí olhamos para mais ao sul e não acreditamos que a saga não havia terminado. Uns deram por cumprida missão. Outros, não pensaram duas vezes: - Ah, aquele 3° cume (o mais alto de todos e ainda escondido antes de chegar ao 2°) não vai ficar inexplorado não. E fomos lá, até que um forte nevoeiro encobriu toda nossa visão, apesar de ser de fácil acesso.

O 3° cume

Que pecado... Havíamos começado a ver a Enseada de Brito, a Praia da Pinheira, Guarda do Embaú... Uma pena ter a vista prejudicada pelas nuvens. No entanto, fincamos a bandeira da conquista de mais um desafio suplantado. Agora é hora de retornar.

O Retorno e as Pirambeiras da Vida

Escolhemos uma trilha mais tranqüila. Será? Estava ali uma pirambeira enlameada, com muita aventura e gargalhadas com os escorregões. Descemos toda vida e mais um pouco, nos segurando no que conseguíamos e não conseguíamos. Novamente em mata fechada. Passamos por alguns trechos, digamos, um tanto quanto perigosos, como o "solo oco" coberto por folhas secas e terra numa ribanceira abaixo para ninguém botar defeito e sequer ter a coragem de fotografá-la. Só lembro de uma pessoa falando: "Não olha para baixo! Gruda na terra que nem aranha na teia".

Passada sensação de perigo, continuamos a trilha felizes, com a possibilidade de termos conhecido um lugar encantador. No final, contávamos os arranhões como troféus, nos indignávamos com os dois sacos de lixo de cem litros, que enchemos com a irresponsabilidade dos demais, e relembrávamos das histórias engraçadas e intrigantes, como as duas divas que encontramos lá no topo em trajes aristocraticamente corretos, chale e roupa impecável (só faltou salto alto), ainda degustando cachos de uva itália. Chegamos por volta das 16h. Esse trilha entrou para o hall das dez melhores!


Quem é o colunista: costumava me imaginar como a letra de música de uma banda chamada Guided by Voices: "I am a journalist - I write to you to show you: I´am an incurable and nothing else behaves like me..." Porém, com o tempo venho descobrindo que eu, assim como você, todos nós, somos vazios como o espelho e abertos como o espaço. E no intervalo, juntos, criamos o mundo.
O que faz: Jornalista, trabalha com comunicação, marketing, caminha, pedala, mergulha e medita quando pode.
Pecado gastronômico: Sem dúvida, chocolate e tigela de açaí. Chocolate amargo com maior concentração de cacau é saudável e alivia a consciência.
Melhor lugar do mundo: aquele em que reside entre o instante que acabou de terminar e ainda nem começou, mas também aquele que se movimenta, interage, cria e recria, vibra, cintila e pulsa dentro de nós;.
Fale com ele: caminhandopelavida@gmail

Atualizado em 6 Set 2011.