Guia da Semana

Fotos: Gabriel Oliveira/Leonardo Filomeno

Conhecidas pelos pastéis e caldo-de-cana, as feiras livres concentram clientes de todas as idades e renda, oferecendo uma diversidade de produtos, desde legumes, frutas, verduras a bijuterias, roupas e calçados. O Sindicato do Comércio Varejista dos Feirantes calcula que existam cerca de 950 delas, responsáveis diretamente pelo emprego de 10 mil pessoas, embora existam muitas outras funcionando irregularmente na cidade.

O contato amistoso com o vendedor, a qualidade dos produtos e os preços baixos, se comparado aos grandes mercados, incentivam as pessoas a optarem por esses comércios de rua. Por outro lado, a gritaria dos feirantes, a dificuldade de acesso, a sujeira na calçada, o mau cheiro de peixe e produtos orgânicos são os principais problemas alegados pelos moradores das ruas onde as feiras residem uma vez por semana. Os imóveis dessas vias chegam a desvalorizar cerca de 30%.

O estudante de direito Reinaldo Carvalho, 27 anos, resume bem esse problema. "Todo mundo acha ótimo ter a feira por perto, mas ninguém quer uma na porta de casa". Residente da rua Alcino Braga, no bairro do Paraíso (zona sul), tem duas opções: ou deixa seu carro na rua à noite ou é obrigado a acordar antes das cinco da manhã para não ter vê-lo preso em casa, devido à feira instalada na sua porta.

Já o aposentado Abraão Figueiredo, morador da Rua Estela, do bairro de Vila Mariana (zona sul), contemporiza. "Há 35 anos convivo com ela, quando funciona tenho dificuldades ao sair de casa com o automóvel para caminhar no Parque do Ibirapuera, mesmo assim sou favorável às feiras livres, que já fazem parte da nossa tradição popular".

Vendendo o Peixe

Para perceber a cordialidade dos vendedores com os clientes é só fazer um passeio por esses comércios ao ar livre. Um exemplo é Dona Durvalina, 78 anos, que chega a deixar até R$ 250,00 por semana na barraca de aves de Dárcio Bernardo. Ele seleciona, limpa e corta os frangos, enquanto ela compra outras coisas. Quando volta, conversam animadamente e Dárcio pessoalmente leva suas mercadorias para casa.

"Diariamente pego mercadorias frescas, que são expostas após seleção. Acomodo no gelo e o que não vender é reposto no frigorífico. Diferente do mercado, que compram no mesmo lugar que a gente, muitas vezes os produtos já até passaram por nossas barracas, congelam é o que você vê é até 30% do peso da mercadoria só de água", afirma Dárcio para uma das vantagens de comprar nesses lugares.

Segundo o Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo), só na capital, em 2007, foram comprados 2,5 milhões de toneladas de mercadorias pelos feirantes, somando frutas, legumes, verduras, pescados e flores, isso representa um volume de 2,8 bilhões de reais gastos só por esse setor.

O presidente do Sindicato dos Feirantes, José Torres Gonçalves, aponta para as principais diferenças entre as feiras livres e os hipermercados. "Além de comprar primeiro as mercadorias, selecionamos para o cliente, dando até a oportunidade de experimentar o produto que ele vai levar. Sem contar o contato muito próximo entre o vendedor e o consumidor, que pode barganhar o preço".






A prefeitura de São Paulo já tomou algumas atitudes que afetam diretamente esse comércio itinerante. Ano passado, o prefeito Gilberto Kassab decretou a "lei do silêncio", que impedia os profissionais das barracas de usar aparelhos sonoros ou proclamar em voz alta seus produtos, incomodando os moradores do local. Devido à polêmica causada na época, a lei foi revogada em menos de um mês de criação.

Atualmente, para diminuir o tráfego de caminhões em regiões centrais na metrópole paulista, Kassab emitiu outro decreto que reduz em uma hora o funcionamento de 80 feiras livres, que ocorre normalmente das 7h30 às 13h30. Nesses lugares, as ruas terão agora que estar liberadas pelos feirantes, com as barracas já desmontadas e os produtos recolhidos nos caminhões, às 14h em vez das 15h.

O presidente do Sindicato dos Feirantes, José Torres Gonçalves, prevê uma queda nas vendas em torno de 20% a 30%, devido à diminuição de clientes que procuram o horário da xepa, onde os vendedores ofertam a um preço mais baixo. "Estamos conversando com Roberto Graziano (supervisor de abastecimento da Secretaria das Subprefeituras) para retornar ao horário anterior, caso isso não aconteça, o público será o mais prejudicado e vai ter que reeducar o hábito de freqüentar as feiras".

Apesar dos novos problemas com a prefeitura e as reclamações dos moradores, a coexistência com a vizinhança geralmente é pacífica e muitos acabam se adaptando a rotina semanal. Tudo indica que esse tipo tão tradicional de comércio pode até reduzir, mas ainda terá vida longa nas ruas paulistanas.


Conheça mais:
? Em São Paulo, esse comércio de rua tem a origem no período colonial. Expandiu-se mais rapidamente a partir do século passado, com a I Guerra Mundial (1914-1918), com as autoridades estimulando sua criação para baratear o abastecimento. O movimento caiu de 1997 para cá, em parte por causa dos hipermercados. Entretanto, os feirantes seguem como os maiores clientes da Ceagesp.

? Não existe um critério de escolha das ruas que recebem as feiras livres. Muitas delas remontam há décadas atrás e por fazer parte da tradição do bairro, persistem. A mudança de ruas dificilmente ocorre, já que a legislação determina, quando uma feira for retirada de uma rua, que seja instalada outra no mesmo distrito.

? A região de São Paulo com mais feiras é a zona leste, com 40% delas. Enquanto isso, a região central possui apenas 3,5% devido à inviabilidade de sua realização, que obriga a interdição de ruas e o desvio do trânsito para vias alternativas.

? O único dia da semana que não tem feira é na segunda. Como o agricultor não trabalha no domingo, o Ceasa só recebe mercadorias na segunda a partir do meio-dia, inviabilizando o trabalho nas ruas.

? Os feirantes pagam, em média, R$ 70,00 mensais para poderem trabalhar. As barracas de peixe, entretanto, custam mais caro, R$ 240,00 por mês.

Atualizado em 6 Set 2011.