Guia da Semana

Fico feliz que vocês não tenham votado naquele filme russo dos cegos viados. Aliás, aquele cego viado gordo e obeso era ótimo”. Minutos depois, outra tentativa de piada: “Não posso sair daqui sem comer, pelo menos, uma indicada a atriz coadjuvante”. Quase se podem ouvir as risadas gravadas ao fundo, como num programa de humor ruim em que é preciso avisar o público qual é o momento certo de achar graça. Mas não há graça.

Esse é o tipo de humor que o público verá em doses cavalares no primeiro longa-metragem do Porta dos Fundos, “Contrato Vitalício”, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 30 de junho. Um humor bem diferente do tipo de sátira inteligente que fez a fama do grupo – algo mais próximo de uma briga de crianças que, depois de esgotarem os argumentos, decidem ganhar a discussão xingando a mãe. Porque é mais fácil elevar a voz e disparar insultos do que colocar o cérebro para funcionar.

A história, que poderia compensar o tom errado das piadas, não ajuda em nada: um ator chamado Rodrigo (Fábio Porchat) e um diretor de cinema chamado Miguel (Gregório Duvivier) são premiados em Cannes. Durante a bebedeira de comemoração, assinam um contrato para trabalharem juntos em todos os seus filmes dali em diante.

Naquela noite, Miguel desaparece – sugado por alienígenas para o centro da Terra privada adentro. Dez anos depois, ele retorna e recruta Rodrigo para estrelar um filme sobre sua experiência fantástica, escalando prostitutas (todas travestis, porque preconceito não é problema para o grupo) e mendigos como seus assistentes e figurantes.

Esta é a história.

Juro.

Quem assistiu ao trailer de “Contrato Vitalício” deve ter notado as referências de “Se Beber Não Case” e, de fato, o longa de 2009 parece ter sido uma fonte abundante de inspiração. O problema é que a versão do Porta exagera na dose: é como se todos os coadjuvantes fossem loucos como Alan (o personagem de Zach Galifianakis) e sua única função fosse irritar o protagonista – e, consequentemente, o pobre e, a essa altura, arrependido espectador.

O filme poderia abraçar sua vocação trash e não se levar tão a sério, como um Trapalhões nos velhos tempos, mas não o faz. Pretensioso, o roteiro tenta justificar 100 minutos de tortura psicológica com uma lição de moral muito pouco convincente (e com uma virada que, infelizmente, chega tarde demais).

Pode-se argumentar que o Porta dos Fundos explora uma comédia do absurdo, como um Monty Python em seu tempo, mas a comparação seria enormemente ambiciosa. O grupo britânico, apesar de também arranhar os limites do bom senso em filmes como “O Sentido da Vida”, trabalhava seus diálogos com muito mais sutileza e preferia mostrar a hipocrisia da sociedade nas ações dos personagens e nas situações impossíveis, não em frases gratuitamente ofensivas.

Ninguém esperava que “Contrato Vitalício” fosse politicamente correto, mas, pelo menos, esperava-se que fosse engraçado. O que se vê em tela, porém, é muito mais apelativo e muito menos interessante do que do que o grupo tem feito na internet desde sua criação e, em momento nenhum, consegue provocar um riso que não seja nervoso ou constrangido. As críticas, que vão desde a obsessão pelas redes sociais à inconveniência do repórter de fofocas, são rasas e repetitivas, as piadas não vão além do senso comum e o sofrimento expresso no rosto de Porchat, durante todo o filme, reflete o sentimento de todos nós: só queremos que tudo aquilo acabe logo.

Minha sugestão? Guarde seu dinheiro e vá assistir outra coisa.

Por Juliana Varella

Atualizado em 2 Jul 2016.