Guia da Semana

Diante de um cartaz anunciando Fábio Porchat, Luís Lobianco e Marcos Veras, além da direção de Ian SBF, do Porta dos Fundos, o espectador desavisado poderá pensar que “Entre Abelhas” é mais uma comédia nacional de espírito stand-up. Pois não é – pelo menos, na maior parte do tempo.

A história foi idealizada por Porchat há mais ou menos nove anos, e segue numa direção totalmente diferente da que fez sua fama e a de seus colegas até agora. Inspirado pelo individualismo da vida em grandes cidades, o longa tem um clima sombrio, que remete ao realismo fantástico de um Dostoiévski ou um Saramago, simbólico e reflexivo – mas fica claro que SBF e sua equipe ainda não estão prontos para abandonar de vez os vícios de uma carreira construída sobre o humor. Ocasionais piadinhas, infelizmente, são inevitáveis.

O protagonista é Bruno (Porchat), um homem nos seus 30 anos cuja esposa acabou de pedir divórcio. Depois de uma festa de “despedida de casado”, ele percebe que está deixando de ver as pessoas – um a um, estranhos e conhecidos simplesmente se tornam invisíveis e inaudíveis para ele.

Desesperar-se é inútil, então ele toma a atitude mais lógica: conta o problema para sua mãe (Irene Ravache). Ravache assume o papel de alívio cômico, interpretando a senhora desconectada, sem papas na língua e que se preocupa com a imagem do filho diante da família nas festas de Natal. Prontamente, ela arranja um psiquiatra e uma “cobaia invisível” (Lobianco), para realizar os mais estranhos testes na tentativa de reverter a situação.

Enquanto a mãe acredita na cura, o próprio Bruno parece ter certeza de que está num caminho sem volta, e passa os dias anotando na parede os números decrescentes de rostos que ainda enxerga. Sua melancolia é ainda maior porque, à sua volta, também são poucas as pessoas que o enxergam: sua ex-mulher (Giovanna Lancellotti) só quer que assine os papéis; seu melhor amigo (Veras) só quer contar os próprios problemas. Ele está só – e agora percebe que sempre estivera.

“Entre Abelhas” é uma aposta arriscada para um grupo acostumado a grandes audiências, mas é um passo necessário e que reforça a recente expansão do cinema nacional a novos gêneros e formatos – o final aberto, por exemplo, é de arrancar os cabelos.

O roteiro tem muito a melhorar e certos personagens poderiam ganhar bem menos espaço, enquanto outros mereciam um desenvolvimento melhor. Além disso, muitas pontas permanecem soltas e é mais certo que o espectador sairá com uma sensação de vazio do que de satisfação. Ainda assim, o filme vai dar o que falar e, só por isso, já vale a experiência.

Por Juliana Varella

Atualizado em 29 Abr 2015.