Guia da Semana

Fotos: Getty Images


O hit do momento é acompanhado exaustivamente por meio das FMs e dos programas de clipes. Cheio de atitude, o artista dá o seu recado. Sua vida, turbulenta por sinal, é retratada pelas revistas de fofocas, tablóides e paparazzi. Sempre com um cigarro na mão, é fotografado em meio a festas, gente bonita, guarda roupa transado e glamour.

Como isso fica na cabeça do jovem que acompanha o seu ídolo? Será que mesmo com todo o acesso à informação que eles têm hoje, ainda assim ficam suscetíveis a experimentar o fumo por influência de uma celebridade? A resposta é sim. "Por mais que elabore o pensamento de que o cigarro é nocivo, uma parte mais profunda do ser recebe aquela imagem como condicionamento, associando-a a sucesso, competência", explica a psicóloga Rosa Pastor. É essa parte mais profunda que leva a pessoa a enxergar além, relacionando a vida daquela pessoa ao dinheiro, viagens e belas mulheres. "Dependendo da personalidade do jovem e do grau de ansiedade que atingirá na adolescência, há chances do racional superar o simbólico", comenta Rosa.

Incentivo

Na juventude, as pessoas fumam para se sentirem bem e experimentam o cigarro por imitação. Se tem uma referência em casa, pior ainda. Mas isso não quer dizer que se os pais e irmãos não forem viciados, o jovem nunca fumará. Os amigos também acabam interferindo nessa decisão. "O adolescente quer se sentir incluído, descolado, seguro. E aí começa a fumar para fazer parte da turma", explica. Com o cigarro nas mãos, ele vê a ansiedade diminuir, o fumo se torna um hábito, e daí para o vício é um passo. "A partir daí ele sente não só a falta emocional do cigarro, de como ele melhora, hipoteticamente, sua imagem, mas começa a sentir falta da nicotina", diz Rosa.

A impressão de que cigarro é sinônimo de descontração, sensualidade e poder vem de longa data. A psicóloga explica que isso acontece porque o fumo cria um ritual gestual que foi transmitido pela mídia e pelos filmes dos anos 50 influenciando gerações posteriores.

Os jovens têm experimentado o cigarro cada vez mais cedo, alguns já tragam aos 12 anos. "A partir dessa idade, por ser uma fase em que ele começa a querer se integrar socialmente, passa a questionar os valores que recebeu da família. Nessa época ele desenvolve uma fantasia de poder e de autosuficiência que se constitui num pano de fundo para começar a ter suas próprias experiências com o objetivo de desafiar os seus limites de liberdade", comenta Romildo Almeida, psicólogo especialista em hipnoterapia.



Para lidar com a situação, o melhor remédio para os pais é estabelecerem um diálogo sincero desde cedo. "Enquanto são adolescentes ainda há chance de influenciar para que não fumem. Mas é preciso ir atrás dessa chance baseada na confiança dessa relação. Se o relacionamento for frágil, fica mais difícil", alerta Rosa.

No alvo da indústria

Baladas, promoções, alusões à virilidade, ao poder e ao sucesso. As indústrias de cigarro criam uma série de ações com o objetivo de levar suas marcas para perto dos jovens, que são potenciais consumidores. Apesar da indústria não declarar, esse é um público que está na mira das empresas do segmento já que a população mais velha acaba morrendo e é preciso garantir a perenidade do negócio - mesmo que esse negócio não garanta a perenidade da saúde das pessoas.

No site do INCA (Instituto Nacional de Câncer), dá para se ter uma ideia de como os fabricantes de tabaco tratam o assunto por meio de documentos de grandes empresas que foram descobertos. Há um memorando interno, por exemplo, de um executivo da R.J. Reynolds Tobacco, datado de 23 de janeiro de 1975, que diz "eles (os jovens) representam o negócio de cigarros amanhã. À medida que o grupo etário de 14 a 24 anos amadurece, se tornará parte chave do volume total de cigarros vendidos no mínimo pelos próximos 25 anos".

Sabor que mascara

De olho em atrair o público jovem, uma das investidas da indústria foi o lançamento de cigarros flavorizados. Entre a turma mais jovem, muitos acreditam até que esse tipo de tabaco, por ter um gostinho de menta, canela ou cereja, por exemplo, é mais 'saudável' do que os outros. Para impedir que esse tipo de tabaco caia de vez nas graças da moçada, nos Estados Unidos, a nova lei de controle do tabaco, sancionada recentemente pelo presidente Barack Obama, tem medidas semelhantes às adotadas pelo Brasil há dez anos, mas avança ao proibir a venda do cigarro flavorizado.

No Brasil, a indústria investe pesado na promoção desse segmento nos pontos de venda. Uma pesquisa do INCA revela que de 13 mil jovens ouvidos em dez capitais brasileiras, 52% dos que fumam cigarros flavorizados apontaram o sabor como o principal motivo para a escolha de determinada marca. A justificativa é simples: o sabor adocicado melhora o gosto do cigarro e mascara seus efeitos irritantes e tóxicos. Mais um desafio para a saúde.

Boa notícia

Apesar do risco que o cigarro causa à saúde, há uma boa notícia relacionada ao tabagismo: o consumo de cigarros entre os jovens brasileiros caiu mais de 50% nos últimos 20 anos. De acordo com o estudo de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL), do Ministério da Saúde, em 2008, 14,8% dos jovens entre 18 e 24 anos tinham o hábito de fumar. Em 1989, esse percentual era de 29%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A pesquisa revela ainda que 10,8% de jovens nessa faixa etária já são ex-fumantes. Deborah Malta, coordenadora da área de doenças e agravos não transmissíveis do Ministério da Saúde, aponta que um dos fatores mais importantes no controle do tabagismo é evitar que adolescentes adquiram o hábito. "A adolescência é a época mais comum para a iniciação ao tabagismo, por isso é preciso estar atento e desenvolver políticas públicas para prevenir esse hábito precoce. Como já existem inúmeras leis antitabagistas e ações educativas, os jovens hoje são menos expostos que no passado e por isto têm fumado menos", afirma.

Os levantamentos indicam que existe uma tendência significativa de queda do consumo de tabaco em todas as faixas etárias. Em 1989, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição, 35% da população adulta no Brasil era fumante. Segundo o Vigitel, em 2008, esse índice caiu para 15,2%, sendo maior no sexo masculino (19,1%) do que no sexo feminino (11,9%). Apesar de o Brasil estar entre os países com menor incidência de tabagismo do mundo, o objetivo é reduzir esse número, em especial, entre adultos jovens e mulheres.

Atualizado em 6 Set 2011.