Guia da Semana

Foto: Stck.Xchng

Todo mundo sabe: a adolescência é uma montanha russa emocional... De madeira. O percurso é cheio de solavancos. Por isso, cada curva é vivida como se fosse a única, a última, a definitiva. Tudo parece que vai durar para sempre. Seremos feios e cheios de espinhas para sempre, rejeitados para sempre, incompreendidos para sempre, eufóricos para sempre, rebeldes (na maioria das vezes, sem causa) para sempre. Talvez por isso mesmo eu deteste os livros, canções, conversas e comerciais de TV cuja moral é "viva a vida ao máximo, como se fosse o último dia". Não dá. Nós todos já fazemos isso durante a adolescência e é difícil pra burro!

Mas passa. Já escrevi isso antes e repito: o melhor da adolescência é que ela passa. Aí, acaba indo para a memória de forma meio idealizada, deixando-nos saudosistas. Vamos combinar, a adolescência é um inferno. Mas, nas lembranças, fica tudo diluído. O que antes era motivo para chororô acaba virando motivo para dar risada. Maaas... Sobre isso tudo eu já falei.

O problema é que as pessoas parecem estar prolongando a adolescência. Não, não vou falar do pessoal de trinta e poucos que ainda mora na casa dos pais. Falo da gente que ainda age como se tudo fosse o fim do mundo e o melhor mesmo seria virar outra pessoa. Para arrombar o bolso dessa gente, existem os livros de auto-ajuda.

É curioso que esse gênero seja tão popular. Pra começar, o nome já é um paradoxo. Como pode ser auto-ajuda se, na verdade, você está seguindo os conselhos de outra pessoa? Numa pesquisa rápida, encontrei os seguintes títulos:

Seja líder de si mesmo , de Augusto Cury.
Ué, se você quer ser líder de si mesmo, a primeira lição é não comprar um livro para que alguém te ensine a melhor maneira de viver a SUA vida. O objetivo do autor não é vender mais livros? Se você virar líder de si mesmo, não vai mais precisar ler esse tipo de livro, certo? Obviamente, Augusto Cury não daria esse tiro no pé. Então, ele te dá um monte de dicas que só um ser humano perfeito obedeceria. Você não vai segui-las, vai se achar um fracassado e depois comprar outro livro. Simples assim. Não à toa ele também é autor de "Dez leis para ser feliz" (leis?? tá achando que é quem na noite, filho?).

Seja assertivo! Como conseguir mais autoconfiança e firmeza , de Vera Martins.
Aaah, se a vida fosse tão fácil... Você lê um livro e diz "ok, de hoje em diante morreu aquela pessoa tímida e insegura e nasceu uma nova, exatamente do jeitinho que o mercado de trabalho quer". Ora, a nossa personalidade é o que é, gente. Não é por que um livro mandou você ser assim ou assado que, do nada, você vai se transformar nessa pessoa. E por que todos deveriam ser assertivos? Pode ser muito divertido descobrir aquela pessoa quietinha, no canto dela, de ombros meios caídos. Como tímida assumida, garanto que o que muitos de nós precisamos é somente de alguém que dê o primeiro passo e venha descobrir nosso lado espirituoso.

Você decide como se sente: o poder da escolha emocional! , de Garyu Mcka e Don Dickmeyer.
Beleza! Então meu pai morre e eu DECIDO que não vou ficar triste. Em vez disso, vou contratar um stripper e chamar uns amiguinhos para beber cerveja em casa.

Vai dar certo , de Jael Coaracy.
O livro ensina como agir para atingir seus objetivos. Mas..... E se der errado? Às vezes, tudo desce ralo abaixo, mesmo você tendo feito tudo certo. E aí? Vai cortar os pulsos? Ou comprar outro livro de auto-ajuda?

O Vôo dos cisnes: como se tornar especial no mundo de iguais , de José Luis Tejon Megido.
Já sei. Aí, para ser diferente, você tem de ser seguro, determinado, iluminado... Enfim, um cisne e não um patinho. Engraçado, não é isso que pregam todos os outros livros do gênero? Ou seja: com essas dicas, vocês, autores de auto-ajuda, não estão almejando construir justamente uma sociedade de... Iguais? De pessoas que almejam ser as mesmas coisas?

Espelho, espelho meu, quem sou eu? , de Maria Salette, Wilma Rugeri e Eliana Ricco.
Ora, se você precisa de um livro para dizer quem você é, então a coisa tá braba. Pior: foi escrito por três pessoas. Três! Pelo jeito, isso deve ser mais rentável que montar um clube de investimentos.

Agora, suba a barra de rolagem e releia os títulos acima. Parece que a insegurança é um pecado. Você não pode se sentir fraco, não pode sentir medo, não tem o direito de fracassar. Que coisa doente! Não somos robôs. Cada vez mais penso que um leitor assíduo de auto-ajuda não é nem nunca será feliz - afinal, não apreendeu a melhor parte da adolescência, aquela que nos ensina que as falhas educam e que os maus momentos se tornam banais no futuro.

Olha, vou confessar: sou chata, pego no pé, me irrito fácil, sou mandona, perfeccionista, exigente, tímida, insegura, estressada, ansiosa. Imagine se eu fosse comprar um livro de auto-ajuda para cada um desses defeitos. Quem sabe a melhor forma de conviver com eles é só a gente. Por que aceitar os conselhos de alguém que não te conhece e escreveu para pessoas inseguras como se elas fossem todas iguais?

Ninguém tem o segredo para ficar rico, arranjar o homem dos sonhos, virar um ás na cama ou ser popular. A vida não é receita de bolo. Quando crescerem, leitores, lembrem-se da montanha russa que vivem hoje. O medo faz parte da diversão. Levantar as mãos também.

Quem é a colunista: Marjorie, uma paulistana tipicamente apressada.

O que faz: Estudante de jornalismo e repórter da revista Pais e Filhos.

Pecado gastronômico: Qualquer coisa com chocolate.

Melhor lugar do Brasil: A minha cama.
Fale com ela: [email protected]

Atualizado em 1 Dez 2011.