Guia da Semana

Guilherme Maranhão
Bárbara Heliodoro

Mesmo com 85 anos, o pique continua o mesmo. Além de ministrar palestras e realizar traduções, Bárbara Heliodora assiste a três peças por semana, sobre as quais escreve críticas verdadeiras e sem papas na língua. Conhecida pela sua acidez, se tornou a observadora mais polêmica do meio artístico nacional, acumulando inimigos declarados ao longo de sua carreira, como Marília Pêra e Gerald Thomas. Com quase 50 anos dedicados a analisar o que acontece no cenário cultural brasileiro, Bárbara bateu um papo com o Guia da Semana, onde fala abertamente sobre seus gostos e desgostos do teatro brasileiro.

Guia da Semana: Qual a sua opinião sobre o apelido "Terrível", pelo qual a senhora é chamada por alguns artistas?
Bárbara Heliodora: Cada um diz o que quer. Eu só tento ser objetiva. Esses apelidos não me incomodam nem um pouco. Eu não vou discutir com ninguém por causa disso, cada um tem a sua opinião.

Guia da Semana: Quais são os critérios que você costuma utlizar na hora de avaliar uma peça?
Bárbara: Tento ser objetiva, o mais isenta possível, levando em consideração a qualidade do texto e do espetáculo.

Guia da Semana: Como anda o teatro no Brasil? Ainda tem coisa boa?
Bárbara: Está lutando, com muitos problemas. Falta de dinheiro, principalmente. Com essa história de desconto de 50% para estudantes e idosos, a bilheteria sumiu. Eu acho que o teatro está sendo muito mal tratado.

Guia da Semana: Você é contra o desconto para estudantes?
Bárbara: Eu não sou contra, desde que o Governo reponha o direito. O que não pode é dar 50% de desconto e pronto. Então teria que compensar os 50% que o produtor não recebe.

Guia da Semana: O que acha das comédias stand-ups?
Bárbara: Eu não tenho ido. Eu acho que é uma coisa muito especial, mas o objetivo é outro, não é bem de teatro. Para fazer a comédia stand-up, é preciso um talento pessoal muito especial. Não é um ator seguindo o texto, mas o texto que é feito para uma pessoa, especificamente. Acho que é outra atividade, que pode ter a maior qualidade em si. Mas não é bem teatro, é outra coisa.

Guia da Semana: O que uma peça de teatro precisa ter para ser boa?
Bárbara: (Risos) É preciso ter uma coisa para dizer e ser bem entendida. Pode ser uma comédia, um drama, o que quiser... Mas deve levar ao público alguma coisa interessante e enriquecedora de algum modo.

Guia da Semana: Alguma coisa boa em cartaz?
Bárbara: Várias. Mas tem muita coisa ruim também. Eu acho que essa quantidade de peças brasileiras que estão sendo geradas é o caminho para os grandes talentos aparecerem. Eu indico Os Difamantes, Clandestinos e Traição.

Guia da Semana: Alguma montagem a surpreendeu em 2008?
Bárbara: Não foi um ano particularmente rico. Não houve uma grande revelação. Mas também tiveram coisas que funcionaram, como os musicais. Montar no Rio de Janeiro a A Noviça Rebelde é uma coisa importante, porque é um espetáculo lindo. Não acho que seja uma obra-prima, mas mostra ao público um trabalho muito bem feito e bonito, que mostra que nós temos a capacidade de fazer uma coisa assim. Isso eu acho fantástico. Outro exemplo é Os Produtores, do Falabella, que também fez temporada em São Paulo. Realmente é de cair o queixo você ver que o brasileiro já pode fazer uma montagem daquelas.

Guia da Semana: Pode citar uma decepção?
Bárbara: Muitas. Houve algumas que a gente esperava muita coisa e não funcionaram. Prefero não comentar. Não gosto de ficar falando de fracassos.

Guia da Semana: Quem a senhora considera um bom ator/atriz?
Bárbara: O Marco Nanine e o Pedro Paulo Rangel. O Selton Mello, que infelizmente abandonou o teatro. Entre os clássicos, o Sérgio Brito, Ítalo Rossi... tem muita gente boa. Das mulheres, a Fernanda Montenegro e a Marília Pêra. Outra que abandonou o teatro, mas é muito boa, é a Patrícia Pillar. Tem gente boa que aparece. É preciso ter disciplina para chegar lá tem, fazer uma carreira perseverando.

Guia da Semana: E na nova geração de atores?
Bárbara: Vários. Mas acho que endeusar logo que aparece não é bom.

Guia da Semana: Como é ter inimigos declarados como Marília Pêra e o Gerald Thomas?
Bárbara: A Marília não é inimiga declarada, nós nos damos muito bem. Ela falou algumas coisas de mim, mas na hora ela estava chateada. O Gerlald Thomas também já veio pedir perdão (risos). Eu não gosto de guardar ressentimento.

Guia da Semana: Você acha que as pessoas aceitam bem as suas críticas?
Bárbara: A maior parte sim. Encaram como uma crítica construtiva, mas é claro que tem alguém que sempre fica mais chateado. De um modo geral, o bom ator aceita bem. É preciso ler muito teatro, ver muito teatro e estudar muito teatro, ter bastante paciência e prestar atenção para ter um panorama grande de referenciais.

Guia da Semana: A senhora gostaria que sua vida fosse contada no teatro?
Bárbara: Não, absolutamente. Eu vi uma peça que foi uma brincadeira com o meu nome, Bárbara Não Lhe Adora, ótima por sinal, uma comédia muito engraçada, que fala sobre um critica, mas não tem nada de pessoal ao meu respeito. Mas uma peça sobre a minha vida não. Seria muito sem graça.

Guia da Semana: Qual a dica que a senhora daria para novos atores?
Bárbara: Preciso ter muita coragem e muita persistência. pois as circunstâncias estão muito difíceis. E as pessoas, de modo geral, não se dão conta de como é difícil fazer teatro. Como é difícil como arte e economicamente. É necessária uma vontade imensa. O problema para um novo crítico, por exemplo, é que essa falta de dinheiro está limitando o teatro, então não está havendo uma variedade de espetáculos. É uma pena, porque assim se vê menos coisas por aí, menos gêneros, menos tipos de teatro.

* A peça Os Produtores não está mais em cartaz.

Atualizado em 6 Set 2011.