Guia da Semana




Autor de diversas versões de sucessos do rock americano e mentor do gênero engraçadinho, Leo Jaime reinava absoluto nos anos 80. Goiano de nascimento e carioca de coração, o cantor, compositor e ator emplacou alguns dos maiores sucessos da década, que até hoje permanecem no imaginário popular, tais como Gatinha Manhosa, Conquistador Barato, A Fórmula do Amor e Rock da Cachorra.

De ícone de uma geração para o ostracismo, o artista não teve a mesma atenção da indústria fonográfica na década seguinte e acabou na geladeira da gravadora. Nesse meio-tempo, mostrou sua versatilidade em outras áreas, trabalhando no cinema, teatro, televisão e jornal, sem nunca ter abandonado completamente a música.

Hoje, aos 49 anos, ele já aposentou o topete e os óculos escuros. Ficaram a jaqueta de couro, o bom-humor e a irreverência. E agora, finalmente, após 18 anos, um álbum de canções inéditas: Interlúdio, que chega para provar que Leo não quer viver só de flashbacks. Confira o que ele tem a dizer sobre o novo trabalho nas linhas abaixo, em uma entrevista concedida exclusivamente ao Guia da Semana.

Guia da Semana: O que este álbum traz de novo?
Leo Jaime:
Depois de dezoito anos, precisava atualizar meu trabalho. Era como se na minha carteira de identidade estivesse com uma foto da adolescência. Tinha que mostrar que nunca parei de compor, que não dou as costas para o que já fiz, mas que continuei andando na mesma estrada, não fiquei parado. Esse disco é o melhor que já fiz. Se tivesse aquele lance de rádio tocar músicas novas, como foi no começo da minha carreira, teria várias faixas rolando.

Guia da Semana: Você pensou em músicas para agradar o seu público fiel no disco? Ou pretende reinventar seu repertório?
Leo:
Meu público é fiel e muito heterogêneo. E eu me reinvento, ao mesmo tempo em que me sinto coerente com o que fazia antes.

Guia da Semana: Defina o Interlúdio em uma frase.
Leo:
A música do entreato.

Guia da Semana: Como foi ficar 18 anos sem produzir um disco com músicas inéditas?
Leo:
Muito chato. É como escrever cartas e não ter para quem mandar. Comecei a testar as músicas no meu show "As novas, as velhas e as outras". Isso motivou a compor mais e também a escolher o repertório, dentro daquilo que sei que é novo, mas agrada ao meu público. Foi um farol que me guiou na noite escura.

Guia da Semana: Você se considera um músico completo agora, perto dos 50 anos?
Leo:
Sou um artista mais completo. Não necessariamente um músico. Defino-me como um criador e intérprete. São duas atividades diferentes e complementares. Sou feliz fazendo as duas. Quando canto as músicas que faço, estou no auge da minha realização pessoal. Porém, se atuo em um texto de outra pessoa, ou escrevo algo que tenha significado para alguém, também fico feliz. Preciso trabalhar para viver.

Guia da Semana: Quais foram as suas principais influências musicais?
Leo:
Ah! Tem muita gente. De Jamelão a Elvis, Presley ou Costello. Rita Lee, Raul Seixas e principalmente Erasmo Carlos, são fortes referências. Beatles, Stones, Lupicínio, Lamartine, Chico Buarque... Sei lá... Acho que sempre fui eclético. Adoro Chet Baker, Al Green, Sinatra...

Guia da Semana: O que o grupo João Penca e seus Miquinhos Amestrados representou para a sua carreira?
Leo:
Eu caí dessa árvore! Sem eles, eu nada seria! O Leandro (Verdeal) é meu parceiro desde que tinha dezoito anos. É a minha banda predileta no Brasil. Claro que ficou bem melhor quando eu saí! (risos). Acho que centralizava demais as coisas.



Guia da Semana: Qual foi a razão para que você deixasse a música de lado e optasse por outros caminhos, como a carreira de jornalista e ator?
Leo:
Em parte para dar vazão a outras potencialidades e não me acomodar no personagem popstar, que nunca me pareceu confortável. Quando penso em uma viagem rumo ao sucesso, sempre acabo me pegando sentado no banco de trás. Por um lado, é claro que quero (o sucesso), mas não consigo me focar nisso, como sei que algumas pessoas fazem. Sei lá, acho que prefiro pensar que estou fazendo o que gosto e sendo muito sincero com o meu público, mesmo que isso me afaste um pouco dos holofotes. Não sou viciado em sucesso, nem tão competitivo ou fissurado assim. E tenho prazer fazendo teatro, escrevendo... Me realizo de muitas formas. Lamentaria muito se não tivesse essas experiências.

Guia da Semana: Tem alguma coisa na sua carreira que, se pudesse voltar atrás, não faria?
Leo:
Muitas. E não vou enumerar. Cito uma: deixar que uma gravadora me mantivesse por anos na geladeira, sem tentar um novo contrato em outro lugar, gerar algum fato novo que me tirasse daquela situação chata de estar desempregado e sem poder procurar trabalho. Fiquei refém, mas hoje sei que se estivesse me mexendo, como fiz no meu comeback, teria saído daquela antes. Foi um bode, e quando a gente está de bode, pode não ter clareza ou força para encontrar a saída certa. Hoje é fácil falar...

Guia da Semana: Qual foi o grande marco musical na sua vida?
Leo:
Como músico, foi tocar para cem mil pessoas em um show só meu, em Belo Horizonte. Outra foi cantar com o Chico Buarque num especial dele. Entrevistei o Roberto Carlos, fui partner da Marília Pera em um musical... Enfim, fiz muitas coisas legais. Ah, fiz um gol no Maracanã, também (risos). Acho que o meu grande marco ainda vai chegar.

Guia da Semana: De onde você busca inspiração para as suas músicas?
Leo:
Do cotidiano. Dirigindo, tomando banho, cantarolando... Observando a vida e as pessoas.

Guia da Semana: Com a internet e a pirataria, o mercado fonográfico mudou muito em relação aos anos 80?
Leo:
Mudou muito. Piorou muito. Vamos ver se as coisas se ajeitam. Pirataria é uma merda!

Guia da Semana: Você colocou seu trabalho no MySpace. Foi difícil acompanhar essa evolução da indústria fonográfica?
Leo:
Não. De certa forma sempre me mantive na ponta. Por isso estou aqui, falando com você hoje. A percepção de que tenho um público grande foi dada pela internet. A indústria e a mídia se renderam ao fato de que minha popularidade sempre foi grande na net. Por isso voltei a gravar e excursionar pelo Brasil todo tocando em lugares grandes. De certa forma só pude confirmar isso na rede, usando as ferramentas que iam aparecendo.

Guia da Semana: Qual é o seu melhor disco?
Leo:
Interlúdio. Todo Amor e Sessão da Tarde também são ótimos.

Guia da Semana: Qual é a sua opinião sobre a atual safra do rock nacional? Você vê a identificação das bandas dos anos 80 com algumas de hoje?
Leo:
Tudo o que existe hoje é fruto e bebeu do que fizemos lá atrás. E o que fazíamos era fruto e bebemos naquilo que fizeram antes. Se bem que a minha geração profissionalizou a indústria de shows e o processo de produção como um todo. Nós meio que asfaltamos as estradas que todo mundo transita hoje em dia. Antes as coisas eram muito precárias. A ditadura e a reserva de mercado fizeram o Brasil ficar muito atrasado tecnologicamente, por muito tempo. A indústria do espetáculo ainda não é tão madura quanto pode vir a ser, mas evoluiu muito.

Guia da Semana: Podemos esperar novos álbuns seus?
Leo:
Não sei se aguento esperar mais dezoito anos! (risos)

Bate Bola

Musica: Someone to watch over me, de Ella Fitzgerald
Livro: Apanhador no campo de centeio, de J.D. Salinger
Um filme: Cantando na chuva (1951), de Stanley Donen e Gene Kelly.
Ídolo: Erasmo Carlos
Banda nacional: João Penca e seus Miquinhos Amestrados
Banda estrangeira: Beatles e Rolling Stones
Cantor: Chat baker
Cantora: Marisa Monte
Mania: Um monte
Virtude: Não sei
Um sonho de consumo: Casa própria
Pecado Gastronômico: Feijão tropeiro com torresmo.

Atualizado em 6 Set 2011.