Guia da Semana

Faz 52 anos que “O Planeta dos Macacos” invadiu as livrarias para se tornar um dos maiores clássicos da ficção científica de todos os tempos. Hoje, é difícil encontrar quem não conheça a história do astronauta que aterrissa num planeta onde macacos são civilizados e homens são escravos, mas é ainda mais difícil encontrar quem tenha lido o original de Pierre Boulle.

O livro, felizmente, acaba de ganhar uma nova e caprichada edição pela Aleph, enriquecida com uma entrevista do autor para a Cinefantastique sobre as adaptações cinematográficas, um artigo de Hugh Schofield para a BBC e um posfácio por Bráulio Tavares. O livro é curto e a leitura, gostosa e surpreendente.

Há várias diferenças entre o impresso e qualquer uma das oito adaptações e sequências que já chegaram aos cinemas. A mais gritante delas é o final, que não envolve a Estátua da Liberdade (é claro, o livro é francês) e carrega um significado mais metafórico - como, por exemplo, que algumas mudanças são inevitáveis, ou que as sociedades sempre serão opressoras, independente do lugar ou da espécie dominante.

Boulle começa sua obra com espírito romântico, apresentando um casal de viajantes espaciais a bordo de uma nave que lembra um barco a vela. Flutuando no vácuo, surge uma garrafa contendo o precioso relato de Ulysse –não um astronauta, mas um jornalista que acompanhava o sábio professor Antelle numa viagem intergaláctica. Daí sua habilidade de observação e registro.

Além da conhecida trama, fantástica e provocadora, o livro é permeado pela visão particular do autor, que difere daquela imagem heroica e maniqueísta de Hollywood. Por exemplo, fica claro que o protagonista se vê como colonizador e superior (como humano e como homem), exaltando os próprios feitos com arrogância e observando os macacos e os humanos do novo planeta com desdém.

Além disso, há uma alta dose de machismo no fato de que as duas únicas personagens femininas (uma macaca inteligente e uma humana selvagem) têm interesse amoroso pelo “herói”, ainda que o escritor tente combater essa visão mostrando como a chimpanzé, uma cientista que salva o protagonista, sofre preconceito dos próprios colegas de trabalho.

“O Planeta dos Macacos” já está nas livrarias e é uma experiência que complementa os filmes com uma perspectiva diferente, sem que seja necessário pensar nas adaptações como “boas” ou “ruins”. A ideia central, de que uma espécie poderia inverter os papéis e acabar com a vida como a conhecemos, continua dando arrepios e nos fazendo repensar nossa superioridade, assim como nas ficções sobre inteligência artificial. No final das contas, tentar enxergar o mundo pelos olhos de pessoas ou criaturas diferentes de nós é sempre uma boa lição.

Por Juliana Varella

Atualizado em 26 Mai 2015.