Guia da Semana

O esquecimento é um mecanismo natural e fundamental dos seres humanos. Esquecer é necessário para preservar os detalhes mais valiosos do nosso dia a dia e, além disso, seria enlouquecedor e energeticamente custoso demais para nossas cabeças reter todos os fragmentos que chegam à nossa percepção.

Quando o cérebro decide retirar ou editar lembranças sem nem mesmo pedir licença é uma defesa das mais primitivas que entra em ação para nos proteger muitas vezes da sobrecarga de informação ou de eventos traumáticos.

Mas o que aconteceria se tivéssemos um jeito de recuperar memórias há muito tempo apagadas, ou até mesmo um jeito implantar lembranças falsas?

Essa é a pergunta feita por Another Code: Recollection, que traz remakes de Another Code: Two Memories (Nintendo DS, 2005) e de sua sequência Another Code: R- A Journey Into Lost Memories (Nintendo Wii, 2009). Enquanto o primeiro título ficou conhecido como Trace Memory para o público americano, o segundo nunca desembarcou por aqui, ficando restrito a Japão e Europa. Contudo, a pergunta que vou tentar responder ao longo desta análise para o Pizza Fria é se vale a pena jogar Another Code: Recollection.

Another Code: Recollection – memórias póstumas de um remake

Another Code: Two Memories e Another Code: R – A Journey Into Lost Memories são aventuras narrativas cheias de quebra-cabeças contidos tanto em pequenos objetos quanto no grande cenário. A jogabilidade segue similar, transformando-as essencialmente num jogo de apontar e clicar, o famoso e hoje raro gênero point and click. Contudo, ambos se apresentavam de formas muito diferentes do que temos hoje em mãos.

Pra começar, Two Memories era essencialmente um jogo pensado para o Nintendo DS. Você entra na pele de Ashley Mizuki Robins, uma adolescente órfã que, prestes a fazer 14 anos, recebe uma carta de seu pai, Richard. Mas como, se ela se lembrava de perdê-lo num acidente de carro quando ainda era pequena? E é assim, intrigada apesar de reticente, que Ashley segue as instruções da carta, levando-a à ilha de Blood Edward, onde descobrirá os mistérios que permeiam o desaparecimento de seu pai e, quem sabe, da morte da sua mãe, Sayoko.

Visto de cima para baixo no DS, que já tinha aquele formato de livro de bolso, Two Memories aproveita a utilidade multifuncional da caneta stylus de forma inovadora, um convite interativo com o ambiente do jogo — desde girar objetos em busca de pistas até usar o microfone para soprar poeira virtual de artefatos antigos. A resolução de enigmas é algo sensorial, já que tocar a tela não só servia para a movimentação e exploração, mas também se integrava aos quebra-cabeças, de maneira tátil e intuitiva.

Another Code: Recollection
Em Another Code: Recollection, você vive a intensa história de Ashley na busca por esclarecer quem matou sua mãe. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Agora dentro de Another Code: Recollection para Nintendo Switch, Two Memories é o primeiro de dois volumes na história de Ashley. Para modernizá-lo e adaptá-lo, contudo, foram feitas mudanças e algumas concessões em relação ao original.

Uma vez que a motivação de jogar Another Code é a sua narrativa carregada de suspense e de mistérios, vou evitar me aprofundar demais na tentativa de preservar as surpresas.

Por isso, vou te apresentar tudo pela perspectiva inicial de Ashley, sem manipulações ou desembaraçar o novelo. Nossa protagonista nasce em 1991, filha de dois pesquisadores, Richard e Sayoko, que trabalhavam juntos nos laboratórios M.J. Sua mãe, Sayoko, é uma cientista excepcionalmente brilhante, estudando lembranças num projeto que avança rumo a criação de um aparato tecnológico batizado de Another.

A pesquisa tem uma causa nobre: Another auxilia na manipulação de lembranças reais e falsas para fins terapêuticos, em especial para melhora da saúde mental, como no caso de transtorno de estresse pós-traumático ou de outros transtornos mentais. Entretanto, sempre há interesses secundários – lucros, patentes e reconhecimento.

Another Code: Recollection
O corpo fala: as emoções estão estampadas na cara e, com a dublagem, viram um tempero maravilhoso para o enredo do título. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

No terceiro aniversário de Ashley, ela e a mãe passam o dia no lago Juliet, mas após voltarem, Sayoko é assassinada. Naquela noite fatídica, Richard não estava com elas. Quando o criminoso invadiu a casa, a pequena Ashley se escondeu no armário, infelizmente presenciando a cena terrível.

Pouco tempo depois, Richard decide que sua irmã, Jessica, deveria criar sua filha longe da família, algo que faz a pequena Ashley crescer acreditando que o pai morreu em um acidente de carro e imaginando como seriam seus pais se estivessem vivos, sem nunca desconfiar das histórias verdadeiras. Até que ela recebe a tal carta convite, na qual o pai sugere que vai explicar o porquê de se afastar e o que realmente aconteceu.

Partindo destes eventos incitantes, Another Code: Recollection amarra os dois jogos que se passam respectivamente em 2005 e 2007, sempre às vésperas do aniversário de Ashley.

Another Code: Recollection
Os diálogos ganham uma moldura de história em quadrinhos, colocando a expressividade em destaque. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Se em Two Memories você se propõe a relembrar o que aconteceu, em R – A Journey into Lost Memories novas lembranças virão à tona, revisitando o último lugar que Ashley visitou com sua mãe, o tal lago Juliet.

Ao se tratar de um jogo de Nintendo Wii, a jogabilidade deixava o toque de lado para favorecer os controles de movimentos e o ponteiro. A maneira de interagir mudou, mas sem perder a sensação de que éramos nós quem manipulava com gestos o ambiente. Os visuais também mudaram para um conceito próximo daquele que temos hoje, transformando a exploração em uma rotina deliciosamente peculiar.

O conto deste segundo volume desdobra ainda mais os acontecimentos de Two Memories, além de dar um desfecho pontual. Esta introdução do enredo serve para ilustrar que o estilo point and click vai quase na direção de uma visual novel com literatura juvenil de mistério. Ouvimos os pensamentos de Ashley ao longo de Another Code: Recollection, que refletem sua imaturidade, frustração e incertezas com sensibilidade.

Juntos, Another Code: Two Memories e Another Code: R – A Journey into Lost Memories constroem as fundações de Another Code: Recollection, trazendo uma história coesa e envolvente que acompanha o crescimento dos personagens; um elemento crucial é a interatividade envolvente que coloca o jogador na perspectiva de Ashley.

Another Code: Recollection

Another Code: Two Memories

Já adiantei a premissa para que Ashley viaje até a tal ilha Bloody Edward. Na abertura já dá pra sentir a atmosfera envolvente em que entraremos. Blood Edward hoje está abandonada, mas tem vestígios de um passado de esplendorosa riqueza: uma mansão e minas abandonadas.

Ao desembarcar na ilha, Ashley ainda está reticente sobre encontrar seu pai. Assim que sua tia demora a voltar de uma conversa, porém, ela se vê obrigada a procurá-los por conta própria.

Em pouco tempo, ela se dá conta que há charadas deixadas pelo percurso e se sente observada. O primeiro desafio é atravessar um rio. A ponte velha está lá aos pedaços e você deve olhar com atenção ao seu redor para encontrar, quem sabe, uma tábua firme o suficiente para uma travessia.

Another Code: Recollection
O primeiro arco é o remake de “Two Memories”, no qual Ashley deve despertar tanto suas lembranças quanto as do menino fantasma D. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Os bilhetes espalhados, os túmulos, as partituras ao piano… todos são fontes de pistas para seguir adiante e abrir uma outra sala, para revelar mais sobre o passado e virar uma página nova. Aos poucos, Ashley começa a duvidar das lembranças que tem de seu pai. Ela nota que alguns detalhes estão embaçados…

E se sentindo assim, solitária e cheia de dúvidas, conhece o fantasma de um menino ainda no começo da busca, a quem apelida de D. Tudo que ele se lembra é do fato de ter morrido na ilha e da certeza de que seu corpo não está enterrado em sua tumba. Assim, a relação entre os dois é central à história, já que visitamos os aposentos da mansão investigando objetos que podem ser gatilhos para reativar lembranças enterradas.

Another Code: Recollection
Os enigmas não têm mais a sensação tátil do Nintendo DS, apagando um pouco da magia do game. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

O ritmo da história, a química e a escrita entre Ashley e D foram os elementos que me chamaram atenção em Another Code: Recollection (sim, incluindo o segundo volume). Me lembrava muito pouco do jogo no DS e a dublagem em inglês está excelente, carregada de peso emocional, mesmo que soe repetitiva às vezes nas falas fora de cenas. Infelizmente, a coletânea não conta com tradução (muito menos dublagem) ao português do Brasil (vamos falar brasileiro?).

É uma pena que não tenhamos nem mesmo texto traduzido, afinal trata-se de um jogo específico que requer muita atenção a detalhes, sejam eles lidos nas cartas, nos bilhetes, ou ouvidos nos diálogos e pensamentos perdidos.

Os quebra-cabeças lembram os primeiros jogos Resident Evil, mas sem os zumbis. A mansão é repleta de engrenagens, grifos no solo que indicam a ordem de certas ações, um pátio tem uma fonte com a rosa dos ventos e um zodíaco… Você sabe que falta algo no quarto do mordomo que estimava muito o jogo de jantar de prata? Quem sabe seja hora de procurar os pratos que faltam e decifrar como ordená-los.

Another Code: Recollection
Two Memories se passa quase todo dentro de uma mansão na abandonada ilha de Blood Edward. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

De fora a fora em Another Code: Recollection, os fios que você puxar vão revelar novas pontas. Não se preocupe: até o final dos dois volumes, tudo se resolve.

E os enigmas perderam um pouco em relação ao Nintendo DS, pois parece que ter somente o controle convencional nos distancia daquela sensação de colocar a mão na massa, de desenhar na tela de toque, de resolver “mexendo”. E se engana que a coleção aproveita os Joy-Cons ou a tela sensível do Nintendo Switch: você vai resolver a maioria dos quebra-cabeças com o analógico e apertando botões, sem mais. Vez ou outra inclinamos o controle com seu giroscópio, entretanto, não passa disso.

Ainda assim, Another Code: Recollection reformula a jogabilidade para quem precisar de assistências. A principal delas é a opção que desenha uma bússola ao redor de Ashley e indica a direção do próximo objetivo da história, além de dar pistas nos enigmas. Outras configurações incluem sensibilidade dos analógicos e, por amor próprio, aumente a velocidade de giro da câmera assim que começar o jogo.

Another Code: Recollection
Ashley ganha de seu pai o DAS, um dispositivo fruto da pesquisa com memória capaz de manipular lembranças. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

O game ganhou uma nova e excelente dublagem tanto em japonês quanto em inglês, enriquecendo o elenco. Os diálogos são um ponto fortíssimo de Another Code: Recollection, já que são responsáveis por trazer emoção e dão camadas de interpretação a quem estiver no controle.

A história de Ashley, especialmente neste primeiro volume, é absorvente e provocativa, prendendo o jogador e desvendando paulatinamente os acontecimentos daquela mansão ao longo de três gerações. O remake ainda repaginou o aparelho que auxilia a protagonista – o DAS agora lembra um Nintendo Switch, não mais um DS. As funções de palmtop “evoluíram” para aquelas de um smartphone.

Este DAS tem o poder de desbloquear memórias e fica vinculado ao usuário pelo seu código genético, assim apenas uma pessoa pode usá-lo. O dispositivo será útil para solucionar enigmas, como, por exemplo, abrir a câmera para fotografar a partitura que se vê em um quadro para logo sobrepô-la com a partitura sobre o piano.

Another Code: Recollection
Ligado ao usuário pelo código genético, o DAS também tem funções como, por exemplo, de câmera. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Além de mostrar o objetivo, ele também serve como registro do perfil daquilo que Ashley sabe ou pensa sobre cada personagem conhecido, incluindo árvore genealógica e linhas de relações entre as pessoas. Outra melhoria foi a adição do log de conversas, assim o jogador relê o que passou caso ache que perdeu algum detalhe. Até chegar ao fim, o arco de Two Memories dura cerca de umas sete horas muito tensas e atentas.

Os visuais deste jogo estão atualizados de tal maneira que é maravilhoso ver os personagens sob um forte filtro cel shading, parecendo que saíram de um anime. A estética, associada à dublagem, conecta muito bem a narrativa entre jogo e cenas, acertando em cheio o ritmo perfeito para criar suspense.

Por outro lado, quando falamos do ambiente da ilha Blood Edward, composta por um cenário à beira-mar, uma breve trilha pela natureza e a mansão abandonada, a coisa muda de figura.

Another Code: Recollection
Escolha o rumo das conversas para saber mais sobre um tema (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

As esculturas tridimensionais não fazem jus aos personagens, parecem um arranjo artificial tanto na rudimentar contagem de polígonos quanto na precária texturização. Certamente o Switch aguentaria mais, é difícil entender a discrepância entre personagens e ambientação.

Se desconsiderarmos que este mundo foi modelado para Another Code: Recollection, é plausível imaginar que houve um projeto para levar Two Memories ao Wii que ficou engavetado por muito tempo. Borradas, às vezes esticadas, as texturas mundanas destoam bastante do preenchimento suavizado e cartunesco de Ashley e coadjuvantes.

Contudo, a apresentação geral é salva por menus responsivos e pela história contada por cenas capazes de criar molduras, como aquelas de histórias em quadrinhos, compondo com sabedoria retratos do elenco falante. Esta escolha de “storytelling” é a cola que prende o jogador à motivação em solucionar todos os mistérios. Assim, reforço que a narrativa instigante é o brilho destes games.

Another Code: Recollection
Err… O que aconteceu na hora de texturizar os cenários? (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Another Code: R – A Journey into Lost Memories

Depois dos sucessos com finais distintos em Two Memories, Mal sabia Ashley que mais memórias adormecidas voltariam quatro anos mais tarde, em R – A Journey into Lost Memories (2009). No Wii, o título era visualmente diferente de seu antecessor para DS, já mais próximo da duologia que vemos no Switch.

Ao mudar a apresentação visual, a estrutura seria a fundação de Another Code: Recollection: exploração em um espaço tridimensional, verificar todos os itens e detalhes que saltam à vista para avançar. Neste remake/remaster, a colcha de retalhos sensoriais de Two Memories segue igual em R – A Journey into Lost Memories. Logo, gráficos, som, apresentação das cutscenes e jogabilidade são engrenagens de um conjunto coerente nos dois “volumes”.

O que muda aqui é como a história se desenvolve. Desta vez temos um arco maior, passando das 7 para umas 10 horas de resoluções. Se lá em cima contei que Ashley havia passeado no lago Juliet com sua mãe no mesmo dia em que a perdeu, no seu terceiro aniversário, agora, a adolescente revisita por primeira vez o local a pedido de um ente querido. O que ela não imaginava era que voltar ao lago traria mais lembranças reprimidas à superfície.

Another Code: Recollection
Another Code: Recollection não conta com português nem brasileiro. Uma pena para um jogo centrado em seu enredo. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

A passagem de tempo entre um game e outro é de apenas dois anos. Sem perder o carisma, Ashley está mais madura, uma adolescente mais questionadora e com os dilemas próprios do crescimento e autodescoberta. Para desenvolver o novo episódio, a escrita segue excelente, sabendo absorver os conflitos intra e interpessoais de todos os envolvidos.

Aliás, há mais envolvidos no lago Juliet que na ilha de Blood Edward. Muitos mais! A sequência conta com um elenco diverso, colegas e ex-colegas de laboratório dos pais dela. Outros personagens que estão apenas de passagem e acabam enriquecendo a visita.

Another Code: Recollection
O segundo arco, R- A Journey Into Lost Memories, se passa dois anos depois e traz situações que interagem melhor com os arredores. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Outro ponto que merece contraste é como as situações trazem quebra-cabeças mais “orgânicos”. Com isso, eu não quero dizer que você vai encontrar uma caixinha de música e deve encontrar a combinação secreta de alguns botões para abri-la, não. Quero dizer que você vai resolver quebra-cabeças, sem transformar o jogo em ação, que pertencem naturalmente ao nosso redor. Talvez você se depare preso em uma sala porque a porta bateu – a solução está em observar atentamente as suas possibilidades de saída.

As fotografias tomadas com o DAS também ganham mais importância, por isso R – A Journey into Lost Memories passa uma sensação mais moderna, já que parece exigir do dispositivo um uso como o que fazemos de um smartphone hoje em dia. Um objeto curioso ou fora de lugar? Tire uma foto. Pegadas de barro suspeitas? Tire uma foto, pode vir a calhar no futuro. Quem sabe até provar sua inocência.

Another Code: Recollection
No lago Juliet, Ashley encontrará mais personagens e descobrirá o que realmente aconteceu com sua mãe. (Imagem: Reprodução, Nintendo Switch na doca)

Mesmo com a valiosa adição de personagens e o refinamento de mecânicas, a trama é boa sem estar à altura da primeira parte. Passa, sim, um pouco da sensação que alguém pensou, “vamos reaproveitar este apanhado de ideias legais numa narrativa sobre como funciona a memória e esticar a história”. Assim, o elemento da prosa perde peso aqui, ao passo que equilibra a experiência em outros fatores.

Para evitar spoilers, tanto do primeiro arco quanto do segundo, a visita de Ashley ao lago gera gatilhos e traz personagens que também estiveram envolvidos com a morte de sua mãe, e estes teriam obrigado seu pai tomar as “difíceis” decisões posteriores. Soa que estica um pouco? Estica mesmo, porém, apesar de perder um pouco de pressão, a confecção cuidadosa mistérios e de instigas continua.

Vale a pena jogar Another Code: Recollection?

Another Code: Recollection relembra dois jogos de enredo intenso que tiravam proveito dos recursos peculiares de Nintendo DS e de Nintendo Wii. Se jogar Two Memories era como carregar um livro de bolso de mistérios e manusear artefatos, jogar R – A Journey Into Lost Memories era como mexer o corpo num acampamento. Vindo de uma época um fio de cabelo antes de smartphones, a imaginação das capacidades do DAS parece ser profética e valorizam a exploração ambiental – a diferença é que não estamos envolvidos com nossos celulares em nenhuma conspiração de laboratório.

O enredo mirava num público de idade próxima àquela de Ashley, algo fácil de perceber graças à ótima escrita dos dois volumes. Entretanto, por mais que ela seja reticente às vezes, a energia da adolescência à flor da pele não vira uma chatice, pelo contrário: a garota é carismática e estamos, no papel de jogador, ouvindo seus pensamentos, as considerações que ela faz sobre as pessoas, suas dúvidas. Por isso, não sei se isso faz muito sentido pra você, mas ela é uma caricatura de humanidade, uma ótima protagonista que serve de receptáculo para quem está imerso no controle.

É difícil de entender por que a Nintendo escolheu reviver os jogos cults da finada Cing, especialmente sem aproveitar mais as funcionalidades do Switch ou buscar visuais ainda mais refinados, coerentes com o console. As melhorias vieram na forma de assistências que garantirão o progresso pela jornada, mas deixar o jogo sem tradução ao português pode fazer pouquíssimo sentido para muita gente no Brasil.

Assim, com um projeto incongruente, o título é especial para quem gosta muito do estilo ou para quem gostaria de revisitá-lo (e aproveitar para ter desfecho, pois a continuação ficou restrita a Europa e Japão). Tudo que permeia a escrita, a trama e o elenco é maravilhosamente bem-feito, ainda que algo anacrônico ou surreal demais. Another Code: Recollection cumpre seu principal papel de apresentar um mistério, ao mesmo tempo, convidar seu público a vivê-lo e resolvê-lo. Minha recomendação seria baixar a versão de demonstração para sentir um gostinho e saber se é pra você.

*Review elaborada com código fornecido pela Nintendo.

Pizza Fria

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Por Carlos Maestre, Pizza Fria

Atualizado em 17 Mar 2024.