Guia da Semana

Quando a empresária de 30 anos Andréa Schwarz, paraplégica desde os 22, decidiu visitar um restaurante em Brasília, teve uma surpresa um tanto indigesta. O garçom, que se aproximava para anotar os pedidos, dirigiu-se ao seu então namorado e perguntou: "o que ela vai querer?". Jaques Haber, hoje marido de Andréa, respondeu prontamente: "ela fala. Pode perguntar para ela".

Constrangimentos como este, provocados pela falta de informação e de treinamento de pessoal, tornaram-se comuns na vida do casal no período que se seguiu à descoberta da deficiência física. "Sempre gostei de me divertir, de ir a restaurantes e não ia deixar de fazer por conta da deficiência. Sei até que alguns estabelecimentos que eu freqüentava antes acabaram se adaptando por minha causa. Acredito que o papel do deficiente também é de transformação", afirma Andréa, que soube muito bem como cumprir seu papel. No final de 2001, cansada de ter que sempre ligar nos lugares antes de decidir onde sair, ela e o marido criaram o Guia São Paulo Adaptada, um roteiro com a descrição detalhada sobre o acesso em cada tipo de restaurante, cinema, casa noturna ou outros locais de diversão.

"Felizmente, de cinco anos para cá, muita coisa mudou. Hoje, o mercado de trabalho se abriu e o deficiente é um consumidor em potencial. Por isso, é vantagem para os estabelecimento se adaptarem", afirma a empresária. A Lei de Cotas, aprovada há oito anos, ainda é polêmica, pois garante uma porcentagem de vagas nas empresas dedicadas aos deficientes físicos. No entanto, os resultados da lei e da re-inserção de pessoas com dificuldades de locomoção, visão ou adição é visível e positivo: hoje, é notória a quantidade cada vez mais de deficientes nas ruas das cidades e também em locais de diversão. "Acredito que os deficientes estão passando pelo mesmo movimento de inclusão que as mulheres tiveram há alguns anos. Agora, estão entrando no mercado de trabalho, mostrando seu potencial, e não estão mais esperando que o mundo se adapte para sair de casa", opina Andréa.

Para todos
O pequeno símbolo com uma cadeira de rodas indica, na maioria dos guias e roteiros culturais brasileiros, o acesso a deficientes físicos. Mas será que todos os estabelecimentos que se vangloriam da marquinha estão mesmo aptos a usá-lo? "Para ter aquele símbolo, o lugar tem que ter rampas com a ingrimidade correta, sanitário adaptado, mesa na altura certa para encaixar a cadeira de rodas e principalmente funcionários treinados. O que se vê em algumas casas é apenas um desses itens atendidos", explica a empresária.

Ter um banheiro adequado não significa ser totalmente acessível - o que, aliás, é praticamente inexistente. A terapeuta ocupacional da seção de Adultos da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) Léa Regina Rizzo conhece restaurantes paulistanos que até possuem uma mesa adequada para o encaixe da cadeira de rodas. Mas como apenas uma delas é adaptada, se mais de um cadeirante quiser jantar na casa, o outro será obrigado a comer mais rápido e sair? "Acho isso um absurdo. Também sempre vejo vaga em estacionamentos para deficiente. Mas também já notou que sempre tem um cone segurando a vaga? Como é que o deficiente vai descer do carro para tirar o cone?", questiona Léa.

Banheiro da Mercearia do Francês,
em São Paulo: adaptado
Para ela, a falta de conhecimento sobre as normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) é um dos fatores que atrapalham não apenas as pessoas com deficiência, mas também a população em geral. "Falo sempre que precisamos do acesso universal: tudo tem que estar adaptado para que qualquer pessoa, seja um velhinho, uma mãe com um filho no colo e até uma pessoa cheia de compras possa usar", afirma a terapeuta. E nesse quesito, a maior cidade do país, São Paulo, deixa muito a desejar. "Quem potencializa nossa deficiência é a maior metrópole do país. Para viver aqui, tem que se preparar e enfrentar, porque ela ainda não está preparada para a gente. Infelizmente, mas para viver é preciso enfrentar", conclui Andréa Schwarz, que já se prepara para escrever o Guia Brasil Adaptado.

Eficientes

A terapeuta ocupacional Léa Regina Rizo fala sobre o que é preciso para os restaurantes terem acesso universal

  • Portas de entrada largas, para facilitar o acesso de cadeirantes.
  • Maçanetas retas, que possam ser puxadas pelo braço ou cotovelo. As de girar, mais comuns, dificultam a vida de quem não tem movimento nas mãos.
  • Banheiros com barras, mas grandes: não adianta adaptar o sanitário, sem ter espaço para que um cadeirante possa se mover lá dentro.
  • Mesas com uma altura de 70 a 75 cm, para a cadeira de rodas possa se encaixar com o braço. O importante é o restaurante ter todas as mesas altas e não apenas uma.
  • Distância entre as mesas, para o deficiente possa transitar com tranqüilidade.
  • Rampas de acesso, que favoreçam a entrada de cadeira de rodas. Caso a fachada do local não permita a colocação de uma rampa, é necessária a existência de um elevador que faça o mesmo transporte.
  • Cardápios também em braile, para que o deficiente visual possa fazer seu pedido sozinho.
  • Veja as medidas corretas do mobiliário de acesso aos deficientes físicos no site www.mj.gov.br/sedh/ct/corde/dpdh/corde/normas_abnt.asp


  • Merecedores do símbolo da cadeirinha

  • Outback Steakhouse: a rede de lanchonetes australiana, presente em algumas cidades brasileiras, é um dos locais que o deficiente físico pode ir sem preocupações. "As cadeiras americanas são acessíveis. Essa é uma casa bem adaptada", diz Andréa.
    Avenida Rebouças, 3970, Shopping Eldorado - São Paulo
    Fone: (11) 3814-5592
    www.outback.com.br

  • Ráscal Pizza&Cozinha: essa rede de pizzarias e cozinha rápida também é sempre visitada por Andréa. "Indico, pois os banheiros e o espaço é acessível".
    Avenida Higienópolis, 618, Shopping Pátio Higienópolis - São Paulo
    Fone: (11) 3823-2667
    www.rascal.com.br

  • Grupo Rubaiyat: as casas Baby Beef e A Figueira são exemplos de acessibilidade a deficientes segundo Andréa. "Pode ir sem dúvidas".
    Rua Haddock Lobo, 1738 - São Paulo
    Fone: (11) 3063-3888

  • Ecco: esse badalado restaurante paulistano também está na lista top de restaurantes adequados a deficientes físicos.
    Rua Amauri, 244, Itaim Bibi - São Paulo
    Fone: (11) 3079-2299

  • Nakombi: é um dos poucos restaurantes de São Paulo a fazer uma versão em braile do cardápio. "A gente fala mais sobre a questão dos deficientes físicos porque simplesmente não existem lugares adaptados a deficientes visuais. Queríamos fazer uma seção especifica para eles no Guia SP Adaptada, mas não tinha praticamente nenhum estabelecimento adaptado a eles.
    Rua Pequetita, 170, Vila Olímpia - São Paulo
    Fone: (11) 3845-9911

  • Curitiba: é a única cidade, na opinião de Andréa e Jaques, que chega mais próxima da perfeição na questão de acessibilidade para deficientes físicos.

  • Bistrôs?: restaurantes pequenos realmente não foram feitos para deficientes físicos transitarem. Os bistrôs, pelo seu próprio conceito, é um lugar aconchegante e geralmente de tamanho reduzido, o que dificulta a entrada e a permanência de deficientes no local. "Acho que não é preciso deixar de ir a qualquer lugar. Mas em bistrôs só vou porque meu marido ou meus amigos estão juntos e podem me carregar", diz Andréa.

    Saiba mais:

    AACD
    Av. Prof. Ascendino Reis, 724, Vila Clementino - São Paulo
    Fone: (11) 5578-0777
    www.aacd.org.br

    Comitê Brasileiro de Acessibilidade
    Eles são os responsáveis, em parceira com a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) por todas as normas que não só o restaurante, mas as edificações em geral, os veículos e as vias públicas têm que seguir para o mundo se tornar acessível a todos. Confira todas as regras no site: www.mj.gov.br/sedh/ct/corde/dpdh/corde/normas_abnt.asp

    Guia São Paulo Adaptada
    Contém informações sobre todos os estabelecimentos da cidade de São Paulo que podem se vangloriar do símbolo de acesso a deficientes físicos. O roteiro, no entanto, não tem o intuito de indicar cinemas, restaurantes ou casas noturnas por suas qualidades como tal, mas apenas de informar quais características de acessibilidade cada um deles possui.
    Nome: Guia São Paulo Adaptada
    Autores: Andréa Schwarz e Jaques Haber
    Editora: O Nome da Rosa
    Ano de lançamento: 2001
    Preço sugerido: R$ 10,00
    Número de páginas: 360
    ISBN: 85-86872-20-2
    www.nomedarosa.com.br

    I.Social
    Empresa de Andréa Schwartz e Jaques Haber que presta consultoria a empresas que queriam se tornar acessíveis ao deficiente físico.
    www.isocial.com.br
  • Atualizado em 7 Ago 2012.