Guia da Semana

Por Bruno Lofreta


Em 1981, Ella Fitzgerald voltou ao estúdio para gravar seu segundo álbum dedicado exclusivamente a um compositor. Nove anos após o lançamento de Ella Loves Cole, em homenagem a Cole Porter, a primeira dama do jazz esbanjou seus inconfundíveis scats em clássicos da bossa nova como Inútil Paisagem, Samba de Uma Nota Só e Água de Beber. Em Ella Abraça Jobim, a diva que encantou o mundo com A-Tisket a-Tasket, no final da década de 30, inclina-se à genialidade de Antonio Carlos Jobim, interpretando algumas de suas composições mais famosas.

Embora a obra de Tom Jobim esteja profundamente atrelada à bossa nova, seus ecos se fazem ouvir em searas musicais distintas. A aceitação de suas composições tornou-se uma realidade entre os jazzistas americanos já nos anos 60. As preciosidades do carioca da Tijuca, que por pouco não seguiu a carreira de arquiteto, têm sido reverenciadas por mestres do jazz há décadas. Miles Davis e Gil Evans, dois titãs do gênero, percorreram as suaves nuances de Corcovado no álbum Quiet Nights, de 1963, enquanto o trompetista Dizzy Gillespie, um dos expoentes do bep bop, incrementou sua versão de Chega de Saudade com arranjos tipicamente latinos. A lista infindável conta ainda com a levada cool de Chet Baker em Retrato em Preto e Branco, o lendário piano de Oscar Peterson em Wave e o saxofone envolvente de Coleman Hawkins na bela interpretação de Desafindo, entre outros tantos mitos do jazz que abraçaram o repertório jobiniano.

A fina flor de Jobim

Stone Flower: jazz e bossa nova

O final da década de 60 marcou um período de intensa repressão aos músicos taxados como subversivos pelo governo militar. A despeito de não ser forçado ao exílio, Jobim chegou a ser detido após participar do boicote coletivo ao Festival Internacional da Canção de 1971, episódio que contribui para seu retorno aos Estados Unidos, onde passou longas temporadas. Nesse intermédio, Jobim gravou uma de suas maiores obras primas: o clássico esquecido Stone Flower. Com arranjos e regência de Eumir Deodato, o disco, lançado em 1970, contém um elenco musical invejável que inclui os percussionistas Airto Moreira e Everaldo Ferreira, o trombonista Urbie Green e a lenda do contra-baixo acústico Ron Carter.

Stone Flower prima pela harmonia entre os arranjos jazzísticos e a influência da música brasileira, resultando versões de rara beleza como God and the Devil in the Land of the Sun, Sabiá e Brazil. Dentre as inéditas, Thereza My Love, Stone Flower, Andorinha e Choro corroboram a grandiosidade da música de Jobim, que floresce indistintamente da roupagem que lhe oferecem.

Parcerias e homenagens

Sentado em um barzinho de Ipanema, em meados dos anos 60, Tom recebe uma ligação inusitada: é Frank Sinatra lhe convidando para participar da gravação de um álbum em Los Angeles. Sucesso entre a imprensa americana, Albert Francis Sinatra & Antonio Carlos Jobim alcança o posto de segundo disco mais vendido no ano de 1967, ficando atrás apenas dos Beatles e seu Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band. A dupla imortalizou clássicos da bossa nova, como Garota de Ipanema, Insensatez e standards jazzísticos como Change Partners e Concentrate on You, no álbum que foi eleito o melhor do ano pela crítica especializada.

Tributo no disco Friends

Em setembro de 1993, o extinto Free Jazz Festival reuniu um time composto por Shirley Horn, Herbie Hancock, Jon Hendricks, Gonzalo Rubalcaba, Joe Henderson e Ron Carter para prestar uma homenagem a Tom Jobim. Friends, disco originário dessa apresentação, que contém hinos da bossa nova como Ela é Carioca, Caminhos Cruzados e Triste, é apenas um dos inúmeros tributos recebidos por Jobim, que mesmo após sua morte, em 1994, tem seu trabalho reconhecido com uma das maiores contribuições para música do século XX. Nada mais justo para quem um dia flertou com a engenharia e a arquitetura ver sua obra, erigida com tanta fineza e dedicação, ser constantemente restaurada pelas novas e velhas gerações.

Fotos: site www.jobim.com.br / Divulgação

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Atualizado em 6 Set 2011.