Guia da Semana



A gente consegue viver sem carro. Um ponto de ônibus perto de casa ou uma bicicleta na garagem já resolvem. A gente consegue viver sem celular, sem e-mail e sem ir ao shopping. Também dá para viver sem televisão, sem saber que fim levou a mocinha da novela. O ser humano é forte, tira de letra a ausência de algumas coisas que ele mesmo criou.

Mas ainda está para chegar o dia em que a gente vai conseguir viver sem música. Não dá. Agora, por exemplo, um fone faz companhia aos meus ouvidos. Desligando o rádio, desligo também as possibilidades de combinar palavras. Desligo a mim mesmo.

Música é o nosso play.

Outro dia, a moça da academia se apressava em avisar aos alunos que não haveria aula de bike e de ioga. Motivo? O rádio estava quebrado. A falta de música não é nada saudável.

O trânsito pode ser caótico, pode ser aquático, com ruas e avenidas alagadas. Mesmo assim, lá estão os valentes motoristas em suas arcas 1.0 enfrentando a cidade. Mas basta o rádio do carro quebrar que eles correm para a oficina. Vale tudo, menos trânsito sem música.

Em visita a uma leiteria no interior de São Paulo, o agricultor me confessou: "as vacas daqui só dão leite quando o rádio tá ligado. Se não tem música, não tem leite." Sei que é difícil acreditar nisso, mas fui testemunha. Ele tirou o rádio da tomada, e a vaca, num gesto de protesto, entrou em greve.

O que seria do cinema sem música? "Não seria". A gente dependeria de gênios como Chaplin para contar uma história sem usar som, e ainda assim precisaríamos da música para a projeção. Nos filmes de Hitchcock, as facas não assustariam tanto. Woody Allen e George Gershwin nunca trabalhariam juntos.

Tudo bem que políticos corruptos não ganhariam a eleição com seus jingles irritantes, mas isso é apenas uma sardinha dentro de um oceano de vantagens.

Nada pessoal contra o silêncio, mas sem música não dá para viver.

Leia as colunas anteriorwa de Pedro Cavalcanti:

Ali, no interior

O rádio que queremos ouvir

Hamilton e Yamandu

Quem é o colunista: Pedro Cavalcanti.

O que faz: Publicitário.

Pecado gastronômico: Qualquer prato preparado pela minha avó.

Melhor lugar do Mundo: Aqui e agora, como diria o Gil.

O que está ouvindo no carro, iPod, mp3: Ulisses Rocha, Pat Metheny, Chico Saraiva

Fale com ele: [email protected]

Atualizado em 6 Set 2011.