Guia da Semana

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Desde pequeno você ensinou muito para muita gente. No começo o povo achou bonitinho você pequeno, cantando o alfabeto, um, dois, três. Você com aquele chapelão rosa. Mas aí percebemos que tinha mais do que um rostinho ali. Dança, afinação, um swing na voz, aquela cara, aquele jeito de gente (muito) grande. Então, não tinha mais volta: a gente já tinha percebido que você seria (afinal, você já era!) o cara! E, desde então, a gente só se divertiu e aprendeu com você!

Você nos ensinou que a gravidade pode ser desafiada. Que a gente pode andar para frente, mesmo andando para trás. Que a gente não pode parar até chegar aonde nós queremos, mesmo que seja em algo inatingível, impensado - como ensinar defuntos a dançar. Até a eles você ensinou. E ensinou a gente, também, como não? Aprendemos que não importa se uma mulher vai dizer que o filho é nosso, mesmo que a gente negue.

Sabe o que eu achei um barato, também, nessa época? Quando tinha aquela galera se pegando, e você mandou todo mundo cair fora, apartando a briga e tirando o povo pra dançar. Além disso, aprendemos que nós somos o mundo, somos as crianças.

Depois disso, você mudou um pouco. Fisicamente, de atitude. Mas não tem problema. Ficou malvado, lutou contra gângsteres, contra as drogas, contra polêmicas, fofocas, pessoas pequenas - luta essa que você levaria até o último de seus dias. Ensinou que não importa se a gente é negro ou branco, o que importa é quem você é por baixo disso tudo. Descobrimos que somos capazes de curar o mundo ajudando as pessoas. Você ainda falou, nessa época, sobre um amigo seu que "foi tão cedo"... Assim como você.

Depois você fez história. Na verdade já tinha feito, só que muita gente relutava em concordar. Aí você me disse que eu não estava sozinho, que você estava ali comigo. E em dois volumes! Você viajou para o Brasil, mas eu não tive chance de te ver de perto. Uma pena. Mas eu vi, você, sim. Durante todo esse tempo. Decorei a hora em que você virava robô, em que você entrava no clube e dançava com todo mundo, girava sobre seu próprio eixo, quebrava todos os vidros do lugar e terminava dando tiro para todos os lados.

Depois, você ainda fez coisas fantásticas, como sempre. Derramou sangue na pista de dança, em ritmo de flamenco pop funk soul. Dançou com outros monstros, com uns fantasmas, que depois até os garotos da rua de trás te copiaram... Aí você ficou invencível, como a gente sempre soube que você foi. Com a capa em cinco cores diferentes! Mas você já estava mais distante. A gente quase não te via. Mas não faz mal, a gente estava sempre do seu lado, o tempo todo.

Acho que a última coisa que você contou pra gente foi que você queria mais uma chance. Você disse que era no amor, mas a gente sabe que era mais uma chance de mostrar quem você é. De dançar com a gente, de dar um tchauzinho pra gente.

Já falaram muita coisa ruim de você, é verdade. Mas não quero ficar lembrando disso, não. Claro que você errou, mas a gente sabe que, assim como você mesmo fala, roubaram sua infância. A gente te entende, e gosta de você mesmo assim. Você ia ficar perto de nós novamente, mas aí você recebeu um chamado. Para se juntar aos seus amigos Fred Astaire, Gene Kelly, James Brown... Mas para nós, você sempre foi o melhor. E sempre vai ser. A cortina se fechou meio de repente, e, apesar de o show ter que continuar, vai ser bem difícil agora, sem você. Sabe... claro que você não sabe... mas enfim... Se hoje eu sou músico, eu devo muito a você. Talvez eu deva isso a você. Será que, um dia, vou poder falar isso

Atualizado em 6 Set 2011.