Guia da Semana

Foto: My Space

Dianne Schuur passou por São Paulo, onde fez duas apresentações. Com seu trio, tocou no Bourbon Street e, com a Jazz Sinfônica, no Auditório do Ibirapuera. Emocionada, Dianne entrou no palco sob intensos aplausos. O motivo de sua emoção foi revelado durante a performance da cantora, que dedicou a primeira música a Barack Obama. Ela revelou, momentos antes de pisar no palco, ao ser entrevistada por uma emissora de televisão, que nada a deixaria mais feliz do que cantar para o novo presidente dos Estados Unidos (ela já se apresentou duas vezes na Casa Branca). Disse em tom de desabafo: "O jazz é a grande forma de arte norte-americana. Está na hora de o jazz voltar a Casa Branca".

E, nesse tom de emoção, o espetáculo foi se revelando. Com uma voz límpida, tal como um trompete bem tocado, Deedles usou e abusou ao exibir suas habilidades como excelente cantora e pianista, alcançando um raro alcance vocal de três oitavas e meia. Dianne passou do jazz ao blues despojadamente com seus companheiros de banda, com a presença de Reggie Jackson (baterista), Dan Balmer (guitarra) e Scott Steed (baixista), que também assume a direção musical.

A emoção foi dividindo o palco com a alegria e o entusiasmo imposto pelo prazer de Dianne e seu trio. A certa altura do show, a cantora apresentou My Favorite Things, uma canção de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein para o filme A Noviça Rebelde. Essa música, considerada singela, cantada no filme pela noviça (Julie Andrews) para espantar o medo que os filhos do Capitão Von Trapp têm da tempestade, foi gravada pelo saxofonista John Coltrane, que enxergou nela diversas possibilidades harmônicas de improvisações jazzísticas. Um dos melhores momentos de Coltrane.

O jazz tem dessas coisas, de conseguir tanto realçar as qualidades de uma música singela, quanto se envolver com as questões sociais. Se Dianne Schuur se emociona com a vitória de Obama ao abrir o show, Coltrane compôs e gravou em 1963 a canção Alabama, lembrando o assassinato de quatro crianças negras pelo Klu Klux Klan, na cidade de Birmingham. No caso de Dianne, ela vai desfiando músicas conhecidas como Blue Skies, Taking Change a Love e Danny Boy, onde conseguiu atingir uma delicadeza ímpar. Sua voz acompanha os instrumentos, principalmente o baixo.

Muito à vontade em seu piano, alternava entre o bom humor de quem fazia uma festa no palco, com momentos de puro envolvimento. A Jazz Sinfônica abriu a apresentação com Saxomania e Suite Duke Ellington, ambos com arranjo de Cyro Pereira, preparando o espírito da platéia. Essa parceria mostrou uma outra Dianne Schuur. De blusa e óculos pretos, cheios de brilho, era de se esperar uma apresentação formal. Nesse momento aparece a influência de Dinah Washington na carreira da cantora, que sempre gravou com orquestra.

As cordas e os metais soavam a favor da voz de Dianne. A formalidade se transformava em festa. Cada canção, por mais conhecida que fosse, tinha sempre uma nova melodia. Ela toca Blue Gardenia, que foi sucesso de Dinah Washington, mostrando sua devoção. Cantou clássicos como The Man I Love, Body and Soul, Everytime We Say Goodbye e Unforgettable (essa última parecia que era inédita).

Cyndi Lauper também se apresentou na mesma semana que Dianne. Cindy foi cover dela mesma. Seu show foi previsível. Ela cantava o que a platéia queira ouvir. O público foi lá para apreciar o show e ouvir sucessos, cantado do mesmo jeito desde o século passado. Esse é o problema da música pop. Ela é limitada, não rompe e nem se supera musicalmente. É o gosto pelo mesmo, pelo instituído, enquanto o rock e o jazz são mais criativos. E Dianne Schuur é só um dos exemplos. Uma dessas cantoras misteriosas que vão além do entender a música que cantam.

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Quem é a colunista: Lázaro Oliveira, jornalista. Trabalha no Vitrine e no Entrelinhas, ambos na TV Cultura

Pecado gastronômico: Comida japonesa ou cozinhar o que tem vontade para a família e amigos

Melhor lugar do Brasil: Quando não em casa, a bela cidade de Paraty!

Como falar com ele: [email protected]




Atualizado em 6 Set 2011.