O flautista Altamiro Carrilho e seu grupo no auge do chorinho no Brasil Foto: Divulgação/ Site Oficial |
Nascido no Rio de Janeiro há mais de um século, o chorinho está vivo, mas já não mora por aqui. Os chorões e seus bandolins, violões, flautas, cavaquinhos, pandeiros e pianos fizeram dele o primeiro gênero da música urbana popular brasileira. Mas, popular ela não ficou. Ouve-se mais o choro no Japão que no Brasil, literalmente. Sucessos vitalícios como Tico-Tico no Fubá, de Zequinha de Abreu, e Carinhoso, de Pixinguinha, marcam uma história que parou no tempo e que é quase sempre confundida com a do samba. Comemorado por franceses e japoneses em 23 de abril, o Dia Mundial do Choro passa batido por aqui.
Idolatrado lá fora, o choro é delicioso de se ouvir, muito mais do que de se sacolejar. Por sua superficial semelhança com o samba - o som do cavaquinho é um dos responsáveis por isso -, ele se auto-denuncia brasileiro a qualquer ouvido leigo. "A melodia do chorinho é mais trabalhosa porque tem muitas notas, são geralmente oito. O estilo não foi feito para dançar e também não depende de letra", explica Altamiro Carrilho, mestre da flauta e único representante vivo da velha-guarda do choro. "O chorão tem que ser bom músico, se dedicar muito aos instrumentos, o choro é música instrumental".
Altamiro na ativa aos mais de 80 anos Foto: Divulgação |
"Das composições que fiz, as que eu mais gosto são Rio Antigo, Aeroporto Galeão (ouça aqui um trecho), Valsa Aracy e Meu sonho é você. A harmonia delas é muito pura... Foi um grande momento de inspiração". |
Fluminense de Santo Antônio de Pádua, Altamiro nasceu em 21 de dezembro de 1924 e teve seu auge nos anos 50, quando montou um grupo e se aperfeiçoou no assobio de sua flauta mágica. Hoje, ele coleciona cerca de 200 músicas dos mais variados ritmos e estilos e mais de 100 gravações entre discos, fitas e CD´s. Depois de sua experiência como apresentador na TV Tupi, o compositor mantém, atualmente, o programa Altamiro Carrilho e Amigos na Rádio MEC, em que recebe convidados especiais de profissão toda semana "O Rio de Janeiro, principalmente, tenta resgatar a memória desse tipo de música por meio de festivais temáticos, por exemplo. O meu programa também ajuda a isso, mas não vemos por aí rodas de choro como antigamente. É tudo de samba. Não existe uma nova geração de choro".
Choro de ponte aérea
Seis Sextos: (da esquerda para a direita): Ed Woiski, Lucas Nobile, Gustavo Angimahtz, João Fideles, Nicolas Brandão, Henrique Gomide, Zé Motta e Kiko Woiski (agachado) Foto: Thiago Kaczuroski |
Talvez o mestre Altamiro não tenha conhecido algumas rodas paulistas. Uma caminhada pelas ruas da Vila Madalena nos fins de semana é suficiente para descobrir uma "nova geração" inspirada nas raízes da música brasileira. No Miscelânea Cultural, uma das casas de cultura do bairro, o grupo Seis Sextos toca choro. Sim, choro de verdade. Com quatro composições próprias - Baião de Ravel, Sambalaio, Choro de Costas e Recadência dos Rios -, o sexteto manda ver uma apresentação requintada, também com sambas e chorinhos antigos repaginados. "Queremos criar algo refinado, mas que atinja o povo. Gostamos de fazer releituras em choro que agradem desde o cara que está passando ali na rua ao entendedor de bossa e música brasileira", explica Henrique Gomide, 20 anos, o mais novo da trupe.
De escolas diferentes, mas de mesma sintonia musical, os integrantes do Seis Sextos fazem bom uso de sua bagagem cultural para alcançar esse objetivo de popularizar o choro. Henrique começou a tocar música erudita no piano aos 10 anos, e hoje é responsável pelas criações no teclado e na escaleta; desde 1998, Lucas Nobile, 24, o mais velho, se rende ao cavaquinho e ao banjo e é, de longe, o mais influenciado pelo choro; Nicolas Brandão é o cara da flauta transversal, sua companheira desde os 12 anos de idade; Zé, que começou a estudar bateria aos 9, hoje trabalha com sua voz; João, o baterista, tinha quase 13 anos quando decidiu investir nas batucadas; Gustavo Angimahtz começou com aulas de baixo, mas a dificuldade de transportar o amplificador para a viagem o fez trocar o instrumento pelo violão; a paixão foi imediata e logo surgiu o interesse de estudar música brasileira tradicional.
Influenciados por Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Pixinguinha e Benedito Lacerda, Waldir Azevedo, Cartola, Adoniran Barbosa, Jacob do Bandolin, Os Cariocas, Chico Buarque, Geraldo Pereira, Novos Baianos, Silvio Mazzuca, Bebeto Castilho, Tigres da Lapa, os meninos montaram o grupo por acaso em 2007, durante uma viagem à Ilha Grande. Sem nada para fazer num chuvoso feriado de novembro, Lucas, Gustavo, Henrique e Nicolas sentaram no bar com um livrinho de choro e começaram a tocar. A brincadeira deu lugar a ensaios diários e sessões noturnas agitadas. Eles tocavam em troca de cerveja e gente jovem rodopiando em volta da roda.
De volta a São Paulo, o Coisa Linda - primeiro nome do grupo - se apresentou na Casa das Rosas, ícone da cultura paulistana, trocou de nome e engatou apresentações em bares da cidade. "É maravilhoso ver as pessoas dançando e cantando enquanto a gente toca, mas nos preocupamos com a evolução da música", conta Lucas. "Com o choro podemos evoluir muito mais do que com o samba. As melodias são mais complexas e é possível puxar pelo lado da improvisação. É um desafio", completa Gustavo. No dia 26 de abril, o Seis Sextos toca na Virada Cultural, na Biblioteca Temática de Poesia Alceu Amoroso Lima.
Serviço
Biblioteca Temática de Poesia Alceu Amoroso Lima
Rua Henrique Schaumann, 777, Pinheiros - São Paulo
Horário: sábado, 18h
Preço: Grátis
Miscelânea Cultural
Rua Álvaro Anes, 91 (travessa da Pedroso de Moraes, em frente à Fnac Pinheiros)
Horário: todo domingo, das 20h às 22h
Preço: R$ 10,00
Atualizado em 6 Set 2011.