Guia da Semana

O projeto Chefs na Rua tinha tudo para agregar a já tradicional Virada Cultural, que este ano entrou na 8ª edição com um público estimado em 4 milhões de pessoas. Eram chefs de restaurantes renomados dispostos a oferecer pratos, quitutes e doces a preços acessíveis (de R$ 5 a R$ 15), para um público diverso, incluindo pessoas que nunca tiveram oportunidade de ter contato com a alta gastronomia.

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Apesar da boa vontade dos participantes, o evento foi marcado pela desorganização, tumulto e insatisfação do público, prejudicando a pioneira proposta do começo ao fim. O Guia da Semana acompanhou de perto o projeto no Minhocão.

Sábado (5/5)
O responsável por abrir o evento na primeira noite, às 0h, seria o chef Alex Atala com sua famosa galinhada do restaurante Dalva e Dito (prato de galinha, farofa e arroz). A informação divulgada pela Virada dava conta de que o chef serviria 500 porções durante duas horas. Porém, os organizadores não previam uma procura 10 vezes maior do público, que chegou a números não oficiais de mais de 5 mil pessoas. A estratégia encontrada foi a de oferecer senhas e montar filas para as pessoas que foram chegando desde às 19h.


Na noite de sábado para domingo, cerca de 5 mil pessoas aguardavam a Galinhada do Alex Atala Foto: Brunno Marchetti

Em torno de 23h30 já era possível ver o público excedente se amontoado nas grades de contenção, aguardando novas senhas, que não chegariam, e providências da organização. “Faltou logística por parte dos organizadores, pois eles não pensaram na proporção que um evento desses teria na Virada Cultural”, afirma Eliane Silva, funcionária pública.

Houve também os que não pagaram pra ver e saíram ao ver o tumulto, desdenhando do prato premiado. “Eu que não fico aqui nesse rebolo! O cara (Alex Atala) diz que é bom, mas quero ver ele (sic) fazer o que eu faço com miojo!”, ironiza Junior Siqueira, 21 anos, estudante.

Apesar da fila montada e das senhas distribuídas, a pouca segurança presente não conteve o avanço da população, que cercou a barraca de distribuição e passaram a criticar o evento, a organização e o chef. “Atala, quero ver você dar uma de Jesus Cristo e multiplicar a galinhada!”, brincou Caio Assis, 29 anos.

Por causa da confusão formada, a equipe de Atala avisou-o com antecedência para não comparecer ao evento. No próprio Dalva e Dito estava acontecendo, no mesmo momento, a comemoração do prêmio conquistado por Atala - O D.O.M. foi eleito o 4º com a Galinhada saindo para o público por R$ 59.


Depois de mais de 2h30 na fila, Cecília Russo foi a primeira pessoa a saborear a famosa Galinhada do Atala Foto: Brunno Marchetti

Com grande atraso na distribuição, o primeiro prato saiu às 0h40, para a senhora Cecília Russo, 74 anos, professora aposentada e primeira da fila. Questionada se realmente valeu a pena a espera, o tumulto e a galinha, respondeu com um sorriso no rosto. ”Valeu muito a pena, é muito saboroso, só não valeu mais porque Alex Atala não estava aqui”. Ainda concluiu. “Morram de inveja!”, bradou para os outros que se degladiavam por uma porção.

A barraca foi cercada por grades de proteção que ameaçavam cair com o tumulto do público. Enquanto isso, os funcionários tentavam, na medida do possível, servir as pessoas agora sem critérios de chegada, ficha ou algo que o valha. Cabia a quem tivesse mais próximo da grade ou braços mais longos sair com o box do prato.

Em menos de uma hora, já não havia porções para distribuir e o público presente teve que se contentar em aguardar para para comprar a sopa de cebola de Erick Jacquin, do La Brasserie Erick Jacquin. Um dos membros da equipe de Atala confirmou a preocupação do chef com as pessoas que ficaram no Minhocão. "Ele fez questão de nos receber pessoalmente no restaurante e resumiu: 'Deu tudo errado, mas deu tudo certo no final!'", sobre o receio que teve do público invadir a barraca.

Domingo (6/5)
Após as confusões da noite anterior, o espaço Chef na Rua recebeu um público muito maior ao longo do domingo. Com 20 barracas de chefs renomados oferecendo pratos de R$ 5 a R$ 15, a alta gastronomia chegou às ruas de maneira mais acessível, com uma oferta de 40 mil refeições em um período das 8h às 20h.


O Dona Onça marcou presença com o prato Puchero à Love Story, em referência à tradicional casa noturna paulistana Foto: Leonardo Filomeno

Porém, a falta de organização imperou durante o resto do evento. Logo no início das atividades do dia 6, a falta de energia prejudicou algumas barracas, como a Sopa de Cebola de Erick Jacquin, que teve um atraso de 2h na madrugada e só iniciou as vendas às 4h.

Por ser fornecida por geradores, ao longo do dia a energia oscilava frequentemente. Na barraca do chef Benny Novak, do 210 Diner, houve momentos da tarde em que a venda foi suspensa por não ter como servir o Baby Back Ribs & Sweet Corn frio. Além da energia, a falta de organização na venda de fichas criava um ambiente de caos total, com algumas barracas em que funcionavam duas extensas filas, uma para comprar o ticket e outra para retirar o prato, enquanto outras tinham fila única para fazer tudo.

Quem frequentou o espaço pela manhã como alternativa de alimentação para o pós-balada, se deu bem. Poucas filas e nenhum tumulto para o público. Depois das 11h, o fluxo aumentou, alguns pratos acabaram e as filas voltaram a se formar. “Fiquei mais de 1h na fila para pegar o Hot Dog à Francesa. É gostoso, mas não entraria de novo na fila para comprar”, assume a publicitária Adriana Costa, 23 anos, sobre o prato da barraca do Raphael Despirite, do restaurante Marcel.

Na coletiva do balanço da virada, o Secretário Municipal de Cultura, Carlos Augusto Calil, afirmou que o Chef na Rua tinha como objetivo ser um evento de massa. "Alta gastronomia é coisa para poucas pessoas. Não era para ser uma atração e virou uma grande atração. A imprensa deu uma superdimensão de evento de massa para um evento que não é de massa. Não dá para repetir essa incompatibilidade no ano que vem, teremos de rever", disse o secretário municipal de Cultura Carlos Augusto Calil, na entrevista de balanço da Virada.


Checho organizou o evento Mercado e foi o responsável por convidar os chefs para o evento na Virada Cultural Foto: Brunno Marchetti

Apesar dos pontos negativos, a nova proposta de atividade foi bem vista por boa parte do público e por alguns dos participantes. Um dos mais entusiastas foi o chef Checho Gonzáles, da Cevicheria Gonzáles, organizador do Mercado e curador do Chef na Rua. “Tivemos e ainda teremos muitos problemas por começar agora com propostas do tipo, mas posso resumir os eventos em sucessos, por oferecer ao público uma alta gastronomia mais acessível”. Questionado sobre as falhas da organização, Checho preferiu não criticar os responsáveis.

Apesar dos problemas, Checho ainda pensa em continuar com projetos como o Mercado e Chef na Rua. “Não faço na Higienópolis, pois já tenho dois processos nas costas da associação de moradores. Estou procurando um novo espaço e quero fazer um evento que agregue toda a gastronomia, do restaurante a doceria”, finaliza.

Por Leonardo Filomeno

Atualizado em 7 Ago 2012.